Delação dos donos da JBS mostra que a Lava Jato não escolhe partidos.
Nela, estão implicados o presidente Michel Temer, os petistas Lula e Dilma
Rousseff, além dos tucanos Aécio Neves e José Serra. O Brasil não vivenciava
uma crise política tão grave desde a morte de Getúlio em 1954. Qual a saída
para o caos?
Ary Filgueira / Isto É
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Desde o início da Lava Jato, há três anos, os petistas tentam emplacar
uma narrativa não correspondente aos fatos: a de que a operação foi forjada para
exterminar o PT e colocar atrás das grades o ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, impedindo-o de concorrer novamente à Presidência. Igualmente envolvidos
em escândalos de corrupção, cabeças coroadas de PMDB e PSDB, segundo a mesma
tese da vitimização, receberiam a condescendência de uma Justiça que se
apresentaria de olhos vendados para suas práticas nada republicanas. Na última
semana, prevaleceu na Lava Jato a chamada “erga omnes”, um latinismo utilizado
no meio jurídico para designar que a lei e a Justiça valem para todos, sem
distinção: o presidente da República, Michel Temer, do PMDB, e os tucanos Aécio
Neves e José Serra – bem como os petistas Lula e Dilma, figuras carimbadas de
outros escândalos – foram severamente atingidos pela delação dos empresários
Joesley e Wesley Bastista, donos da empresa global JBS.
O roteiro obedeceu ao script de casos anteriores que implicaram apenas
os integrantes do PT: vazamento pela imprensa dita (por eles) “golpista”,
alguma imprecisão nas informações divulgadas e gravações às escondidas em que o
delator induz diálogos a fim de flagrar a autoridade em situações embaraçosas.
Só que pelo menos num primeiro momento, calculadamente, não se ouviu da
militância organizada um reparo sequer à atuação do Ministério Público que
solicitou – e conseguiu – autorização do Supremo Tribunal Federal para
investigar o presidente da República, justamente no momento em que o País
demonstrava fôlego econômico. Residem aí duas faces antagônicas de uma
importante constatação: a deletéria ao País é que, sim, ainda há uma parcela da
sociedade suscetível a discursos rasos, demagógicos e sem conexão com a
realidade, cujo único propósito é o de guindar de volta ao Palácio do Planalto
aqueles que por 13 anos institucionalizaram a corrupção no País, não só para se
perpetuarem no poder como para enriquecimento próprio. A principal delas, e
fundamental para a consolidação das instituições, é que a tarefa de limpeza
moral e ética da qual se imbuiu os membros da força-tarefa da Lava Jato não
deve mesmo ser interrompida, mesmo diante de pressões de toda ordem.
Conspiração?
A maior prova disso foi dada nos últimos dias. Na quarta-feira 17, o jornal OGLOBO antecipou trechos da colaboração premiada dos donos da JBS que implicam Temer. O inteiro teor de áudios, em que o presidente aparece em conversas constrangedoras com Joesley, foi conhecido no dia seguinte. Nele, Joesley narra a Temer, em conversa mantida no Palácio do Jaburu no dia 7 de março, o cometimento de vários crimes: entre eles, o pagamento de mesadas ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, como forma de comprar seu silêncio e a cooptação de juízes e procuradores da República, com objetivo de limpar a barra da empresa no âmbito da Lava Jato. No diálogo, Temer denota atitude incompatível com o cargo de presidente da República. Num dado momento, Joesley diz que está tentando trocar um procurador da República, que o estava investigando. O presidente ouviu e nada fez. Diante da divulgação dos áudios, o País foi incendiado. O Palácio do Planalto, o Legislativo e o mercado financeiro ficaram absolutamente aturdidos. Correu no País o rumor de que ele pediria renúncia do cargo. Ao fim do dia, Temer reuniu a imprensa e disse de maneira taxativa: “Não renunciarei. Repito, não renunciarei”. E acrescentou: “sei o que fiz e sei a correção dos meus atos”.
