“Acreditem na sociedade, no ser humano, nos valores, e reconstruam a sociedade a partir desses valores”.
Dom Francisco de Sales nasceu em 17 de abril de 1968. Ingressou na Ordem
do Carmo aos 18 anos e, em 1987, no noviciado Carmelita em Camocim de São Félix
(PE). Cursou filosofia nos Institutos Vicentino, em Curitiba (PR), e Salesiano,
em Recife (PE). Já a teologia foi realizada na cidade de Dublin (Irlanda).
Foi ordenado diácono em dezembro de 1994 e presbítero, no dia 25 de
novembro de 1995. Em 2011, Dom Francisco assumiu, em Roma, o ofício de
vice-prior do Centro Internacional Santo Alberto, secretário geral da Ordem do
Carmo, preside a Comissão Internacional para a Liturgia e Oração e é membro da
Comissão Internacional de Evangelização e Missão.
O Frei Francisco de
Sales Alencar Batista foi ordenado bispo em solenidade realizada no domingo
(14) na paróquia Nossa Senhora da Conceição do município de Araripina-PE, terra
natal do agora Dom Francisco de Sales, novo bispo da diocese de Cajazeiras.
Filho de dona Noêmia Alencar Batista e do senhor Jacob Alves Batista,
Dom Francisco de Sales concedeu entrevista para O Grande Jornal.
SENTIMENTO DE TER
SIDO ORDENADO BISPO EM SUA TERRA NATAL
Ser ordenado aqui (em Araripina) foi uma escolha muito pessoal. Eu
poderia ser ordenado em vários outros lugares, inclusive em Cajazeiras, já
tomando posse da Diocese, mas eu penso que para a cidade de Araripina, para
minha paróquia é um evento pastoral muito importante, porque foi aqui que eu cresci
na fé, foi aqui que eu nasci (lá no Sítio Baixio dos Batistas), fui educado nas
escolas públicas de Araripina, desde a Escola Antônio Martins de Alencar, até o
CERU Luiz Gonzaga Duarte (hoje Escola de Referência em Ensino Médio Luiz
Gonzaga Duarte). Iniciei também aqui a faculdade de História, depois interrompi
em razão da minha entrada no Convento como Carmelita. É um dom para a cidade,
para minha pessoa, poder reencontrar também nesse momento, eu passei mais de 25
anos fora da cidade, apareci aqui só de férias, reencontrar as pessoas, refazer
essa história e celebrar esse momento com a cidade, sobretudo com a paróquia da
Imaculada Conceição, que tem sido muito fecunda com as vocações tanto
sacerdotais, quanto religiosa para a Igreja, é um dom pastoral a ser vivido,
celebrado e agradecido em comunidade, por isso, a razão dessa escolha pessoal
para que a ordenação fosse realizada aqui na cidade.
O PAPEL DA IGREJA NAS
QUESTÕES SOCIAIS
Infelizmente a ação da Igreja não é tão divulgada, até porque não é o
objetivo da ação social da Igreja. Em um encontro em Brasília com os 29 bispos
nomeados pelo Santo Padre no último ano, pudemos vislumbrar o mapa muito
concreto da ação pastoral da Igreja, da Pastoral Social da Igreja, nos lugares
de fronteiras mais difíceis, de serem atingidos, por outras associações,
inclusive, pelo poder público no nosso país. Existe uma incidência muito forte
da presença da Igreja nessas realidades. A Igreja não vive para propagandear
aquilo que faz, porque nós, fazemos em razão da fé que nós professamos e em
razão do compromisso com o evangelho. A Igreja está profundamente preocupada
de, exortar, ensinar, mais com um investimento econômico muito grande de nossas
dioceses, por parte de outros organismos internacionais, que estão ligados a
Igreja Católica.
SOBRE O ATUAL CENÁRIO POLÍTICO,
ECONÔMICO E SOCIAL DE ARARIPINA
Eu até
disse nos meus agradecimentos à comunidade de Araripina que, Araripina está
sofrida, martirizada. A Igreja entende a política como a ação da caridade mais
importante por parte daqueles que a assume e tem a consciência da fé, a
consciência do evangelho. Então eu diria que o grande desafio não é só para
Araripina, porque vivemos um momento muito delicado naquele que constitui o
tecido político social do nosso país, e que o grande desafio é cada um assumir
a sua responsabilidade, lembrando que toda autoridade, tem sua fonte em outro
espaço e não das ambições humanas. Autoridade é um grande dom de Deus para o
serviço da comunidade. Se a gente entende assim a autoridade, eu tenho certeza
que muita coisa será transformada. Assumindo a responsabilidade e cumprindo com
lisura aquilo que foi confiado. O político está lá porque o povo concedeu o
poder, para coordenar, animar a vida de uma comunidade. Se ele cumpriu o seu
dever e se o povo da sua parte também cumpriu o seu dever, cobrando,
acompanhando, exigindo, aquilo que é direito seu, tenho certeza que a sociedade
será transformada.
