Em entrevista à IstoÉ, Lula se compromete com
a responsabilidade fiscal e afirma que se considera hoje um político mais
experiente. Se for eleito, ele promete “no primeiro dia” retirar o sigilo de
100 anos imposto por Bolsonaro para documentos oficiais comprometedores. Apesar
de o petista se negar a adiantar nomes para seu ministério, Henrique Meirelles
tem ganhado destaque como opção para a Fazenda
LULISMO O ex-presidente Lula em ato pela democracia em Curitiba, em maio de 2017 (Foto: Divulgação)
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uiz Inácio
Lula da Silva vive dias de êxtase. As pesquisas o fazem sonhar. O retorno ao
poder nunca foi uma realidade tão palpável. Os dias de confinamento
compulsório, preso numa delegacia do Paraná, por acusações de malversação de
dinheiro público, o fizeram acreditar que era o fim da linha. Muito embora
acalentasse a ideia de ser reverenciado pelos etern0os seguidores. Hoje, mais
grisalho, até mais abatido, uma voz rouca que já despertou especulações sobre a
saúde, casado novamente e percebendo a volta dos bajuladores, Lula vislumbra o
que considera uma nova travessia do rubicão. Acredita estar dando a volta por
cima.
Quer fazer diferente. Promete nem mesmo
tentar a reeleição. Acredita que quatro anos serão suficientes para o projeto
que tem em mente e com o qual almeja reservar um lugar na história. Mas nada
tira dele a pecha de radical nos corações e mentes daqueles que temem suas
ideias. Especialmente empresários e banqueiros. Curioso. Justo eles que foram
brindados com acenos generosos a suas demandas.
Lula, “o cara”, na visão simbólica do
ex-presidente dos EUA, Barak Obama, deixou o governo do Brasil com crescimento
na casa dos 5%, que nunca mais voltou a se repetir. Sim, também entregou a
monstruosidade escandalosa do mensalão, abriu as portas para o propinoduto da
Petrobras, mas deixou as melhores lembranças no público cativo de baixa renda.
A esse concedeu uma política social que fez história e segue sendo referência
mundial. Os pobres e desassistidos tratam Lula como “paizinho”.
Ninguém tira deles a convicção de que o
demiurgo de Garanhuns foi o único que lutou genuinamente para reparar suas
necessidades, abrandando a indolente chaga da miséria que secularmente castiga
os grotões deste País continental. No momento, com o avanço avassalador da
fome, que já verga ao desespero de vida ao menos 33 milhões de pessoas e outras
tantas em condição de insegurança alimentar, Lula replica o papel de salvador
da pátria. Nações carentes, desigualmente formadas na pirâmide da renda,
padecem desse mal de buscar sempre redentores, arrivistas ou não. A Argentina
de Perón, a Nicarágua de Ortega ou mesmo as Filipinas de Ferdinando Marcos que
o digam.
Se o petista confirmar a vitória no dia 30, o
lulismo se mostrará definitivamente enraizado no País. O seu líder prepara a
volta ao poder na eleição mais importante desde a redemocratização, quando a
própria Constituição de 1988 é colocada à prova. Por isso, ele mesmo apresenta
sua eleição como uma escolha entre a a civilização e a “barbárie”. O atentado
contra a Polícia Federal de um aliado de Bolsonaro, o ex-deputado Roberto
Jefferson, no último dia 23, mostrou a gravidade do momento e o “grau de
insanidade que o País alcançou”, aponta o ex-presidente. Mas ele não mostra
preocupação com a aceitação do resultado das urnas. “Bolsonaro terá de aceitar
o resultado das urnas. Simples assim!” O petista ressalta que o atual
presidente alimenta conflitos e divisões no País, em vez de trabalhar pela paz,
e que tem consciência de que terá de trabalhar e conversar muito com a
sociedade para o País voltar a crescer. “Hoje eu sou mais experiente.”
NA CORRIDA Lula dá início à sua campanha em porta da fábrica da Volkswagen no ABC, em São Paulo, em 16 de agosto (acima). Lula conversa com a Rede de Rádios RDR em Maringá, no Paraná, durante a campanha (Crédito:Ricardo Stuckert)
A eventual
vitória tornará Lula o primeiro presidente a governar o País por três mandatos
obtidos nas urnas, depois de uma reviravolta dramática em que sua sucessora e
aliada sofreu impeachment e ele enfrentou uma série de inquéritos na Operação
Lava Jato. Passou 580 dias preso antes de ter as penas anuladas, acusando a
força-tarefa de Curitiba de motivação política. Agora, quando seus dois
principais algozes no Judiciário abraçaram o bolsonarismo e entraram para a
política, o ex-presidente tem a chance de dar a volta por cima como um dos
líderes mais longevos da história do País, e com prestígio internacional.
