Na sexta, governador foi afastado por 180 dias por decisão do ministro Benedito Gonçalves. Nesta quarta, Corte Especial, com 15 ministros, confirmou. Witzel nega acusações de corrupção.
Por Rosanne D'Agostino, G1 — Brasília
A Corte Especial do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta quarta-feira (2)
manter Wilson
Witzel (PSC-RJ) afastado do cargo de governador do Rio de
Janeiro por suspeitas de corrupção.
Por 14 votos a 1, os ministros
decidiram manter decisão
do relator, ministro Benedito Gonçalves, que afastou Witzel
do cargo na Operação
Tris In Idem, que investiga irregularidades e desvios em
recursos da saúde do Rio de Janeiro. Witzel nega as acusações.
A Corte Especial do STJ é formada
pelos 15 ministros mais antigos do STJ. Para a manutenção do afastamento, eram
necessários 10 dos 15 votos (quórum qualificado de dois terços).
O presidente do STJ só vota em caso
de empate. Mas ao final do julgamento, o presidente, ministro Humberto Martins,
também decidiu apresentar voto pelo afastamento, formando placar de 14 votos a
1 para manter Witzel fora do cargo pelo prazo de 180 dias.
Logo depois que o quórum mínimo para
o afastamento foi atingido (dez votos), Witzel afirmou em uma rede social que
respeita a decisão do STJ.
“Compreendo a conduta dos magistrados
diante da gravidade dos fatos apresentados. Mas, reafirmo que jamais cometi
atos ilícitos. Não recebi qualquer valor desviado dos cofres públicos, o que
foi comprovado na busca e apreensão. Continuarei trabalhando na minha defesa
para demonstrar a verdade e tenho plena confiança em um julgamento justo.
Desejo ao governador em exercício, Cláudio Castro, serenidade para conduzir os
trabalhos que iniciamos juntos e que possibilitaram devolver ao povo fluminense
a segurança nas ruas e, com isso, a esperança em um futuro melhor”, escreveu.
A decisão que levou ao afastamento
do governador faz parte da Operação Tris In Idem, que investiga
irregularidades e desvios em recursos da saúde do Rio de Janeiro.
A Procuradoria-Geral
da República chegou a pedir a prisão do governador, mas o
pedido foi negado pelo STJ. O tribunal entendeu que o afastamento é suficiente
para evitar as supostas ações criminosas.
Além do afastamento do governador, o STJ expediu 17 mandados de prisão, sendo 6 preventivas e 11 temporárias, e 83 de busca e apreensão. A Procuradoria Geral da República denunciou nove pessoas.
O ministro Benedito Gonçalves também
determinou buscas contra a primeira-dama, a advogada Helena Witzel, que tem
contratos com empresas envolvidas no esquema de desvio de recursos.
A defesa de Witzel criticou a decisão
de afastamento ter sido dada por um só ministro, e não por um colegiado,
e pediu
a suspensão do julgamento ao Supremo Tribunal Federal
(STF).
O presidente do STF, ministro Dias
Toffoli, negou o pedido pouco antes do julgamento, afirmando que não cabe ao
Supremo decidir sobre a pauta de julgamentos do STJ.
O nome da operação (Tris In Idem) é
uma referência ao fato de se tratar do terceiro governador do estado acusado de
se utilizar de esquemas ilícitos semelhantes para obter vantagens indevidas –
os outros dois foram Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão.
Os votos dos
ministros
Saiba como votou cada um dos
ministros do STJ no julgamento sobre o afastamento do governador do Rio, Wilson
Witzel:
·
Benedito
Gonçalves - Em seu voto, Benedito
Gonçalves defendeu a publicidade do julgamento e sua decisão de aplicar a
Witzel medidas cautelares diversas da prisão. "Foi pedida a prisão
preventiva. Entendi que a prisão preventiva era mais gravosa. Entendi por optar
por medida menos gravosa, que era afastamento", disse o relator, ao pedir
o referendo da cautelar.
·
Francisco
Falcão - O ministro Francisco Falcão
acompanhou o relator afirmando que, “diante da gravidade dos fatos”, não vê
como não referendar a decisão. "Os fatos são graves, merecem uma apuração
e no momento em que vivemos, numa pandemia, onde já tivemos mais de 120 mil
vítimas, é impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigado possa
continuar exercer o cargo tão importante de maior dirigente do Estado do Rio de
Janeiro”, afirmou.
·
Nancy
Andrighi - A ministra disse que uma
organização criminosa tendente a beneficiar agentes públicos justifica as
medidas. “Ocorrem dezenas de pagamentos de despesas pessoais da família do
governador em espécie”, citou. Segundo a ministra, o afastamento se faz
necessário já que, segundo ela, a participação do governador "assume maior
relevo na prática de atos administrativos inerentes à função pública".
·
Laurita
Vaz - A ministra também acompanhou
o relator e argumentou que as medidas cautelares são necessárias para cessar as
atividades criminosas, para impedir a reiteração. “Há evidência de vazamento de
informações sensíveis da investigação, pois se constatou que foram informados
da deflagração das operações”, afirmou.