HOMOSSEXUALIDADE, PEDOFILIA E OUTROS DEBATES
ABERTOS Á DISCUSSÃO PELO PAPA FRANCISCO
Um outro
pecado da sociedade é que as pessoas não leem os documentos da Igreja. Se você
entra no site da Santa Sé no Vaticano, toda a doutrina e disciplina da Igreja são
abertas para todos aqueles que querem aprofundar a leitura para aquilo que ela
tem feito e está fazendo em todas essas questões. Eu diria o Papa Francisco deu
um destaque muito forte em algumas dessas questões que já vinham sendo tratada
como muita responsabilidade, por exemplo, a questão da pedofilia, o documento
normativo não só para a ação interna da Igreja, mas também, para a relação da
Igreja com a sociedade no que diz respeito a esse tema, foi publicado pelo Papa
João Paulo II e depois sancionado com uma outra normativa pelo Papa Bento XV e,
dificilmente em outro site do mundo você vai encontrar normativas tão diretas,
tão abertas, para tratar essas questões, mas infelizmente a gente sabe que o
foco ás vezes em uma árvore que cai na Igreja, não é aquele mesmo que se dar a toda floresta de
ação do bem que a Igreja está realizando no mundo. O Papa Francisco chamou a
todos a uma responsabilidade muito mais séria diante desses temas graves que
são tratados abertamente, mas eu diria que é muito importante a gente ter essa
capacidade de não ficar na superfície da informação, mas penetrar na substância
dos conteúdos profundos, que estão lá, à disposição de todos, em todas as
principais línguas oficiais do mundo.
O PAPEL DA MULHER NA IGREJA E SOBRE O DEBATE DE
ELAS SE TORNAREM DIACONISAS
A mulher
ocupa um grandíssimo espaço na Igreja. Quem educa as gerações toda na fé, são
as mulheres. Elas estão presentes em vários setores da ação pastoral da Igreja.
O Papa propõe uma reflexão, inclusive a partir de uma comissão instituída por
ele para estudar uma antiga tradição que aparece em alguns escritos da Igreja
sobre qual era o papel das mulheres chamadas diaconisas na Igreja Primitiva.
Claro, é um primeiro processo de estudo e aprofundamento dessas que na Igreja
Primitiva recebiam esse título esse ministério de diaconisas, mas que não se
equiparavam na ordenação ao ministério ordenado da Igreja. Hoje o Santo Padre
esta inserindo as mulheres no espaço de decisão da própria vida da Igreja, nas
várias congregações, no próprio Vaticano a presença das mulheres é intensa,
sobretudo daquelas que estão diretamente relacionadas com o ministério dos
leigos. É muito importante ouvir não só a doutrina dos pastores, mas daqueles
que estão diretamente implicados. Não só em Roma como em outros espaços do
mundo, existem muitas mulheres que assumem as universidades católicas. São
espaços de protagonismo da mulher muito importante e, na ação concreta de
nossas pequenas comunidades, o papel da mulher sempre foi muito importante e
muito valorizado. Portanto, é importante não focalizar somente essa dimensão do
Ministério Ordenado que tem uma tradição
que faz parte da própria natureza da Igreja e não pode ser simplesmente mudada.
FANATISMO RELIGIOSO E TERRORISMO NO MUNDO
Você
define muito bem a questão. Falta de humanismo. É preciso recuperar em todos os
níveis e eu diria, que o primeiro nível para a resolução desse problema é o
educacional. Onde não há uma educação profunda, e quando falamos de educação,
falamos de uma educação integral do ser humano. Podemos cair nos piores desvios
de condutas do ser humano. O que está acontecendo no mundo hoje é justamente
consequência de todo um processo, no qual o ser humano, no papel de construtor
da sociedade, foi ignorado. O terrorismo é fruto dos fundamentalismos diversos,
não existe só o fundamentalismo islâmico, existe o cristão, e a razão básica de
tudo isso é a falta de uma educação, uma compreensão profunda da própria
religião. Se entra nessas derivas complexas da sociedade. Eu diria que o
remédio para isso é construir pequenas células de paz. A paz não é uma
realidade que vem com uma vareta mágica, ela é fruto de uma sociedade justa,
quer dizer, onde não há justiça, direitos para todos, nós vamos ter pessoas que
diante do sofrimento, vão responder de forma violenta. É todo um tecido social,
político, que deve ser reconstruído a partir de valores profundos, radicados em
uma educação humana, onde o ser humano é colocado no centro das atenções, a
partir de todos os direitos e deveres que ele tem para assumir na construção da
sociedade, e, sobretudo, essa grande reconstrução eu diria, quase artesanal da
dignidade humana, ferida, martirizada em tantos e tantos aspectos.
CORRUPÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO
Diploma
nenhuma dar dignidade a ninguém. A dignidade humana de valores a gente vai
construindo um tecido humano familiar baseado em valores. A corrupção diria o
Papa Francisco, é um mal quase que incurável porque ela penetra não só o tecido
da sociedade, mas nas vísceras dos corruptos que não mais reconhece os limites.