Líder nas pesquisas
O ex-presidente chega à reta final liderando
as pesquisas de opinião. Desde que anunciou sua candidatura mantém a dianteira,
mesmo diante das bilionárias benesses eleitoreiras que Bolsonaro criou
driblando a legislação eleitoral. A guerra suja nas redes sociais invadiu o
programa eleitoral na TV, e o PT entrou nessa disputa para evitar que o
bolonarismo ocupasse todo o ciberespaço com fake news. A Justiça conseguiu ser
mais eficiente do que em 2018, como o próprio episódio de Roberto Jefferson
ilustra, apesar de não ter conseguido evitar a desinformação.
Agora, a grande interrogação em um eventual
governo do PT é sobre sua política econômica. A Bolsa e o dólar oscilaram ao
longo da campanha mostrando que o mercado teme o triunfo de Lula. O forte
intervencionismo e a política de “campeões nacionais” do governo Dilma explicam
em parte essa reserva, mas ela se deve especialmente ao risco de descontrole
nas contas públicas. O ex-presidente, no entanto, disse que sempre praticou a
responsabilidade social e que em seus dois governos diminuiu a relação
dívida/PIB. O teto de gastos, segundo ele, já tinha acabado no governo
Bolsonaro, e a própria pandemia provou que essa âncora fiscal não funciona.
O nome do seu ministro da Economia seria
essencial para tranquilizar os agentes, mas o petista se recusou a divulgar
quem será o novo titular da pasta. “Se ganhar, começo a discutir o ministério
às 20h de domingo”, já declarou. Ele tem sido cuidadoso para evitar “sentar na
cadeira de presidente antes do tempo”.
Mas, nos
bastidores, já há cotados para o primeiro escalão: Alexandre Padilha e
Wellington Dias (para a Casa Civil ou soluções caseiras para a Fazenda), André
Lara Resende (Fazenda ou Planejamento), Aloizio Mercadante (Relações
Exteriores), Miriam Belchior (para cuidar do novo PAC, mas não deseja ir para o
Planejamento), Marina Silva (Meio Ambiente), Arthur Chioro (Saúde), Flávio Dino
(Segurança), Jacques Wagner (Defesa), Gabriel Chalita (Educação) e Marco
Aurélio Carvalho (AGU ou Justiça). Também lidera a bolsa de apostas Simone
Tebet (Agricultura ou Educação, que seria a preferência dela). Mas, no caso da
senadora do MDB, Lula já disse que precisará antes negociar com o partido dela,
que se dividiu no segundo turno.
Ex-colaborador e depois adversário de Lula,
Henrique Meirelles também é um dos nomes cotados para a Fazenda. Ele tem
ocupado um espaço especial nas propostas da área, até porque o petista tem
evitado vazamentos de sua equipe. Em evento concorrido na última segunda-feira,
24, na PUC-SP, o ex-ministro esteve presente a convite de Lula e foi citado por
ele. Com essa interlocução privilegiada, Meirelles tem dado entrevistas a
jornais do exterior, como o “Financial Times”, “avalizando” ideias para um
futuro governo do PT. A principal é de uma “licença” (waiver) para o governo
gastar em 2023 até R$ 100 blhões fora das regras orçamentárias, já que as
benesses criadas pelo governo e aprovadas pelo Congresso vão impor um rombo nos
cofres públicos calculado em até R$ 430 bilhões, segundo estudo do Ibre-FGV.
Ele é ouvido no mercado, já que é o pai do
teto de gastos. Defende que as propostas sociais de Lula podem ser aplicadas
com responsabilidade fiscal e já teria sugerido ao petista replicar a reforma
administrativa implantada quando foi secretário da Fazenda do governo de São
Paulo, privatizando estatais que perderam finalidade. Isso soa como música para
os investidores, mas causa incômodo entre economistas ligados ao PT. Lula tem
se aproveitado da influência do seu ex-presidente do Banco Central para
diminuir resistências entre empresários, e muitos de sua equipe consideram que
Meirelles virou um candidato natural ao comando da Economia.
