Por: Laryssa Borges, de Brasília
O
presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), preside sessão de
votação do Projeto de Resolução 134/16, que determina o recálculo da
proporcionalidade partidária para a composição de comissões - 27/04/2016(Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
O ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar na
manhã desta quinta-feira determinando que o presidente da Câmara dos Deputados
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) seja suspenso de seu mandato parlamentar e,
consequentemente, da presidência da Casa legislativa. De acordo com a decisão,
Cunha continua deputado e com foro privilegiado, mas está com o mandato
suspenso.
A liminar de Teori Zavascki atende a um pedido do procurador-geral da
República Rodrigo Janot, que em dezembro pediu o afastamento do parlamentar por
considerar que há indícios suficientes de que o peemedebista tem utilizado o
cargo de congressista para travar investigações contra ele e envolvendo o
bilionário escândalo de corrupção do petrolão. Uma das fases da Operação Lava
Jato, denominada Catilinárias, foi deflagrada no final do ano passado para colher
provas contra políticos suspeitos de atuar para blindar as apurações do
petrolão.
Ao pedir o afastamento do deputado, Janot defendeu que a medida era
crucial para "garantir a ordem pública", a regularidade das
investigações e a atuação normal das investigações do Conselho de Ética e
Decoro Parlamentar. O Ministério Público diz que as suspeitas contra Eduardo
Cunha são "anormais" e que as acusações contra ele de manter dinheiro
de propina em contas secretas na Suíça e de ter recebido propina de operadores
do esquema do petrolão podem acarretar a perda do mandato. Ao todo, Rodrigo
Janot diz ter reunido onze situações em que Eduardo Cunha usou seu mandato para
travar ou pelo menos atrasar as investigações da Lava Jato.
Desde o ano passado, o MP tinha montado uma ofensiva em busca de provas
cabais da atuação de Eduardo Cunha para travar a Operação Lava Jato, intimidar
desafetos, utilizar aliados em prol de seus interesses e direcionar processos
de criação de leis em benefício próprio. Na peça enviada ao ministro Teori
Zavascki, o chefe do Ministério Público narra em detalhes cada momento em que
Eduardo Cunha, segundo as palavras dele, transformou a Câmara em um
"balcão de negócios" em benefício de suas conveniência.
"Eduardo Cunha tem adotado, há muito, posicionamentos absolutamente
incompatíveis com o devido processo legal, valendo-se de sua prerrogativa de
Presidente da Câmara dos Deputados unicamente com o propósito de autoproteção
mediante ações espúrias para evitar a apuração de suas condutas, tanto na esfera
penal como na esfera política. Eduardo Cunha transformou a Câmara dos Deputados
em um 'balcão de negócios' e o seu cargo de Deputado Federal em mercancia,
reiterando as práticas delitivas. Eduardo Cunha recebia valores, seja por
doações oficiais, para si ou para os Deputados que o auxiliavam (também este o
motivo pelo qual possui tantos seguidores), ou por meio de pagamentos
ocultos", resume.
A seguir, os 11 episódios em que o Ministério Público diz que Eduardo
Cunha usou o mandato de deputado federal e a presidência da Câmara em proveito
próprio.
Obstrução de investigações e pressão a desafetos: Segundo o Ministério Público, Eduardo Cunha utilizou
correligionários para apresentar dois requerimentos perante a Comissão de
Fiscalização Financeira e Controle da Câmara como forma de pressionar o lobista
Julio Camargo, delator da Lava Jato e responsável pela acusação de que o
peemedebista recebeu 5 milhões de dólares em propina. Em 2011, a ex-deputada
Solange Almeida, aliada de Cunha, solicitou ao Tribunal de Contas da União
(TCU) e ao então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA),
informações muito similares às que o doleiro Alberto Youssef indicou em seu
depoimento: dados de contratos, auditorias, aditivos e licitações que envolviam
"o Grupo Mitsui com a Petrobras ou qualquer das suas subsidiárias no
Brasil ou no exterior". Os requerimentos comprovariam, na avaliação do
Ministério Público, que aliados de Cunha fizeram pressão política sobre a
Mitsui e o lobista Julio Camargo depois de supostos atrasos no pagamento de
propina.
