Qualquer
comemoração presencial representa risco de contágio — e o cenário de alta na
transmissão do coronavírus em algumas regiões do Brasil agrava o problema. Para
quem decidiu encontrar a família, especialistas sugerem medidas de redução de
danos.
Por Laís Alegretti e Paula Adamo Idoeta, BBC
Idealmente, a comemoração deve ocorrer só entre quem já vive na mesma residência, dizem especialistas — Foto: Getty Images via BBC
Uma sala cheia de pessoas com saudade
umas das outras, que se reúnem por muitas horas para celebrar, geralmente em
torno de uma mesa de jantar e com a presença de integrantes das mais variadas
idades.
Essa pode ser a descrição de uma
comemoração do Natal da forma que muitas famílias celebraram até hoje — e
também de um cenário ideal para propagação do coronavírus, que matou
mais de 180 mil pessoas no Brasil até
dezembro de 2020, principalmente idosos.
Com a taxa de contágio da Covid-19 em alta em várias
regiões do Brasil, os médicos alertam que a única forma de ter
certeza de que você não passará uma doença que pode ser fatal para familiares e
amigos é abrindo mão de uma comemoração presencial. Há, no entanto, medidas que podem ser tomadas para mitigar o risco, ou
formas de dar uma nova cara às comemorações neste ano.
A moradora de Macaé (RJ) Polyanna
Linhares, de 28 anos, está acostumada a passar o Natal na casa da tia com mais
ou menos vinte pessoas. Para o fim de 2020, no entanto,
a família mudou a tradição.
"Estamos agora há praticamente sete meses sem nos ver. São pessoas de quatro casas diferentes, que vão passar o Natal cada um na sua. Aqui em casa seremos eu, meu pai, minha mãe (que são idosos), minha irmã e meu sobrinho."
Ela diz que a festa virtual não é o
que gostaria de fazer, idealmente, mas foi a melhor opção encontrada para
proteger a família.
Para pessoas que vivem em residências separadas, recomendação é promover encontro virtual — Foto: Getty Images via BBC
"Fiquei chateada, mas ciente de
que é a decisão certa. Vamos fazer um amigo oculto
virtual: sorteamos os nomes por um aplicativo, faremos a festa pelo Zoom
e depois a gente dá um jeito de entregar os presentes", diz. "Não vai
ser do mesmo jeito, é claro. Mas é o que dá para fazer, para a gente se
proteger e proteger quem a gente ama."
Redução de danos
Em dezembro, a Fiocruz emitiu uma
nota técnica alertando para o perigo de o sistema de saúde do Brasil colapsar
após as festas de fim de ano, considerando que é esperado um aumento no número
de casos. Os ingredientes para isso já estão dados: há surtos da covid-19
simultaneamente nas capitais e no interior, e a disseminação do vírus está em
alta. Sendo assim, a recomendação primordial dos infectologistas é evitar passar as festas com pessoas de fora da sua casa,
para impedir a transmissão do coronavírus de um lar para outro.
Apesar dos riscos evidentes, muitas
famílias planejam comemorar o Natal com um encontro presencial — ainda que de
forma diferente de outros anos.
Por isso, a BBC News Brasil
entrevistou infectologistas e outros especialistas para explicar as medidas que
podem tornar os encontros menos inseguros — embora eles destaquem que não é
possível eliminar os riscos, apenas contê-los:
1. Minimizar a
quantidade de pessoas (e de residências)
A primeira dica é fazer uma reunião
com o menor número possível de pessoas. Idealmente, a comemoração
deve ocorrer só entre quem já vive na mesma residência.
"Temos que pensar em evitar encontros com muitas pessoas. É momento para encontrarmos famílias nucleares. Não é momento de fazer grandes encontros de família, com reuniões com mais de dez pessoas", diz Juliana Lapa, infectologista e professora da Universidade de Brasília.
Celebração do Natal da forma que conhecemos é cenário ideal para propagação da Covid — Foto: Getty Images via BBC
A recomendação é estar atento não só
à quantidade de pessoas, mas também ao número de residências que serão
misturadas. Por exemplo: um encontro entre dez pessoas tende a ser menos
arriscado se cinco moram juntas em uma casa e outras cinco vivem em outra do
que se cada uma das dez pessoas vive em uma casa diferente, aponta Vitor
Mori, membro do grupo Observatório Covid-19 BR e pós-doutorando na Faculdade de
Medicina na Universidade de Vermont (EUA).