Herança maldita
“Se vencer, Lula receberá uma verdadeira herança maldita no campo fiscal decorrente da maneira pela qual Paulo Guedes e Bolsonaro administraram o País, seja durante a crise, seja no período eleitoral, quando o ministro esqueceu suas visões liberais e trabalhou para reeleger o atual presidente. Quem subir a rampa do Planalto vai encontrar o Tesouro Nacional provavelmente na pior situação da história”, prevê Maílson da Nóbrega, ministro no governo José Sarney. Para o economista, Lula tenta seguir um caminho semelhante neste ano ao trazer para seu lado, além de Meirelles, nomes como Pérsio Árida e Armínio Fraga. De fato, a adesão dos pais do Plano Real nas últimas semanas aumentou a confiança em um programa econômico equilibrado. “Minha aposta é que Lula não fará um programa irresponsável”, diz Maílson.
COTADO Ex-ministro Henrique Meirelles defende uma “licença” para o governo gastar acima do teto em 2023: seu nome cresce entre as apostas para a Fazenda (Crédito:Eduardo Knapp)
O governo
poderá emplacar a reforma tributária que unifica cinco impostos e está pronta
para votação no Congresso, já anunciou Geraldo Alckmin, o candidato a vice.
“Essa PEC poderia ter sido aprovada por Bolsonaro, mas Guedes a boicotou,
porque queria a CPMF. Os estados estão titubeando, mas, com uma boa liderança,
vão concordar de novo”, pontua Nóbrega. Já Lula apenas defende uma reforma com
tributos mais justos e simples. “Quero incluir o pobre no orçamento e os muito
pobres no imposto de renda”, informa. Se Lula seguir Alckmin, poderá destravar
uma reforma essencial para aumentar a produtividade que está emperrada há
décadas no Congresso. O candidato a vice também dá outra pista essencial sobre
o que se poderá esperar da economia, repetindo o tripé que Lula vocaliza:
“Credibilidade, estabilidade, previsibilidade”. Falta, naturalmente, convencer
os players do mercado, como se viu nos últimos dias com a gangorra na Bolsa.
COM O POVO O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é recepcionado por populares em Inhúmas, no Piauí, em 2017 (Crédito:Divulgação)
Uma das
inflexões mais óbvias com um governo Lula ocorrerá na área externa. Bolsonaro
se tornou um pária internacional ao se aliar a extremistas de direita, insultar
líderes europeus, questionar a eleição do presidente Joe Biden e,
principalmente, com sua política de desmanche ambiental. O petista, ao
contrário, ainda goza de prestígio fora do País mesmo após seu período na
prisão. Isso pode ser útil para fortalecer parcerias comerciais e evitar prejuízos
ao agronegócio, que poderia enfrentar barreiras ambientais. Ex-embaixador nos
EUA e presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior,
Rubens Barbosa lembra que o mundo já ensaia medidas para forçar o
comprometimento brasileiro com a preservação da Amazônia — o Parlamento Europeu
aprovou, em setembro, uma norma para obrigar os importadores da União Europeia
a atestar o cumprimento de exigências ambientais por parte dos fornecedores.
“Colocar o Meio Ambiente no centro da política externa já despertaria uma
reação pela simbologia”, diz. A reaproximação de Lula com Marina Silva atesta
que a agenda ambiental será prioritária.
Apoio de líderes pelo mundo
António
Costa, primeiro-ministro português, declarou: “O
mundo precisa de um Brasil forte, que participe das grandes causas, para
combater a desigualdade, lutar pela saúde, enfrentar as alterações climáticas.
O Brasil e o mundo precisam de Lula”.
Pedro Sánchez, primeiro-ministro espanhol, diz que “é uma eleição decisiva para o futuro do Brasil” e que Lula “é uma voz imprescindível diante dos grandes desafios globais que nos unem”. Para ele, a vitória seria “dos progressistas do mundo inteiro”.
Alberto
Fernández, presidente da Argentina, chamou Lula de
“querido” nas felicitações que enviou pelo Twitter logo depois do primeiro
turno e apresentou “sincero respeito ao povo do Brasil por sua profunda
expressão democrática”
Papa
Francisco disse em outubro, durante o encontro
com Lula na visita ao Vaticano, que reza “a Nossa Senhora Aparecida para
proteger e curar o povo brasileiro, para libertá-lo do ódio, da intolerância e
da violência”, em aceno de apoio ao candidato
Divulgação
Gustavo Pietro,
presidente da Colômbia, declarou em agosto que torcia por Lula, depois que o
brasileiro enviou seu apoio a ele, que concorria com adversário populista, de
extrema-direita, sofrendo atentados ataques e mesmo atentados.