·
Maria
Thereza Assis Moura - Defendeu que o afastamento
deve ser uma medida a ser sempre tomada de forma colegiada. Mas afirmou que não
viu prejuízo porque a decisão judicial foi prontamente trazida à Corte
Especial. “O Ministério Público foi expresso no sentido de que, além dos fatos
narrados na denúncia, diversos outros merecem ser aprofundados inclusive com
relação ao grau de atuação da organização criminosa em questão, que possui
espectro de incidência delitiva em praticamente todos os setores do governo do
estado”, afirmou.
·
Napoleão
Nunes Maia – O ministro foi o primeiro a
votar contra o afastamento de Witzel. “A decisão liminar do ministro Benedito
Gonçalves, sem fazer nenhuma restrição à lucidez de sua percepção, sem
manifestar qualquer descontentamento com o conteúdo da sua decisão, eu penso
que ela não está a merecer, da minha parte, o meu referendo”, disse.
·
Og
Fernandes – O ministro também acompanhou
o relator afirmando que o ministro definiu um prazo claro de afastamento, que
depois poderá ser revogado. “Esse afastamento da função seria pelo prazo de 180
dias. Isso quer dizer que, apurados os fatos que são objeto de investigação,
concluído esse prazo, o ministro Benedito e o tribunal como um todo verificará
sobre a necessidade ou não do período do afastamento”, ressalvou.
·
Luís
Felipe Salomão – O ministro votou com o relator,
afirmando que não vê nenhum tipo de nulidade na cautelar determinada. “Há uma
apuração em curso com valores totais ainda não levantados totalmente, ainda não
dimensionados”, disse.
·
Mauro
Campbell – O ministro acompanhou o
relator ressalvando que, apesar de considerar que a decisão deveria ter sido
colegiada, há fatos que justificam o afastamento. “Não possui justificativa
forte o bastante para ter sido deferida monocraticamente, mas tal raciocínio
resta prejudicado pela atual sessão. Portanto, convalida-se aqui essa
legitimidade. Essa decisão tem que ser sempre colegiada”, afirmou. “Tais fatos
justificam a decretação de uma medida cautelar tão imperativamente agressora da
democracia? Creio que a resposta é positiva.”
·
Raul
Araújo – O ministro também acompanhou
o relator, argumentando que o STJ "tem competência para impor a governador
medidas cautelares penais, dentre outras prisão preventiva e afastamento do
cargo, independentemente de autorização da Assembleia Legislativa”. Mas que o
STJ deve ponderar sobre a necessidade do prazo máximo de afastamento de 180
dias. “Talvez represente uma demasia.”
·
Isabel
Gallotti – A ministra foi a décima a
acompanhar o relator, formando o quórum qualificado para manter o afastamento.
A ministra disse que há fortes indícios de prejuízo ao erário ao longo de toda
a gestão de Witzel, continuando até os dias de hoje. “Indícios são graves,
serão submetidos ao contraditório.”
·
Antonio
Carlos Ferreira – O ministro também acompanhou
o relator, afirmando que a decisão é tomada “sem prejuízo de uma nova, uma
futura análise, diante da natureza provisória que caracteriza as medidas
cautelares”.
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Marcos
Buzzi – O ministro afirmou que há
fortes indícios de materialidade e autoria para manter o afastamento. “Entendo
no mesmo sentido apontado pelo relator que estão evidenciados os serviços que
se negam ter sido prestados, as minutas com as empresas contratadas, as
evidências das relações espúrias entre Estado e empresas e agentes, a ativação
da banca da advocacia da primeira-dama. São dados objetivos que estão, sim,
nesta altura e nesta fase demonstrados”, disse.
·
Sergio
Kukina – O ministro divergiu do
relator e defendeu a prisão preventiva de Witzel. “Esse governador está
rotulado, e há elementos, por ora, que sinalizam no sentido de ser ele o
governador, o cabeça da organização criminosa. A meu sentir, parece
contraditório que todos os demais permanecessem presos e exatamente o cabeça
estivesse em liberdade”, argumentou.
·
Humberto
Martins - O presidente do STJ
acompanhou integralmente o voto do relator. Disse que os elementos dos autos
"comprovam a materialidade" e que há "indícios suficientes de
autoria em relação a todos os representados”. No entendimento de Martins, isso
“reforça a medida de afastamento adotada pelo ministro relator em
circunstanciado modo que no meu sentir não merece qualquer reparo”.
A investigação
A PGR afirma que o governo do RJ
estabeleceu um esquema de propina para a contratação emergencial e para
liberação de pagamentos a organizações sociais (OSs) que prestam serviços ao
governo, especialmente nas áreas de Saúde e Educação.
A suspeita é de que o governador
tenha recebido, por intermédio do escritório de advocacia de sua mulher pelo
menos R$ 554,2 mil em propina. O MPF descobriu transferência de R$ 74 mil de
Helena Witzel para a conta pessoal do governador.
A descoberta do esquema criminoso
teve início com a apuração de irregularidades na contratação dos hospitais de
campanha, respiradores e medicamentos para o enfrentamento da pandemia do
coronavírus.
Blog do Paixão