A maior prova disso foi dada nos últimos dias. Na quarta-feira 17, o jornal OGLOBO antecipou trechos da colaboração premiada dos donos da JBS que implicam Temer. O inteiro teor de áudios, em que o presidente aparece em conversas constrangedoras com Joesley, foi conhecido no dia seguinte. Nele, Joesley narra a Temer, em conversa mantida no Palácio do Jaburu no dia 7 de março, o cometimento de vários crimes: entre eles, o pagamento de mesadas ao ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, como forma de comprar seu silêncio e a cooptação de juízes e procuradores da República, com objetivo de limpar a barra da empresa no âmbito da Lava Jato. No diálogo, Temer denota atitude incompatível com o cargo de presidente da República. Num dado momento, Joesley diz que está tentando trocar um procurador da República, que o estava investigando. O presidente ouviu e nada fez. Diante da divulgação dos áudios, o País foi incendiado. O Palácio do Planalto, o Legislativo e o mercado financeiro ficaram absolutamente aturdidos. Correu no País o rumor de que ele pediria renúncia do cargo. Ao fim do dia, Temer reuniu a imprensa e disse de maneira taxativa: “Não renunciarei. Repito, não renunciarei”. E acrescentou: “sei o que fiz e sei a correção dos meus atos”.
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Não tem como negar |
Internamente, no Planalto foi disseminada a tese de um complô para apear
Temer do poder e frear reformas importantes para o País, como a da Previdência.
“Fui vítima de uma conspiração”, disse o presidente a interlocutores na
quinta-feira 18. Independentemente de o Planalto estar correto ou não quanto à
existência de uma armação contra o governo, há elementos capazes de conferir
verossimilhança às alegações. Claro, a crise é grave e o presidente da
República será instado a responder pelos seus atos. Nas gravações, há
evidências de prevaricação, no mínimo, e se incorreu em crime, Temer como
qualquer outro cidadão deste País deve estar sujeito aos rigores da lei. Mas é
importante ter em mente também que o vazamento da delação do empresário Joesley
Batista não foi acidental. Tratou-se de algo muito bem calculado por todos
atores envolvidos, muitos dos quais, seguramente interessados em provocar
instabilidade ao governo, no momento em que a economia dava sinais de
recuperação. Por exemplo, o modus operandi do vazamento foi todo montado para
que o fato político se impusesse, antes mesmo do conhecimento dos áudios.
Inicialmente, consolidou-se na praça a versão de que Temer havia concedido o
aval a Joesley para a compra do silêncio do ex-presidente da Câmara, com a
fatídica frase “tem que manter isso, viu?”. Ou seja, o impacto político já era
irreversível. A lentidão em dar publicidade à gravação acabou deixando o
presidente emparedado.
Quando foram divulgados os trechos, em áudio, ficou clara a imprecisão
na edição das conversas. Embora estivesse no contexto da compra de Cunha, a
frase “tem que manter isso, viu?” não sucedia outra que versasse literalmente
sobre o pagamento do silêncio do peemedebista preso. Ou seja, não há a anuência
à propina, como se quis vender no início. Ademais, havia trechos inaudíveis, a
gravação continha picotes, que lembram uma edição mal feita. Essa hipótese
ainda poderá vir a ser comprovada por meio de perícia na gravação, solicitada
pelo presidente. Em declaração à imprensa, Temer disse: “A montanha pariu um
rato”, redimensionando o que se achava que teria nas gravações e o que de fato
havia nelas. Outros trechos, sim, sugerem prevaricação, discussão sobre
obstrução de justiça e ciência sobre negociação de vantagem indevida. E o
presidente se fragiliza politicamente por isso. Mas o caldo já estava entornado
de antemão.
O fato é que o áudio é inconclusivo sobre a culpabilidade de Temer.
Analisando mais profundamente o material, é possível notar outro aspecto. Por
exemplo, o enredo é de um empresário que narra crimes em série e tenta induzir
o presidente da República a falar o que ele queria ouvir.
Quem se apresenta indiscutivelmente como o partícipe do esquema é o
deputado Rodrigo Rocha Lourdes (PMDB). O parlamentar foi filmado pela Polícia
Federal recebendo uma mala com R$ 500 mil entregue por Joesley Batista. As
cédulas tinham seus números de série informados aos procuradores e as malas e
mochilas continham rastreadores. A reação do Supremo Tribunal Federal foi
imediata. Logo após a divulgação da conversa, o ministro Edson Fachin, que
conduz os processos da Operação Lava Jato no STF, determinou que fosse aberto
inquérito para investigar as denúncias contra o Temer. Fachin atendeu a um
pedido do procurador-geral da República Rodrigo Janot. É a segunda vez que um
presidente do País é investigado durante exercício do mandato. O primeiro foi o
ex-presidente Fernando Collor, hoje senador, em 1991.