Gabriel
Boric, presidente do Chile, desejou “muito
sucesso” a Lula e “um ótimo resultado nas eleições deste ano”. Em agosto, falou
à revista Time que a América Latina deveria se unir em caso de resultado
eleitoral não aceito, para evitar um golpe.
Emmanuel
Macron, presidente francês, recebeu Lula como chefe
de Estado em 2021, depois que sua mulher Brigitte foi violentamente ofendida
pelo atual presidente brasileiro. Em abril deste ano, Lula manifestou seu apoio
à reeleição de Macron.
Day after
Antes disso, falta consolidar a eventual
vitória e garantir uma transição tranquila. Isso não está seguro. Entre
ministros de Cortes Superiores, há apreensão com o day after das eleições. A
perspectiva é a de que a diferença de votos entre Lula e Bolsonaro seja menor
do que os 3,4 milhões contabilizados entre Dilma Rousseff e Aécio Neves em
2014. Por isso, acredita-se que, se o petista vencer, o capitão pensará em, como
fez o tucano, contestar o resultado das urnas.
Não à toa, os presidentes de Poderes montaram
uma “força-tarefa” para se contrapor a qualquer investida golpista. Como no
primeiro turno, os presidentes do Congresso, Rodrigo Pacheco, e do Tribunal de
Contas da União, Bruno Dantas, além de ministros do Supremo Tribunal Federal,
devem acompanhar a totalização na sede do TSE no domingo e ladear Alexandre de
Moraes na coletiva de imprensa prevista para o final do dia. Arthur Lira, que
comanda a Câmara, planeja acompanhar o processo em Brasília junto a líderes dos
partidos no Legislativo. “Se Bolsonaro investir na tese de fraude, acabaria
sendo uma rebelião contra todos os Poderes”, ressalta um ministro, sob reserva.
Além disso, nesta sexta-feira, o TCU pretende
colocar no ar um painel eletrônico com os resultados parciais da auditoria que
verificou a compatibilidade entre resultados de 4.161 boletins de urnas,
sorteadas para o exame, e os votos totalizados pelo TSE, a fim de impulsionar o
sentimento de confiança no sistema eleitoral. “Até agora, estamos com mais de
70% do trabalho pronto. Fizemos quase 5 milhões de cruzamentos e houve um total
de zero divergências em relação à base do TSE”, aponta um nome do tribunal que
acompanha o passo a passo do procedimento. “As Forças Armadas ficaram com a
broxa na mão, porque todos sabem que eles não acharam problema algum naquela
‘totalização paralela’, mas mantêm o suspense sobre o relatório para nutrir
dúvidas, o que pega mal para eles”, emenda.
Se confirmar sua vitória, Lula enfrentará um
Congresso majoritariamente de oposição, o que exigirá muita negociação para que
as pautas do governo não sejam paralisadas. Fator essencial para isso é
desmontar a armadilha do orçamento secreto, uma aberração que deu poderes
desmedidos aos aliados do atual presidente pertencentes ao Centrão.
Igualmente difícil será a tarefa de pacificar
a sociedade, depois de anos de polarização e extremismo. Derrotado, Bolsonaro
seria de fato um líder da oposição pronto para contestar ainda mais as
instituições. Conta a favor de Lula a disposição de ampliar o arco de alianças
e se aproximar do centro. “Nosso governo não será um governo do PT. Precisamos
fazer um governo além do PT”, diz ele. O petista acha que o bolsonarismo, o
ódio e o fanatismo vão continuar por um tempo, mas conta com sua habilidade de
negociação para uma reconciliação da sociedade.
O professor de Ciência Política da
Universidade Federal de Pernambuco Adriano Oliveira afirma que o Brasil precisa
se desprender do clima de tensão impulsionado pelo bolsonarismo e da
instabilidade decorrente das ameaças à democracia. Ele acrescenta que o governo
federal precisa retomar a habilidade de planejamento estratégico de Estado, uma
vez que todas as decisões voltadas à Economia e à construção de políticas
sociais da atual gestão foram “improvisadas”, à exceção da reforma da
Previdência.
