De acordo com o especialista Leandro Alves, as pessoas não devem alimentar ou se aproximar desses animais silvestres
Por: Malu Mendes
O caso recente de uma mulher atacada por um sagui contaminado com o vírus da raiva em Santa Maria do Cambucá, no Agreste do Estado, trouxe à tona uma discussão sobre os riscos do contato humano com animais silvestres e os impactos da ação humana sobre eles.
Para esclarecer as dúvidas sobre o tema, o Diário de Pernambuco entrevistou o biólogo Leandro Alberto, pesquisador da UFPE e especialista em biologia animal. Veja:
Como os saguis contraem a raiva
De acordo com Leandro, os saguis, como outros animais silvestres, não passam por vacinação como cães e gatos. “Eles estão livres na mata e suscetíveis a vírus por diferentes formas de contato: seja pela troca de mucosas com outros animais, pelo consumo de frutas contaminadas ou por interações próximas”, explicou.
Essa vulnerabilidade é agravada por fatores como o desmatamento e a perda de habitat. “Com a expansão imobiliária e a construção de moradias em áreas de mata fechada, os saguis acabam se aproximando dos humanos. Aldeia, por exemplo, é uma área de vegetação rica, mas que vem sendo intensamente ocupada. Essa invasão do habitat natural leva os animais a se aproximarem e adentrarem nas casas em busca de alimentos”, ressaltou o biólogo.
Muitas vezes, moradores alimentam os saguis com frutas, criando um ciclo perigoso de contato. Além disso, queimadas ilegais também contribuem para a fuga de animais silvestres para áreas urbanas, onde o risco de transmissão de doenças aumenta.
O impacto da raiva nos saguis
O vírus da raiva, ao infectar saguis, causa alterações neurológicas que os tornam mais agressivos.
“Esses animais, ao serem acometidos pelo vírus, apresentam mudanças de comportamento que os levam a ataques, como o ocorrido em Santa Maria do Cambucá.", afirmou Leandro.
Embora outros animais como raposas, cães e gatos também possam contrair raiva, os animais domésticos são protegidos pelas campanhas de vacinação, ao contrário dos animais silvestres, que permanecem vulneráveis.
Ação humana e as consequências ambientais
Leandro enfatizou que o problema vai além do vírus:
“A ocupação desordenada de áreas naturais e a falta de conscientização ambiental são as grandes causas do aumento do contato entre humanos e saguis. Quando destruímos o habitat desses animais, eles acabam se aproximando do ser humano, criando um ciclo perigoso de interação.”
O pesquisador destacou a importância da educação ambiental e de ações de conservação como medidas essenciais. “Devemos evitar alimentar ou tentar domesticar esses animais. É fundamental preservar seu espaço natural e entender que o desequilíbrio ambiental é, em grande parte, causado pelas ações humanas.”
A importância dos saguis
Além dos riscos trazidos pela proximidade com humanos, a perda de saguis no ecossistema gera um impacto ambiental significativo. “Os saguis desempenham um papel essencial na dispersão de sementes, contribuindo para o reflorestamento natural. Quando perdemos esses animais, o ecossistema empobrece, afetando diretamente o equilíbrio ambiental”, explicou o biólogo.
Raiva humana: mulher mordida por sagui está sedada e respira com ajuda de aparelho, diz médica
Paciente tem 56 anos e está internada no Hospital Oswaldo Cruz, em Santo Amaro, no Centro do Recife.
Por Fernanda Soares*, Luna Markman, g1 PE e TV Globo
Hospital Universitário Oswaldo Cruz (HUOC), localizado na região central do Recife — Foto: Pedro Alves/g1
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O estado de saúde mulher de 56 anos que foi diagnosticada com raiva humana é grave e ela respira com ajuda de aparelho, segundo a médica que acompanha o caso. Esse foi o primeiro registro da doença em Pernambuco em 8 anos. A paciente está internada no Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc), em Santo Amaro, no Centro do Recife (veja vídeo acima).