Comprovadas as suspeitas, o procurador oferece denúncia ao STF, que
analisa se torna o presidente réu ou não. A reversão de expectativas em
relação aos áudios, no entanto, arrefeceu a pressão no Congresso. O PSDB e o
PPS que ameaçaram desertar, recuaram aos 45 minutos do segundo tempo, mostrando
serenidade na hora de examinar os fatos, que é o que o Brasil precisa no
momento. Outras agremiações não tomaram o mesmo caminho.
O PSB saiu em retirada. A legenda já vinha demonstrando um desconforto
com as reformas encaminhadas ao Congresso. Embora houvesse orientação para que
sua bancada votasse contra os projetos, a sigla estava dividida. Dos 30
deputados, apenas 14 se mantinham fiéis ao Palácio do Planalto. Mas, na
quinta-feira 18, um dia após a divulgação do conteúdo da gravação, a relação
azedou. O presidente Carlos Siqueira determinou que o ministro de Minas e
Energia, Fernando Coelho Filho, entregasse o cargo e reforçasse a bancada do
partido na Câmara.
Mesmo com popularidade baixa, o presidente Michel Temer sempre gozou de
prestígio no parlamento. Diferentemente de sua antecessora Dilma Rousseff,
Temer contabilizava uma base ampla na Câmara e no Senado. O apoio tem sido
fundamental para a aprovação de medidas importantes, como a contenção dos gastos
públicos. E seria importante para as futuras batalhas travadas em torno de
reformas da Previdência e Trabalhista. Agora, Temer procura reconstruir esse
apoio. Prevista para ser analisada na quinta-feira 18, a Reforma Trabalhista
foi tirada da pauta do Senado pelo senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Na rede
social, o senador capixaba justificou o gesto: “diante da gravidade que vive o
País, o bom senso diz que é necessário priorizar a solução da crise
institucional para depois darmos desdobramento ao debate relacionado à reforma
tributária”.
Votação
no TSE
Com o novo cenário, Temer corre o risco não apenas de ser derrotado em votações importantes no Congresso, como também ter seu mandato ameaçado na Casa. Ao todo, foram encaminhados oito requerimentos de impeachment na Câmara. Cabe ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aceitá-los ou não. Por ora, no entanto, a tendência é pelo não encaminhamento dos pedidos. Ou seja, esse não é o caminho mais provável. Mas a panela pode ferver para Temer no TSE. O julgamento está previsto para ser retomado em 6 de junho. Serão julgadas quatro ações do PSDB por abuso de poder econômico e político da chapa Dilma-Temer. Com a cassação da chapa, abre-se chance para que ocorram eleições indiretas.
Com o novo cenário, Temer corre o risco não apenas de ser derrotado em votações importantes no Congresso, como também ter seu mandato ameaçado na Casa. Ao todo, foram encaminhados oito requerimentos de impeachment na Câmara. Cabe ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), aceitá-los ou não. Por ora, no entanto, a tendência é pelo não encaminhamento dos pedidos. Ou seja, esse não é o caminho mais provável. Mas a panela pode ferver para Temer no TSE. O julgamento está previsto para ser retomado em 6 de junho. Serão julgadas quatro ações do PSDB por abuso de poder econômico e político da chapa Dilma-Temer. Com a cassação da chapa, abre-se chance para que ocorram eleições indiretas.
Nesse caso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ficaria encarregado de
convocar o Congresso para eleger o sucessor de Temer em 30 dias. Outra
hipótese, é Temer optar por renunciar ao mandato, possibilidade que está
afastada nesse momento.
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“Não renunciarei” Presidente Michel Temer, em pronunciamento na quinta-feira 18 (Crédito:Mateus Bonomi/AGIF; STF) |
“Não renunciarei” Presidente Michel Temer, em pronunciamento na quinta-feira 18 (Crédito:Mateus Bonomi/AGIF; STF)
Pesa contra essa modalidade o fato de ele não ter mais direito ao foro
especial. O caso seguiria para a Justiça de primeira instância. Ficaria mais
fácil de ele ser processado e ter até um mandado de prisão decretado, pois não
dependeria da composição do plenário do STF.
