O município se destaca com produções de artistas independentes, que constroem a história da cultura local.
Por G1 Petrolina*
Samba de Véio — Foto: Lizandra Martins
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etrolina carrega
uma história de luta e resistência da cultura local. O município pernambucano,
que nesta terça-feira (21) completa 126 anos de emancipação política,
apresenta, em sua maioria, um cenário de produções independentes e autônomas,
destacando o empenho efervescente de artistas da região sertaneja.
Terra do cantor
Geraldo Azevedo, do escritor Antônio Padilha, da artesã Ana das Carrancas, do
pintor Celestino Gomes, do coreógrafo Jailson Lima, da atriz e escritora Cátia
Cardoso, Petrolina tem
artistas que levam o nome da cidade para o Brasil e o mundo, destacando a
diversidade cultural do município.
Ana das Carrancas, a 'Dama do Barro' — Foto: Foto: Rafael Benevides
Pioneiros
Em 1903, com a
fundação do Grêmio Polimático Manoel Xavier Paes Barreto, foram registradas as
primeiras manifestações culturais da cidade. No livro "Poética Ribeirinha
- Antologia Literária de Petrolina 1995", a professora e historiadora
Elisabet Moreira destaca que o estabelecimento viria a formar jovens para a
política, artes e letras, como o ex-deputado federal Souza Filho, o jornalista
Francisco Neto, o poeta Gonçalves Passos e o advogado Nestor de Souza.
Centenária, a Philarmônica 21 de Setembro é uma das pioneiras no cenário cultural de Petrolina — Foto: Emerson Rocha / G1
Criada em 1910, a
Philarmônica 21 de Setembro resiste há mais de um século. Também centenário, o
'Samba de Véio' da Ilha do Massangano é uma das tradições mais famosas da
região. Passada de geração para geração, a dança é símbolo de
ancestralidade do povo ribeirinho.
Vozes do Velho Chico: Maria Clara
Em seu livro,
Elisabet Moreira cita outros grupo pioneiros na produção local, como o
Lítero-Dramático Leopoldo Fróes, fundado em 1932, e o grupo de teatro Paulo
Autran, criado na década de 1970.
Segundo a
historiadora e cidadã petrolinense, que mora há 45 anos na cidade, outro
momento importante para a cultura foi a instalação do Sesc, em 1991. Para
Elisabet, a conquista deve ser considerada um marco na história do município.
Ao longo dos anos, o local proporcionou atividades de capacitação e produção
para incentivar a cultura, que vive em sua maioria, de produções independentes.
Teatro Dona Amélia, no Sesc Petrolina — Foto: Emerson Rocha / G1 Petrolina
“Atualmente, há grupos nos bairros, iniciativas pessoais também que procuram fazer arte, se movimentar e, inclusive, sobreviver, pois não está fácil, nunca foi, o retorno para isso”, destaca.
Os festivais de
quadrilha junina são exemplos de iniciativas que nascem na periferia de
Petrolina. Bairros como João de Deus, Cohab 6, José e Maria e Pedro Raimundo
realizam, todos os anos, espetáculos cheios de vida e tradição, trazendo em sua
essência a força de uma povo que não vê dificuldades para a arte. Em 2007, os
grupos locais criaram a Associação de Quadrilhas Juninas do Município de
Petrolina.
As quadrilhas juninas de Petrolina ajudam a colorir o São João da cidade — Foto: Emerson Rocha / G1 Petrolina
"A quadrilha
junina é, sem dúvidas, entretenimento e lazer, além de contribuir para o
desenvolvimento sociocultural das suas comunidades", afirma o presidente
da Associação, Noel Bezerra.
'Terra de todos os artistas'
O ator, diretor de
produção e bacharel em Artes Cênicas, Joedson Silva, conhece bem o potencial
cultural de Petrolina. Aos 42 anos, o artista reforça que a cidade é uma terra
de artistas nativos, forasteiros ou de passagem, que encontram no local
inspiração para produzir e expressar diversas linguagens artísticas.
“Esses são artistas que fizeram e fazem a fama de Petrolina lá fora, como uma cidade brasileira do semiárido nordestino efervescente em Cultura e Arte”, afirma.
Festival Aldeia do Velho Chico — Foto: Encantados
O ator e estudante
do curso de Artes Visuais, José Lírio Costa, vê em Petrolina uma terra que
carrega nas veias as gêneses do seu primeiro nome, conhecida como “Passagem de
Juazeiro”. A cidade, que serve de caminho para viajantes de outras partes do
país, favoreceu o encantamento de muitas pessoas pelo semiárido nordestino,
permitindo que artistas de fora se estabelecessem no município.
