· Author,Julia Braun
· Role,Da BBC Brasil em Londres
CRÉDITO,GETTY IMAGES
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Em Diyarbakir, a nordeste de Gaziantep, estão em andamento buscas por sobreviventes presos nos escombros
Entre um tremor e outro, a brasileira Bárbara Veber procurou seu celular para ligar para o marido, o jogador de futebol Gustavo Campanharo.
"Falei para ele que tudo estava balançando e que achava que o prédio ia desabar. Liguei para me despedir", disse ela à BBC News Brasil.
O relato da gaúcha de 33 anos é um entre os milhares ouvidos nas últimas horas, desde que terremotos atingiram a Turquia na madrugada de segunda-feira (6/2) e provocaram mais de 5 mil mortes ali e na vizinha Síria.
O primeiro tremor, originado perto da cidade turca de Gaziantep, teve 7,8 de magnitude e ocorreu às 4h17 de segunda no horário local (22h17 de domingo, no horário de Brasília), enquanto muitas pessoas dormiam.
Um segundo terremoto, de 7,5 de magnitude, foi registrado perto da cidade de Kahramanmaras às 13h30 de segunda em horário local (7h30 da manhã de segunda-feira, no horário de Brasília).
Bárbara, que mora na cidade de Kayseri com o marido e dois filhos, estava a cerca de 200 quilômetros do epicentro do primeiro tremor.
Ainda assim, teve que se segurar nas paredes para não cair em seu apartamento, depois de ser acordada pelo susto.
"Tudo que estava solto em cima de mesas e outras superfícies caiu no chão", relata. "Quando olhei pela janela, vi que o outro bloco do nosso condomínio estava claramente balançando também."
O marido de Bárbara, que começou a carreira no clube gaúcho Juventude, atua no time do Kayserispor.
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Bárbara e Gustavo moram há 3 anos na Turquia com os filhos Augusto e Gabriel
Rachaduras na parede
A mãe de Augusto, de 8 anos, e Gabriel, de 3, diz que o primeiro tremor durou cerca de 2 ou 3 minutos.
Assim que passou, ela correu até o telefone para ligar para o marido, que estava viajando para uma partida de futebol.
Gustavo, que estava em Giresun, a cerca de 470 quilômetros de Kayseri, e não sentiu os tremores, tentou acalmar a família. Pouco depois, um novo tremor foi sentido.
"Depois do segundo tremor uma vizinha me ligou dizendo que o apartamento dela estava com rachaduras na parede. Decidimos então sair do prédio", diz Bárbara.
No momento do terremoto, ela estava em casa com os dois filhos, sua mãe e uma sobrinha de 12 anos.
"Minha sobrinha foi a primeira a acordar com o tremor e começou a chorar, sem entender o que estava acontecendo."
O filho caçula, Gabriel, continuou dormindo, mas o irmão mais velho também ficou bastante assustado, conta a gaúcha natural de Caxias do Sul.
"Ele sempre colabora em situações de emergência, então mesmo assustado trocou de roupa e me ajudou a pegar tudo para evacuarmos o prédio. Mas ele está visivelmente abalado desde então, sem querer comer."
O prédio onde a família mora teve que ser interditado, apesar de não apresentar grandes danos além das rachaduras e de algumas janelas quebradas.
Desde então, os brasileiros estão abrigados na sede do clube de Gustavo, o Kayserispor.
"Meu filho mais velho já disse que não quer voltar para aquele apartamento. Eu também estou muito fragilizada e com medo de voltar. Há previsão de que novos eventos possam acontecer nas próximas semanas", diz Bárbara.
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Bárbara, seus dois filhos, sua mãe Solange e a sobrinha Ana Lara - mãe e sobrinha passavam férias na Turquia no momento do terremoto
O casal decidiu viajar temporariamente para Istambul – onde não foram registrados grandes tremores – até que a situação se acalme no sul do país.
"Mas ainda não sabemos o que vamos fazer depois", diz a brasileira.
Apesar dos fortes tremores, Kayseri não registrou grande destruição ou mortes.
Ainda assim, Bárbara afirma que a cidade está totalmente mobilizada pelos últimos acontecimentos.
"Muitas pessoas tiveram que sair de casa. A cidade está parada e toda a Turquia de luto."
País propenso a terremotos
O país está localizado em uma das zonas sísmicas mais ativas do mundo, com várias falhas geológicas. Por isso, terremotos não são incomuns em algumas partes do territórios.
Só em 2022, a Turquia registrou mais de 20.000 terremotos. Mas destes, a grande maioria não excedeu a magnitude 4.
No caso mais recente, porém, o epicentro do primeiro tremor foi identificado em uma área relativamente próxima da superfície – cerca de 18 km –, causando sérios danos aos edifícios.
Mas não é apenas a força do tremor que causa devastação. O terremoto inicial ocorreu nas primeiras horas da manhã, quando a população estava dentro de casa e dormindo.
A estrutura dos edifícios e o quão sólidos eles são também é um fator, assim como o preparo da população para agir em situações de emergência.
O tremor de segunda aconteceu em uma região da Turquia que não sofria tremores dessa magnitude havia mais de 200 anos.
Então, tanto a população quanto as edificações stavam pouco preparadas.
Bárbara afirma que ela mesmo nunca passou por uma simulação de terremoto. “Estava despreparada, não sabia como agir”, diz.
O Brasil fica bem no centro da placa tectônica sul-americana, então não costuma sentir grandes abalos.
Normalmente, não passam de 5 de magnitude, medidos pela Escala de Magnitude de Movimento, que substituiu a escala Richter, considerada mais imprecisa.
