Há 108 anos,
nascia em Exu, Pernambuco, Luiz Gonzaga, um dos mais importantes cantores da
música popular preta e brasileira
Fonte: Alma Preta / Jornalismo Preto e Livre - Imagem: Reprodução da internet
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omem preto, nordestino, integrante de
uma família de trabalhadores rurais, Luiz Gonzaga contrariou todas as
estatísticas antes de ser consagrado como um dos mais relevantes cantores da
música brasileira e, porque não? mundial. Se vivo, o artista, que é motivo de
orgulho para a cidade de Exu, interior de Pernambuco, completaria 109 anos no dia 13 de dezembro, o dia do seu nascimento marca uma data que entrou para o calendário como o Dia Nacional do Forró. A
trajetória de sucesso do criador e Rei do Baião, como ficou iconicamente
conhecido, também esbarrou em preconceitos regionalistas, que só não foram
maiores do que o seu talento e persistência.
Segundo dos nove filhos
paridos por Ana Batista com Januário José, Gonzaga morreu aos 76 anos de idade
em agosto de 1989 na capital pernambucana. A vida simples no interior do estado
serviu de fonte primária de inspiração. Seu Januário trabalhava na roça, mas,
nas horas vagas, tocava acordeão e consertava instrumentos musicais. Foi com
ele que Luiz teve os primeiros contatos com a música, que o levaria mais longe
do que qualquer outro familiar ou conterrâneo seu já chegou. O banditismo e o
coronelismo ainda eram marcas fortes no Nordeste de então, o que tornava a vida
mais castigada para a população da região a mercê dos desmandos dos
poderosos.
Pobre e preto, saiu da casa
dos pais no final dos anos 20 depois de um relacionamento com a filha branca de
um “rico coroné”, que o ameaçou de morte. A confusão aliada aos problemas
familiares, motivou sua fuga da casa dos pais, para onde só voltaria 16 anos
depois. Sem emprego e formação, Gonzaga decidiu entrar para o Exército, às
vésperas da Revolução de 30. Naquela época, o alistamento era uma forma de
garantir comida, moradia e dinheiro.
Foi no ano de 1939 que o
cantor pediu baixa do quartel onde serviu em Minas Gerais e resolveu se mudar
para o Rio de Janeiro cumprindo uma trajetória comum aos nordestinos de sua
época, que migragram para o Sul e Sudeste do país em busca de melhores
condições de vida. Nesta época, o Nordeste apresentava a menor expectativa
de longevidade do país com uma média de 37 anos de expecativa enquanto que
o Sul chevaga aos 49 e, 43,5, no Sudeste, segundo dados do portal Determinantes
sociais da Saúde. As diferenças regionais, desde as décadas de
1930-40, já demostravam uma concentração de investimentos nas regiões Sul,
Sudeste e Centro-Oeste, que se beneficiaram de iniciativas nos sistemas de
saúde pública, previdência social, infraestrutura urbana e regulamentação do
trabalho. Todos esses fatores concorreram para o controle e redução das doenças
infectocontagiosas, o que não ocorria no Nordeste do país.
Na cidade carioca, Gonzaga
começou a trabalhar como artista de rua. Assim, deu início a um projeto musical
que começaria a dar frutos quando tirou nota máxima no programa do exigente Ary
Barroso, da Rádio Tupi, onde apresentou “Vira e mexe”, canção de sua autoria.
Nessa época, o traje exigido nas apresentação era o smoking. Certo dia, em
1940, influenciado pelo contemporâneo sanfoneiro Pedro Raimundo, gaúcho que
tocava com bombacha típica dos pampas, Gonzaga decidiu assumir a identidade
nordestina nos trajes, que já o acompanhava nos shows públicos, e apareceu na
Rádio Nacional, grande emissora de então, vestido de vaqueiro. Foi impedido de
atuar pelo então diretor artístico da emissora, Floriano Faissal. “Marginal,
não. Roupa de cangaceiro, aqui, não”, teria esbravejado Faissal.
“Existia, de fato, naquela
época, na cultura urbana do Rio, uma valorização do bolero, do foxtrote, das
músicas que faziam a trilha sonora dos filmes americanos e, por conta disto, um
certo preconceito com relação à música nordestina. E isto se estendia à
vestimenta”, relatou, anos mais tarde, o apresentador da emissora, Gerdal dos
Santos. Nos anos de 1940, o traje típico do sertanejo nordestino ainda era
associado ao bando de Lampião, que foi morto pela polícia dois anos antes, em
1938. Apesar do preconceito, Gonzaga não se intimidou. Foi aperfeiçoando o
traje, que já usava em suas apresentações fora da rádio, até conseguir impor
sua imagem e o figurino na emissora. A partir daí, o chapéu de couro e as peças
de sua indumentária foram virando uma das marcas registradas do cantor.
Exaltação ao sotaque e cultura nordestina
Artista cantou o Sertão do Nordeste brasileiro em mais de 500 canções distribuídas em 56 álbuns
(Foto: Reprodução da internet)
“Uma voz que representa todo
um pedaço esquecido do Brasil”. Foi assim que Gonzaguinha, filho de Luiz
Gonzaga, apresentou o cantor no Festival da Canção, em 1980, uma das últimas
turnês do velho Lua. A devoção do Rei do Baião pela terra natal o acompanhou por
toda a sua trajetória e era algo negritado até no sotaque que fazia questão de
adotar em entrevistas e nas construções de canções que compôs sozinho ou em
parceria com nomes como Miguel Lima, Humberto Teixeira e Zé Dantas. A escolha
se justifica pelo preconceito linguístico que a região Nordeste sofria e que
ainda é uma realidade nos dias atuais.
Blog do Paixão