Reconciliação
Para Oliveira, Lula deve ter mais facilidade
na elaboração dos projetos pela experiência na condução de programas sociais e
no traquejo com o Congresso. “Temos dois presidentes que dialogaram e conseguiram
sucesso no combate à desigualdade social: Fernando Henrique Cardoso e Lula. O
primeiro centrou-se no enfrentamento da inflação, instrumento que corrói a
renda dos pobres, e deu início ao controle fiscal que permitiu que, adiante, o
lulismo viesse a existir com sua visão voltada para as pessoas mais
necessitadas. Lula, então, tocou a agenda de inclusão social”, pontua. “Se,
hoje, o Brasil vive uma crise de desemprego, crescimento da fome e
desmantelamento de políticas públicas, fica claro que Lula, que tem o apoio de
FHC, é o melhor caminho”, prossegue. A resposta será dada pela sociedade no dia
30.
Entrevista
Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da república
Bolsonaro é um mentiroso compulsivo
Em entrevista à ISTOÉ, Lula
afirma ainda que a reeleição de Bolsonaro traz riscos à democracia, mas adverte
que ele terá de aceitar o resultado as urnas. “Simples assim!”, lembra o
ex-presidente, que vê também ameaças ao futuro do País: “Hoje, mais de 30 milhões
de pessoas passam fome.
Imagina o que esse cidadão fará se esse comportamento absurdo for recompensado
com um segundo mandato”
A reeleição de Bolsonaro traria risco para a democracia?
Sim. O atual presidente deu, ao longo da sua carreira política e no cargo,
repetidas demonstrações de pouco apreço pelas regras democráticas, pela
independência dos Poderes da República e autonomia das instituições. Ele,
infelizmente, alimenta conflitos e a divisão no País, em vez de trabalhar pela
paz e para que busquemos os objetivos comuns do desenvolvimento, da redução da
pobreza, da melhora da Saúde e da Educação.
O episódio de Roberto Jefferson mostra que Bolsonaro pode não aceitar pacificamente o resultado das urnas, repetindo o que aconteceu no Capitólio em 2021?
Bolsonaro terá de aceitar o resultado das urnas. Simples assim! O que o
episódio do Roberto Jefferson mostra é o grau de insanidade que o país alcançou
com Bolsonaro. Um sujeito, aliado de Bolsonaro, incentivado por declarações
dele, que também disse que resistiria à prisão com tiros, que arremessa
granadas e atira com fuzil contra policiais federais, é de uma gravidade sem
tamanho.
O pior é que ele tenta agora se desvincular de Jefferson, né?
A primeira reação de Bolsonaro inclui justificar as ações desse cidadão com
mentiras. E ele tem a cara de pau de dizer que não tem fotos dele com Roberto
Jefferson, seu aliado até ontem, inclusive na dobradinha do padre Kelmon no
debate. Como ele pode mentir de forma tão descarada? Há dezenas de fotos e
vídeos dos dois juntos, de juras de amor de Jefferson para Bolsonaro.
Quais foram os maiores erros do atual presidente?
O comportamento que ele teve na pandemia foi criminoso, irresponsável. Negou a
ciência, atrasou a vacina, desprezou as medidas de proteção, incitando as
pessoas, em especial aquelas que acreditavam nele, a correr mais riscos de
vida. Estudos mostram que mais de 400 mil pessoas morreram por causa da
negligência do governo federal na condução da pandemia. São mais de 30 milhões
de pessoas passando fome. Imagina o que esse cidadão fará se esse comportamento
absurdo for recompensado com um segundo mandato.
Bolsonaro foi criminoso na pandemia
O sr. pretende mudar a composição do STF, para aumentar o número de ministros, como propõe Bolsonaro?
Não pretendo. Eu não quero perder tempo em brigas institucionais. Não fiz isso
nos meus oito anos de mandato e não farei agora. Eu pretendo me concentrar na
recuperação do Brasil. No combate à fome, na geração de empregos, na educação e
recuperação das universidades, institutos de pesquisa e demais órgãos que foram
atacados pelo bolsonarismo.
O sr. propõe aumento real do salário mínimo, mas não há recursos no Orçamento para isso. O mesmo ocorre com o Auxilio Brasil. Como será essa negociação com o Congresso?
Será com diálogo e respeito, porque o Congresso também foi eleito. O orçamento
que o Bolsonaro enviou prevê cortes na Saúde, na Educação, na Farmácia Popular,
muita coisa que terá que ser revista. O Auxílio Brasil que Bolsonaro enviou no
orçamento dele para o ano que vem prevê só R$ 405, então teremos que corrigir
essa questão. Isso é muito melhor que os planos que o Guedes tem para enviar ao
Congresso em um segundo governo Bolsonaro, onde eles estudam não corrigir mais
o salário mínimo e aposentadorias pela inflação do ano, e desvincular,
reduzindo, os recursos com Saúde e Educação.