De acordo com Ana Flávia Campos, médica intensivista do Huoc, o vírus foi transmitido por um animal silvestre, um sagui, o que pode complicar a virulência, que é a capacidade de um vírus em se multiplicar num organismo.
"Ela está sedada e sendo monitorada da melhor forma possível, para que a gente possa investigar precocemente as possíveis complicações da doença", disse.
A mulher é natural de Santa Maria do Cambucá, no Agreste. Ela foi mordida pelo sagui na mão esquerda em 28 de novembro de 2024. Na época, ela procurou atendimento e foi orientada a retornar para tomar soro e quatro injeções. Entretanto, não seguiu com o tratamento.
Segundo a médica, os sintomas se manifestaram e o quadro se agravou quase 30 dias depois. Ela voltou a procurar atendimento na cidade em que mora e, de lá, foi transferida para o Huoc, onde está internada desde 31 de dezembro.
"Ela buscou atendimento quase quatro semanas depois. Entre o acontecimento da mordedura e o desenvolvimento dos sintomas, esse tempo pode ser bastante prolongado. Normalmente, são semanas, mas pode chegar a meses", disse a médica.
Apesar da taxa de letalidade ser considerada de 100%, em 2009, um adolescente pernambucano de 16 anos foi o primeiro brasileiro a se curar da raiva humana. Marciano Menezes da Silva estava dormindo quando foi mordido por um morcego e contaminado pela doença. Ele foi internado no Huoc, onde foi tratado.
Ainda segundo Ana Flávia Campos, no caso da mulher de Santa Maria do Cambucá, a doença se agravou por causa da falta da profilaxia.
"A raiva humana é uma doença letal. Então, após o contato com animal que potencialmente pode transmitir a raiva humana, é imprescindível que esse indivíduo procure o serviço médico para receber as orientações necessárias", afirmou a médica.
O que é raiva humana?
A raiva humana é uma doença causada pelo vírus do gênero Lyssavirus, que é encontrado geralmente em morcegos hematófagos, que se alimentam de sangue.
Ela pode ser transmitida pelo contato com saliva e secreções de mamíferos infectados, sejam eles cães, gatos, macacos, bovinos, porcos, além do próprio morcego, entre outros. Os sintomas podem aparecer dois a dez dias após o período de incubação.
Segundo o Ministério da Saúde, entre 2010 e 2024, foram registrados 48 casos no país: nove causados por mordidas de cães; 24, por morcegos; seis, por primatas não humanos; dois, por raposas; quatro, por felinos; e um, por bovino.
A prevenção contra a raiva pode ser feita por meio da vacinação. A vacina é administrada tanto em humanos quanto em animais de estimação.
Pernambucano de Floresta foi o primeiro caso de cura da doença
A mordida de um morcego hematófago infectou Marciano Menezes da Silva, no Sertão do estado, em 2008
Por: Diario de Pernambuco
Morcego hematófago, ou morcego vampiro, é um dos transmissores da raiva para humanos e animais (Reprodução/Freepik)
Aos 16 anos, Marciano Menezes da Silva foi contaminado pela raiva humana após ser mordido por um morcego hematófago próximo a sua residência em Floresta, no Sertão de Pernambuco. De outubro de 2008 a setembro de 2009, ele ficou internado e terminou se tornando um caso de referência mundial no tratamento como o primeiro brasileiro, e terceiro no planeta, a ser curado da doença.
O caso de Adriana Vicente da Silva, então com 35 anos, não teve o mesmo desfecho, em 2017. A dona de um pet shop foi mordida por um gato infectado pelo vírus de origem silvestre, que possivelmente teve contato com um morcego hematófago.
A empresária só procurou uma unidade de saúde cerca de dois meses depois, quando começou a apresentar sintomas da doença. Ela deu entrada no Hospital da Restauração e, com o agravamento, transferida para o Hospital Oswaldo Cruz, onde faleceu.
Foi o último caso de raiva humana registrado em Pernambuco.
Blog do Paixão