Tanto nesse caso quanto na possibilidade de impeachment, o Congresso
escolhe novo presidente para governar até 2018 em eleição indireta. Ocorre que,
no meio desse caldeirão, grupos interessados no retorno de Lula ao poder já
articulam a volta das “Diretas Já”. Só há possibilidade de eleição direta se o
Congresso aprovar uma PEC. O portador dessa proposta indecente, na semana
passda, foi o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que ressuscitou uma proposta
antiga de sua autoria. O texto prevê a realização do pleito até seis meses
antes do final do mandato, caso a Presidência fique vaga.
Desde 1954, quando Getúlio disparou um tiro no peito e deixou a vida
para entrar na história, o Brasil não enfrentava uma crise tão grave. O destino
do País é incerto. As portas de saídas permanecem obscuras. O certo é que as
investigações devem continuar.
A
recuperação da economia precisa continuar
Nos últimos meses, o noticiário econômico deu ao mercado financeiro
muito pouco do que se queixar. A inflação e a taxa básica de juros, a Selic,
tiveram consecutivas quedas. O PIB do primeiro trimestre foi positivo. O país
voltou a gerar empregos e abriu quase 60 mil vagas em abril. A recuperação da
economia, comandada pela política do ministro da Fazenda Henrique Meirelles,
caminhava satisfatoriamente, mas ainda dependia da consolidação das reformas
trabalhista e previdenciária para continuar avançando. E isso precisa ser
mantido, para a criação do ambiente de segurança jurídica e econômica que Temer
prometeu aos empresários no ano passado.
Por isso, o mercado financeiro entrou em pânico na manhã de quinta-feira
18, com o surgimento de detalhes da delação da JBS. A perspectiva de ver essa
recuperação ameaçada, levou a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) a
interromper os negócios durante trinta minutos para controlar a queda de
10,47%. As ações da Petrobras e papéis do setor financeiro recuaram quase 20% e
o dólar chegou a ser cotado a R$ 3,40, obrigando o Banco Central a vender US$ 2
bilhões para conter a queda. Na sexta-feira 19, contudo, após Michel Temer
dizer que não renunciaria, o mercado começou a reagir, com o dólar caindo e a
Bovespa se valorizando. (Barbara Libório)
Os
cenários para superar a crise
REFORMAS
Manutenção da atual política do governo Temer de realizar as reformas da Previdência, Trabalhista, Tributária e Política, o que seria a saída menos turbulenta
Manutenção da atual política do governo Temer de realizar as reformas da Previdência, Trabalhista, Tributária e Política, o que seria a saída menos turbulenta
RENÚNCIA
A renúncia é uma das possibilidades, mas depende de um gesto individual de Temer, que tem dito que não pretende renunciar
A renúncia é uma das possibilidades, mas depende de um gesto individual de Temer, que tem dito que não pretende renunciar
TSE
A chapa Dilma/Temer pode ser cassada no próximo dia 6 de junho
A chapa Dilma/Temer pode ser cassada no próximo dia 6 de junho
ELEIÇÃO
INDIRETA
Se Temer renunciar ou for cassado pelo TSE, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, assume por 30 dias e convoca eleição indireta no Congresso. O problema é que quase todos os congressistas estão envolvidos em denúncias de corrupção. A solução seria alguém de fora, de reputação ilibada, como a ministra do STF Cárrnen Lúcia
Se Temer renunciar ou for cassado pelo TSE, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, assume por 30 dias e convoca eleição indireta no Congresso. O problema é que quase todos os congressistas estão envolvidos em denúncias de corrupção. A solução seria alguém de fora, de reputação ilibada, como a ministra do STF Cárrnen Lúcia
IMPEACHMENT
Caso Temer não renuncie ou não seja cassado pelo TSE, pode sofrer processo de impeachment, mas esse processo é mais demorado e o País não agüenta mais um longo período de indefinição política
Caso Temer não renuncie ou não seja cassado pelo TSE, pode sofrer processo de impeachment, mas esse processo é mais demorado e o País não agüenta mais um longo período de indefinição política
ELEIÇÃO
DIRETA
Para que aconteça eleição direta para presidente, o Congresso precisa aprovar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) estabelecendo eleições gerais já, conforme propõe o deputado Miro Teixeira. Esse processo também é demorado e deixaria um vazio no poder enquanto não se escolheria o novo presidente
Para que aconteça eleição direta para presidente, o Congresso precisa aprovar uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) estabelecendo eleições gerais já, conforme propõe o deputado Miro Teixeira. Esse processo também é demorado e deixaria um vazio no poder enquanto não se escolheria o novo presidente
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Blog do Paixão