Pressão ao Grupo Schahin: Em
episódio semelhante aos requerimentos apresentados pela deputada Solange
Almeida, o procurador-geral Rodrigo Janot disse que Eduardo Cunha utilizou sua
influência política junto a aliados para intimidar o Grupo Schahin. A PGR
aponta que Cunha utilizou deputados para encaminhar requerimentos envolvendo a
Barragem de Apertadinho (RO) e, com isso, pressionar para que houvesse
pagamento de propina Grupo Schahin. Em depoimento, Milton Schahin disse que o doleiro
Lúcio Funaro atuava em nome de Cunha na estratégia de pressão ao Grupo Schahin.
A relação entre Eduardo Cunha e Funaro também é reforçada pelo fato de estar
registrado em nome da empresa C3 Produções Artísticas e Jornalísticas, do
deputado e da esposa dele Cláudia Cruz, dois cargos de luxo pagos com cheques
das empresas Cingular e Royster, de Funaro.
Pressão e convocação da advogada Beatriz Catta Preta na CPI da
Petrobras: O Ministério Público acusa
Eduardo Cunha de ter trabalhado para a convocação da advogada criminalista
Beatriz Catta Preta na CPI da Petrobras depois de um dos clientes dela, o
lobista Julio Camargo, ter revelado que pagou propina de 5 milhões de dólares
ao deputado por contratos de navios-sonda com a Petrobras. "Relevante notar
que um dos atos que antecedeu as investidas contra Catta Preta foi justamente a
oitiva que Julio Camargo realizada no dia 10 de junho de 2015, no qual revela
que Eduardo Cunha foi uma dos beneficiários da propina paga em razão da
aquisição dos navios-sonda da Samsung", relata o MP.
Contratação da empresa de investigação Kroll: No embasamento do pedido de afastamento de Eduardo Cunha, o MP diz
que a Câmara dos Deputados contratou a empresa de espionagem Kroll
exclusivamente para investigar delatores da Operação Lava Jato e, se
encontrasse inconsistências nos depoimentos deles, colocar em xeque a
credibilidade das revelações trazidas pela Operação Lava Jato. Sobre a atuação
da Kroll, diz o Ministério Público: "chama a atenção o fato de nenhum
político ter sido incluído na lista e 75% dos alvos serem colaboradores da
Justiça. Não que os colaboradores estejam 'blin-dados' de serem investigados,
mas salta aos olhos o direcionamento dado à empresa contratada".
Direcionamento da CPI da Petrobras contra o Grupo Schahin e contra
Alberto Youssef: Utilizando aliados na
fracassada CPI da Petrobras, Eduardo Cunha instruiu deputados a pressionar e
constranger o Grupo Schahin, mais uma vez por meio do doleiro Lúcio Funaro.
"No exato dia da instauração da CPI da Petrobras, Funaro enviou e-mail
afirmando que o Grupo Schahin seria convocado", diz o Ministério Público.
Para a acusação, o direcionamento contra a empresa, que não integrava o Clube
do Bilhão de empreiteiras da Lava Jato, por exemplo, evidencia o uso do poder
de Eduardo Cunha na perseguição a desafetos. "Os fatos narrados visam tão
somente demonstrar o desvio de finalidade dos parlamentares mencionados ao
exercer a relevante função fiscalizadora ínsita ao Poder Legislativo".
Apontado como um dos principais delatores da Operação Lava Jato, o
doleiro Alberto Youssef teve a família utilizada como forma de pressão na CPI
da Petrobras. Nos trabalhos da comissão, o então deputado Celso Pansera
(PMDB-RJ), atual ministro de Ciência e Tecnologia, apresentava requerimentos de
convocação de quebra de sigilo contra as filhas, a ex-mulher e a irmã do
delator. Pansera foi classificado por Youssef como "pau mandado de
Cunha". "Este requerimento de convocação da filhas de Alberto Youssef
e de sua ex-mulher teve o único objetivo de intimidar o Colaborador que revelou
em depoimento formal à Justiça e ao Ministério Público que Eduardo Cunha foi um
dos beneficiários da propina da Petrobras", explica o MP.
