O ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso debateu a judicialização da política com o jurista e colunista de ÉPOCA Conrado Hübner Mendes e o jornalista Felipe Recondo
O ministro Luís Roberto Barroso falou para o
público da Casa ÉPOCA & Vogue - Foto: Marcelo Saraiva
POR RUAN DE
SOUSA GABRIEL / fONTE: ÉPOCA
No final da tarde deste sábado (28),
uma multidão se aglomerou na rua da Matriz, no centro histórico de Paraty, à
espera da última mesa da Casa de Não Ficção ÉPOCA & Vogue: "A
judicialização da política". A mesa reuniu o ministro do Supremo Tribunal
Federal Luís Roberto Barroso, o jurista e colunista de ÉPOCA Conrado Hübner
Mendes e o jornalista Felipe Recondo, sócio-fundador do JOTA, um site
especializado na cobertura Poder Judiciário, e autor de Tanques e togas: o STF e a
ditadura militar (Companhia
das Letras).
Hübner Mendes, Recondo e o ministro
Barroso - Marcelo Saraiva
Hübner Mendes afirmou que é impossível
discutir a judicialização da política em abstrato, por meio de conceitos
etéreos. É essencial, disse ele, perguntar "qual judicialização, onde,
quando e por quê?". Ele também acusou os ministros do STF de
individualismo, apontou para a incapacidade da corte de tomar decisões
coletivas e para o excesso de decisões monocráticas. "Isso quebra o
tribunal. Ele se divide em 11 pedaços que ainda atacam um ao outro na
imprensa", provocou. Hübner Mendes também comparou o STF a uma loteria,
pois a corte não compartilha com a sociedade as razões que a levam a julgar
este ou aquele processo. "O Supremo boicota a esfera pública, que é impedida
de participar de um bom debate constitucional."
Barroso não quis revelar se já escolheu
o candidato à presidência - Marcelo Saraiva
Barroso, antes de responder as
provocações e críticas, deu uma definição de judicialização da política:
"judicialização significa que grandes decisões políticas, morais, sociais,
econômicas e até religiosas têm seu último capítulo perante o Poder
Judiciário". O ministro apontou as causas do fenômeno: ascensão do
Judiciário das democracias no pós-guerra e desprestígio crescente da política
partidária. E uma causa mais específica: a necessidade de criar novas regras
quando não há ordenamento jurídico suficiente para sustentar uma decisão, o
que, segundo Barroso, é um reflexo da amplitude da Constituição de 1988.
"A Constituição brasileira só não traz a pessoa amada em três dias. O resto,
procurando se acha", brincou.
A quantidade de decisões monocráticas,
disse Barroso, é resultado da "competência criminal" que o STF
acumulou. Ou seja: os julgamentos de crimes cometidos por políticos que têm
foro privilegiado. A quantidade de crimes cometidos por agentes públicos é tamanha
que prejudica o fluxo da pauta na corte. O ministro também aproveitou para
elogiar o STF lembrando de decisões que contrariaram alguns políticos
influentes que ele, discreto, chamou de "A", "T" e
"L", referências a Aécio Neves, Michel Temer e Lula.
"Conrado, o ministro talvez esteja
flutuando quando diz que o estamos num bom momento do Supremo?", provocou
Recondo. "Acho que está." Hübner Mendes disse que não basta listar as
decisões admiráveis do STF, mas é preciso também lembrar de suas decisões
problemáticas. Ele acusou o Supremo de, mesmo quando toma decisões notáveis,
falhar na criação de jurisprudência. Hübner Mendes citou a aprovação do
casamento entre pessoas do mesmo sexo como exemplo. Afirmou que a decisão deve
ser celebrada, mas, infelizmente, é "uma bagunça argumentativa".
"Essa decisão não constrói uma jurisprudência da igualdade. Amanhã, essa
decisão pode não ajudar um outro caso, pois não deixa claro o que o STF entende
por igualdade", analisou. "O STF se recusa a ser autocrítico e
transparente com seus erros. Não quer decidir, não constrói jurisprudência e
deixa a Constituição ao sabor do vento."
Recondo lembrou o ministro da recente
briga dele com seu colega de corte Gilmar Mendes. Barroso dissera que Gilmar
era "uma pessoa horrível, mistura do mal com atraso e pitadas de
psicopatia". "Não explorar essa assunto", disse Barroso, que não
cumpriu a promessa, para a alegria da plateia. "Quando eu vi a cena na
televisão, eu pensei: 'essa pessoa não sou eu'. Eu sou uma pessoa que medita
todos os dias, de bem com a vida..." "Fez muito bem", gritou um
homem na plateia. "Eu não me arrependi, não", esclareceu Barroso.
"Imagina você ir todo dia trabalhar com um colega grosseiro, que planta
notas falsas contra você nos jornais! Fiquei chateado porque a impressão que
ficou é a de um episódio de dois brigões, mas, na verdade, a nossa divergência
é sobre projetos de país."
O debate se encaminhou para o fim e
Recondo arrematou com duas provocações: "O senhor já decidiu em quem vai
votar? Eu não perguntei em quem. E como o senhor explica o centrão?".
"Sobre o centrão, eu não tenho nada a dizer. Não sou comentarista político",
disse Barroso, que não respondeu a outra pergunta, reivindicando o argumento de
que um juiz deve abdicar de certas preferências. "Nem minha mulher sabe em
quem eu votei nas últimas eleições. E eu acho que ela desconfia errado..."
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