Número de mortos em terremoto pode ser 8 vezes maior, alerta OMS
· Author,Tiffany Wertheimer
· Role,BBC News
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Equipes de resgate procuram sobreviventes na Turquia
O número de mortos em decorrência dos fortes terremotos na Turquia e na Síria pode ser oito vezes maior, alertou a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Dois tremores atingiram a região com um intervalo de 12 horas na segunda-feira (06/02) — e foram contabilizadas mais de 5 mil mortes até agora (pelo menos 3.419 mil na Turquia; e 1.602 na Síria)
As equipes de resgate vasculham montanhas de escombros, enfrentando temperaturas congelantes e neve, em busca de sobreviventes.
Países do mundo todo estão enviando reforço para ajudar nas tentativas de resgate, incluindo equipes especializadas, cães farejadores e equipamentos.
O Serviço Geológico dos EUA informou que o primeiro tremor — de magnitude 7,8 — ocorreu às 04:17 do horário local (01:17 GMT) a uma profundidade de 17,9 km, perto da cidade de Gaziantep.
Sismólogos acreditam que foi um dos maiores já registrados na Turquia. E, de acordo com relatos de sobreviventes, levou dois minutos até parar.
O segundo terremoto — de magnitude 7,5 — foi desencadeado pelo primeiro, e seu epicentro foi no distrito de Elbistan, na província de Kahramanmaras.
Muitos tremores secundários ainda estão sendo sentidos em toda a região.
O número de mortos e feridos foi aumentando rapidamente na segunda-feira. E, conforme a OMS alertou, deve subir ainda mais à medida que as equipes de resgate encontrarem mais vítimas sob os escombros.
"Infelizmente, sempre vemos a mesma coisa com os terremotos: os números iniciais de pessoas feridas ou mortas vão aumentar significativamente na semana seguinte", disse a oficial sênior de emergência da OMS para a Europa, Catherine Smallwood, à agência de notícias AFP.
Muitas das vítimas estão no norte da Síria, devastado pela guerra, onde milhões de refugiados vivem em acampamentos em ambos os lados da fronteira com a Turquia. Dezenas de mortes foram registradas em áreas controladas por rebeldes.
Os tremores provocaram o desabamento de edifícios em ambos os países — vários vídeos mostram o momento dos desmoronamentos, enquanto pessoas na rua correm para se proteger. Muitos prédios de até 12 andares agora estão no chão, estradas foram destruídas e há montanhas enormes de escombros por todos os lados.
Entre os edifícios destruídos, está o Castelo de Gaziantep, um marco histórico que existe há mais de 2 mil anos.
A jornalista Anna Foster, correspondente da BBC no Oriente Médio, estava na cidade turca de Osmaniye, perto do epicentro. Ela descreveu uma cena devastadora.
"Está chovendo muito, o que está atrapalhando os esforços de resgate. Não há energia elétrica na cidade esta noite. Ainda estamos sentindo tremores secundários regulares... e ainda há preocupações de que possa haver mais desabamentos de prédios."
A infraestrutura energética da Turquia também foi danificada e surgiram vídeos mostrando grandes incêndios no sul do país. Usuários de rede social alegam que foram causados por danos a gasodutos.
O ministro da Energia da Turquia, Fatih Donmez, confirmou que houve sérios danos à infraestrutura, mas não mencionou as explosões.
A Turquia fica em uma das zonas de terremotos mais ativas do mundo.
Em 1999, um terremoto matou mais de 17 mil pessoas no noroeste do país. Mas o pior tremor ocorreu em 1939, deixando 33 mil mortos na província de Erzincan, no leste.
Melisa Salman, moradora de Kahramanmaras, disse que viver em uma zona de terremoto significava que ela estava acostumada a "ser chacoalhada". Mas, ao comentar sobre o tremor de segunda-feira, ela contou que foi "a primeira vez que sentimos algo assim".
"Nós pensamos que era o apocalipse", completou.
O Crescente Vermelho da Turquia pediu aos cidadãos que façam doações de sangue, e o presidente da organização, Kerem Kınık, anunciou no Twitter que mais sangue e produtos médicos estão sendo enviados para a região afetada.
Após fazer um apelo por ajuda internacional, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse que 45 países ofereceram apoio.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, também pediu uma resposta internacional à crise, dizendo que muitas das famílias atingidas pelo desastre "precisam urgentemente de assistência humanitária em áreas em que o acesso é um desafio".
A União Europeia está enviando equipes de busca e resgate para a Turquia, enquanto socorristas da Holanda e da Romênia estão a caminho. O Reino Unido informou que vai enviar 76 especialistas, equipamentos e cães de resgate.
França, Alemanha, Israel e Estados Unidos também se comprometeram a ajudar.
O presidente russo, Vladimir Putin, ofereceu ajuda à Turquia e à Síria, assim como o Irã.
O ministro do Interior da Turquia, Suleymon Soylu, disse que 10 cidades foram afetadas pelo terremoto inicial, incluindo Hatay, Osmaniye, Adiyaman, Malatya, Sanliurfa, Adana, Diyarbakir e Kilis.
Um voluntário do grupo de resgate White Helmets, que opera em áreas controladas por rebeldes no noroeste da Síria, segurou as lágrimas ao descrever a devastação em Sarmada, perto da fronteira com a Turquia.
"Muitos edifícios em diferentes cidades e vilarejos no noroeste da Síria desabaram", disse ele à BBC.
“Até agora, muitas famílias estão sob os escombros. Estamos tentando salvá-las, mas é uma tarefa muito difícil para nós."
"Precisamos de ajuda. Precisamos que a comunidade internacional faça algo, que nos ajude, nos apoie. O noroeste da Síria é agora uma área de desastre", ele acrescentou.
O terremoto foi tão forte que chegou a ser sentido no Chipre, Líbano e Israel.
Blog do Paixão