Projeto de lei para derrubar acordos de delação premiada: Por meio do deputado aliado Heráclito Fortes (PSB-PI), Eduardo
Cunha teria pressionado pela apresentação de um projeto de lei que impede que
delatores corrijam informações ou acrescentem dados novos em depoimentos já
prestados. Para o procurador-geral, a iniciativa seria uma retaliação ao
lobista Julio Camargo, que em depoimento extra disse que pegou 5 milhões de
dólares em propina a Eduardo Cunha em uma transação envolvendo a Petrobras e a
Samsung Heavy Industries. Ao justificar porque só citou o deputado federal em
uma oitiva complementar, Camargo disse que temia a atuação do presidente da
Câmara.
Demissão de servidor que contrariou interesses: O Ministério Público aponta ainda que Eduardo Cunha, utilizando
sua influência política, demitiu o servidor Luiz Antônio Souza da Eira, então
Diretor do Centro de Informática da Câmara dos Deputados, depois de ele ter
reconhecido que era de Cunha a autoria de requerimentos de pressão de
desafetos, como Julio Camargo.
Atrapalhar funcionamento do Conselho de Ética: A PGR lista as tentativas de Cunha e aliados de barrar o andamento
do processo por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Câmara.
Parlamentares do conselho levaram ao Ministério Público evidências de que
aliados do peemedebista tentaram travar as votações com questões de ordem, de
que Cunha demorou a ceder um auditório para realizar a sessão inicial e abriu
votações no plenário - a chamada ordem do dia - antes do horário comum para
forçar o encerramento da reunião no colegiado. Um aliado de Cunha, o deputado
Felipe Bornier (PSD-RJ) chegou a anular a sessão por completo. Na última
cartada, um recurso à Mesa Diretora, o primeiro relator do caso, deputado
Fausto Pinato (PRB-SP), foi destituído do cargo.
Ameaças a Fausto Pinato, ex-relator do processo de cassação no Conselho
de Ética: Janot ligou a Eduardo Cunha as
ameaças que o ex-relator do processo contra o peemedebista no Conselho de
Ética, deputado Fausto Pinato (PRB-SP), contou ter recebido por meio de seu
motorista, depois de assumir o caso. O deputado disse que mantinha bom relacionamento
geral, mas passou a ser assediado depois de relatar a representação contra
Cunha. Um funcionário do gabinete de Pinato contou ter sido abordado em
Fernandópolis (SP), ao deixar a mulher e a filha do deputado em casa, por dois
motoqueiros que faziam menção ao processo e em mandar o deputado "para o
céu". O motorista depôs e confirmou o teor da denúncia.
Novas ameaças e oferta de propina a Fausto Pinato: Pinato também afirmou ter recebido oferta de propina de
desconhecidos. A Polícia Federal apreendeu no bolso de um paletó e no
escritório da residência de Cunha boletins de ocorrência referentes às
denúncias de Pinato.
Oferecer o mandato como 'balcão de negócios' ao BTG e à OAS: A PGR obteve cópias de mensagens em que Cunha, por e-mail e
Whatsapp, combina com Léo Pinheiro, executivo da OAS, e Manuel Ribeiro, também
da OAS, a aprovação de emendas em Medidas Provisórias (MPs) para beneficiar os
interesses da empreiteira. Apelidado de "escriba", Ribeiro era o elo
da OAS com Cunha e "elaborava os projetos e medidas para tramitar na
Câmara. O Ministério Público também obteve indícios de que Cunha atuava em
conluio com André Esteves, do BTG Pactual, a fim de ter favorecimento a bancos
em processo de liquidação. Rodrigo Janot apontou ao todo onze MPs em que Cunha
articulou para beneficiar as empresas, em detrimento do interesse público.
Segundo a PGR, Cunha pôs o mandato à disposição das empresas pelo menos desde
2012 e usava influência em parlamentares aliados para conseguir modificar os
textos das leis. Em troca, obtinha propina e doações eleitorais para si e para
aliados. Um dos indícios é o manuscrito com relato de que ele teria recebido 45
milhões de reais para beneficiar o BTG.
Postar um comentário
Blog do Paixão