O presidente da Sociedade Mineira de
Infectologia, Estevão Urbano, destaca o cuidado com os grupos que têm sido as principais vítimas da Covid-19.
"Se possível, idosos e pessoas
com comorbidades — obesos, diabéticos, hipertensos, pessoas com problemas
pulmonares — devem evitar as festas. Claro que também são as pessoas que estão
mais distanciadas e carentes neste momento, mas o ideal é que elas tomem mais
medidas de cuidado do que as demais pessoas."
Lapa diz que, se for inevitável o encontro com uma pessoa do grupo de risco, uma opção menos arriscada é fazer um encontro rápido e com distanciamento. "Uma visita curta, sem fazer ceia, sem tirar a máscara", explica.
2. Muita ventilação
Se for fazer encontro, que seja em lugar aberto: jardim, laje, quintal, onde as
partículas de vírus vão se dissipar mais facilmente com o vento. Se não houver
um ambiente completamente aberto, a recomendação é fazer em uma varanda. Se a
única opção for dentro de um apartamento, deixe todas as janelas abertas.
Mori diz que tem havido pouco
destaque para a importância da ventilação para minimizar riscos e dá uma dica
caseira para aumentar a circulação de ar em ambiente interno: colocar um
ventilador próximo da janela e de frente para ela. Dessa forma, ele diz, o ventilador funciona como um exaustor, puxando o ar de dentro e
empurrando para fora do cômodo.
"Gera pressão negativa dentro do cômodo e o ar fresco de outra janela vai entrando", explica.
Dê preferência aos locais abertos — Foto: Equipe de Jornalismo Visual da BBC News Brasil e da BBC News Mundo
Se tiver mais de uma janela e mais de
um ventilador, Mori diz que, além desse primeiro ventilador, você pode colocar
outro ventilador na janela oposta e na posição contrária — ou seja, virado para
o interior do cômodo. Assim, um ventilador puxa o ar de fora para dentro e
outro empurra o ar para fora pela outra janela, gerando circulação e troca de
ar constante.
Para destacar a importância de privilegiar ambientes ao ar livre, Mori compara a fumaça do cigarro, que também é um tipo de aerossol, com as partículas emitidas por uma pessoa que pode estar infectada.
"Se há uma pessoa fumando perto de você, mas em espaço aberto, você não sente muita fumaça, o vento vai dispersar. Mas se você estiver em um ambiente fechado, mesmo que mantenha distância maior que um metro e meio, se todas as portas e janelas estiverem fechadas, você vai conseguir sentir cheiro do cigarro e vai inalar quantidade grande."
Diferença entre a transmissão por gotículas e por ar — Foto: Equipe de Jornalismo Visual da BBC News Brasil e da BBC News Mundo
Os Centros de Controle de Doenças dos
EUA (CDCs) também recomendam a ventilação como estratégia para reduzir as
partículas de vírus no ar de ambientes fechados. Mas, em diretrizes
recém-atualizadas sobre ventilação, fazem quatro alertas adicionais sobre o
tema:
· Janelas e portas só
devem ficar o tempo todo abertas em locais onde não haja risco de quedas ou se
isso não provocar crises em pessoas asmáticas;
· Ventiladores não
devem gerar fluxo de ar diretamente de uma pessoa a outra, para evitar a
contaminação;
· As medidas de
ventilação não dispensam os cuidados constantes com o distanciamento social, a
higiene das mãos e o uso de máscaras;
·
Se não for possível ventilar bem o espaço, então é preciso reduzir o
número de ocupantes nele.
3. Reduzir a duração
Fazer encontros mais rápidos é outra
sugestão dos especialistas, já que o risco aumenta com mais tempo de exposição.
"Agrupamentos prolongados são o grande vilão da
transmissão", diz Urbano.
4. Máscara e distanciamento sempre que possível
Os especialistas concordam em outro
ponto: as máscaras
devem ser usadas sempre que possível, retirando apenas na
hora de comer ou beber. Além disso, evitar falar alto e cantar também ajuda na
redução de riscos. "Quanto mais forte a fala ou o canto, mais partículas
são expelidas no ar", diz Urbano.
Além da máscara, outra regra já conhecida segue valendo: manter o máximo de distância possível para quem não vive na mesma casa.
Blog do Paixão