“Petrolina, além de ser um polo de desenvolvimento urbano, de reconhecimento da fruticultura e da irrigação, também gerou muitos artistas das mais variadas linguagens.
Basta caminhar pela
cidade hoje, ouvindo e vendo a quantidade de pessoas de fora que aqui chegaram”, comenta José Lírio.
Berço de festivais
como o “Aldeia do Velho Chico”, realizado pelo Sesc, e “Pontes Flutuantes”, da
Cia Biruta de Teatro, Petrolina atrai muitos artistas para espaços culturais
como o Teatro Dona Amélia, a Galeria de Arte Ana das Carrancas, o Museu do
Sertão e o espaço Céus das Águas. Mas, segundo os artistas da cidade, ainda há
muito a ser feito através de políticas públicas para o setor cultural.
“Como artista que
atua na cidade há 20 anos, percebo que é preciso
favorecer, dar oportunidade de ensino, técnica e conhecimento para jovens que
querem trilhar esse mercado de trabalho cultural. Oportunizar, reativar
espaços públicos, estimulando o fazer artístico”, afirma Lírio.
Luta antiga
As cobranças por
políticas e incentivos públicos em Petrolina são antigas, como é referenciado
por Elisabet Moreira, em sua obra sobre as representações culturais através da
literatura. A historiadora relata a existência do Clube Drummoniano de Poesia,
formado entre os anos 60 e 70, que lançaria em outubro de 1979, a primeira
Revista de Poesia. Sem apoio, a revista teve apenas mais uma edição, em
novembro de 1980.
“Segundo minha visão dos fatos e da análise da história cultural de Petrolina, o Clube Drummoniano de Poesia constituiu um divisor de águas em termos de linguagem literária local, mostrando que se podia fazer e ver a literatura sob outro prisma, o de uma linguagem moderna e contemporânea”, destaca a autora.
O grupo, que
chamou a atenção da imprensa estadual, realizava reuniões na sede da União dos
Artífices de Petrolina, na rua Pacífico da Luz, número 268. O desfecho do Clube
Drummoniano de Poesia pode ser utilizado como exemplo de manifestação cultural
que não resistiu sem políticas públicas de financiamento para o projeto.
Os encontros do Clube Drummoniano de Poesia eram realizados na sede da União dos Artífices de Petrolina, na rua Pacífico da Luz — Foto: Reprodução
“Petrolina chega
aos 126 anos de existência sem uma política pública clara, que garanta a
sobrevivência e proteção dos seus signos. A cidade construiu muito na
cultura e muito do que foi construído partiu do seu povo. Falta dar acesso e
estímulos a essa produção cultural”, destaca Joedson Silva.
Em nota, a
Secretaria de Educação, Cultura e Esportes destacou que antes da pandemia, a
prefeitura vinha realizando ações de fomento e incentivo à cultura do
município. Entre as 20 ações citadas, estão a reestruturação e ampliação do
Concurso de Quadrilhas e a reestruturação e ampliação do Projeto da
Philarmônica e Camerata 21 de Setembro.
A nota da
Secretaria afirma que a cultura no município é vista como “um grande desafio”.
"Durante
muito tempo, o município de Petrolina vivencia um grande hiato de identidade
cultural. A construção desse DNA depende de diversos pilares, vetores e
olhares. A cultura é um lugar de pertencimento muito especial, sujeita a
intervenções e interferências de várias ordens; é um caminho que necessita de
urgência para que possamos fortalecer e encontrar a nossa verdadeira vocação”,
diz a nota.
Performance "Dois Minutos para Dança", apresentado no Sesc Petrolina — Foto: Diana Silva/G1
Para Joedson
Silva, as produções culturais feitas em Petrolina podem ser mais consumidas
dentro da cidade.
"Os grupos independentes têm feito a sua parte, entregando material de excelência para a comunidade, inclusive com reconhecimento expressivo lá fora, mas com pouca difusão aqui".
Enquanto resiste,
a cultura no município clama pelo espaço que lhe cabe de protagonismo.
"Petrolina precisa conhecer o que estamos entregando ao mundo do cinema,
da música, do teatro, da dança, das artes plásticas. Temos nomes daqui que são
verdadeiras referências **em nível nacional, mas isso é pouco divulgado",
afirma Joedson.
* Diana Silva, estagiária, com
supervisão de Emerson Rocha
**Termo que deve ser evitado tanto na linguagem erudita, oral e principalmente na linguagem jornalística. Para os gramáticos, o termo é uma aberração da língua portuguesa.
(GRIFO DO EDITOR DO BLOG)
Blog do Paixão