A uma diferença muito grande entre um pecador e um corrupto: o pecador é aquele
que comete uma fraqueza como todos nós podemos cometer na vida, bate no peito,
volta-se a partir da consciência doída para Deus e recompõe a própria vida. O corrupto
não. O pecado da corrupção começa a fazer parte do próprio tecido da
existência. Tem uma expressão de um salmo que define muito bem a lógica da
corrupção: ‘um abismo atrai um outro abismo’. O corrupto não enxerga mais o
limite moral do seu ato. Esse é o grande desafio. Eu diria que para curar a
corrupção precisa-se de uma grande reforma da sociedade, mas ao mesmo tempo é
necessário que nós pontemos o olhar para as coisas boas que estão acontecendo,
quer dizer, no meio dessa corrupção tem muita gente boa que está fazendo coisas
boas. E eu penso se nós começarmos a proclamar boas notícias e criar oásis de
dignidade, de moralidade, uma outra sociedade é possível a partir desses
valores que estão sendo vividos por pessoas que estão lutando quase que contra
a maré. Eu convidaria as pessoas a olharem para os pequenos sinais. São
pequenos sinais poderosos que podem apontar para um caminho de reconstrução da
sociedade. Quando um vaso quebrar nós temos que recolher os pequenos pedaços e
reconstruir esse vaso com uma nova argamassa. A sociedade precisa ser
reconstruída com uma nova argamassa de uma vida digna, de uma moralidade que
seja palpável pelas pessoas, que a gente possa acompanhar, e aí a população tem
uma grande responsabilidade. Infelizmente as eleições veem e se elegem os
mesmos, se elegem aqueles que fazem parte de uma geração que não mais respondem
a esses anseios, essas dores, que estão presentes na sociedade.
Um outro
mundo é possível porque tem gente fazendo diferente.
LEMA E MISSÃO
Quando o
Bispo é eleito tem alguns ritos que precisam ser cumpridos e um deles é a
escolha do lema. O lema é um pouco aquilo que vai ser quase que o refrão a
arrematar cada ação, cada ato, cada etapa da missão do Bispo. Lendo os documentos
sobre o Ministério Episcopal me veio à mente uma imagem que é muito bonita
entre os discípulos no cenário da última ceia do evangelho de São Lucas.
Enquanto Jesus se doa a comunidade na entrega de sua vida, no finalzinho eles
começam a brigar entre eles quem é o maior entre nós? E aí Jesus utiliza uma imagem bonita e
pergunta quem é o maior, quem está à mesa ou quem está servindo? Jesus mesmo
responde: é claro que quem está à mesa é o maior. Jesus diz: eu estou à mesa,
mas estou entre vós como aquele que serve. Então, esse é o coração do lema. E é
um pouco esse sentimento que eu levo na minha bagagem para Cajazeiras.
Cajazeiras é uma diocese que tem 102 de história, que tem uma tradição bonita,
de fé, de Ministério de Pastoral e eu vou entrar nessa história. Eu vou bater a
cada porta, a cada coração, pedindo licença para entrar. A gente não chega com
uma mala pronta, a gente vai aprontando a bagagem do caminho, caminhando com
aqueles que já caminham na Diocese. Estão estarei lá como AQUELE QUE SERVE como aquele que entra nessa história olhando para
Jesus servo, tentando pautar minha vida, minhas escolhas, também as decisões
que devem ser tomadas, às vezes graves, mas sempre olhando para a imagem de
Cristo servo, que será o modelo dessa minha ação pastoral. É com muita
humildade que a gente chega na diocese, que ocupa um território vasto no sertão
sofrido com todas as suas dificuldades e desafios, mas que alicerçou, podemos
dizer que a história da Igreja, a história da sociedade naquela região e em
nossa região, ela está intrinsecamente ligada. Nós não podemos entender a
sociedade se não entender a história da Igreja. Cajazeiras começa com uma
escola católica fundada pelo padre Rolim e a partir dali começa a cidade e
começa também toda uma caminhada de vida, de Igreja e sociedade.
MENSAGEM DE OTIMISMO
Primeiro
eu pediria ao povo de Araripina que continuasse em oração. Os Ministério Pastoral
é sustentando pela oração.
Nós
vivemos um momento de muito pessimismo na sociedade, mas que olhássemos o mundo
com esperança. Eu nunca fui um pessimista na minha vida mesmo nos momentos mais
difíceis da minha existência do quais passei, até dolorosos, mas sempre
procurei enxergar sementes de esperanças no meio dessas fragilidades humanas.
Olhem para o mundo com esperança, olhem para Araripina com esperança. Olhem
para esse cenário que nós estamos vivendo frágil do ponto de vista político e
social, também com muita esperança e sejam todos semeadores dessa esperança.
Então acreditem. Acreditem na sociedade, no ser humano, nos valores e
reconstruam a sociedade a partir desses valores.
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