O teto de gastos vai acabar?
Ele já acabou. O governo Bolsonaro nunca respeitou o teto de gastos. Eu acho a
responsabilidade fiscal importante. Eu pratiquei a responsabilidade fiscal nos
meus governos, reduzimos a relação dívida e PIB e promovemos o crescimento, E
fiz tudo isso porque sou responsável, coisa que aprendi de pequeno, com minha
mãe. Não é um teto que gera responsabilidade. A pandemia foi um exemplo de como
o teto de gastos não funciona. O País tem necessidades sociais urgentes,
precisa investir para construir ativos e se desenvolver. Teremos que cuidar de
tudo isso ao mesmo tempo, sem loucura. Buscando investimentos produtivos no
exterior, conversando com governadores e prefeitos.
O episódio do Roberto Jefferson mostra o grau de insanidade que o país alcançou com Bolsonaro
O orçamento secreto será extinto?
Se fosse bom não precisaria ser secreto. Eu pretendo construir um orçamento
participativo pela internet, com a população podendo participar e entender as
definições dos gastos do governo.
Haverá alguma âncora fiscal para manter a responsabilidade sobre as contas públicas?
Eu pretendo governar com responsabilidade sobre as contas públicas, diante da
situação que o governo Bolsonaro vai entregar, que será, tanto do ponto de
vista social, quanto econômico, pior do que a que eu peguei em 2003. O que o
Brasil ainda tem, diferente daquela época, são as reservas de mais de US$ 300
bilhões deixadas pelos governos do PT. Isso nos dá alguma estabilidade e
segurança. E hoje eu sou mais experiente. Sei que terei que trabalhar muito, e
conversar muito com a sociedade para o país voltar a crescer de verdade, acima
da média mundial. Você pode ver pelos meus governos que melhoramos todos os
indicadores de contas públicas.
Henrique Meirelles será seu ministro da Economia?
Eu não defino equipe antes de ganhar eleição. Uma coisa que eu sei que o Brasil
não aguenta são mais quatro anos de Bolsonaro e Paulo Guedes.
Guedes estuda não corrigir mais o salário mínimo e aposentadorias pela inflação
Vai ter reforma tributária com criação do IVA?
A reforma tributária será debatida com a sociedade, para construirmos um
sistema de tributos mais justo, mais simples. Eu quero incluir o pobre no
orçamento e os muito pobres no imposto de renda. Uma discussão que respeite as
partes para que a gente consiga construir um modelo mais eficiente para a
produção e financiamento da Educação, da Saúde, do desenvolvimento do País.
O sr. vai tirar os sigilos de 100 anos que Bolsonaro decretou em vários casos?
No primeiro dia de governo.
Bolsonaro abusou da máquina pública, inclusive nas eleições. Como impedir que isso volte a acontecer no futuro?
Elegendo pessoas comprometidas com a democracia. Eu, quando fui candidato à
reeleição, só fazia campanha depois do horário de expediente. Bolsonaro, que
nunca trabalhou ou governou de verdade, abandonou de vez fingir que governa, e
está em campanha em tempo integral há muito tempo. Eu estou me elegendo para um
mandato só, para trabalhar muito em quatro anos. E espero que o Brasil volte a
ter disputas políticas feitas entre democratas, que respeitam a democracia,
como eu e o Alckmin.
Se o orçamento secreto fosse bom não precisaria ser secreto
O sr. se aproximará do Centrão pela governabilidade no seu governo?
O Centrão não existe como bloco político. É um agrupamento diverso de políticos
muito diferentes, com questões regionais e pautas diferentes. Eu vou conversar
com os deputados eleitos.
O sr. já defendeu o controle social da mídia. Há risco de censura sobre os meios de comunicação?
Ninguém está discutindo censura. Está se discutindo a atualização da lei dos
meios eletrônicos, que é dos anos 1960 e que não dá conta do mundo da internet.
Ninguém quer censurar conteúdo. Queremos mais diversidade de empresas e
conteúdo atuando em comunicação e que o trabalho dos jornalistas seja
respeitado.
Se ganhar, o sr. terá quase metade da população que optou pelo caminho da direita. Como o sr. pretende pacificar o País?
Depois da eleição o vencedor governa, quem perdeu se prepara para a próxima. É
assim. Infelizmente Bolsonaro não é o caminho da direita. Tem gente honrada de
direita, gente séria de quem eu posso discordar, mas que não merece estar no
mesmo grupo de Bolsonaro. O presidente não é de direita, ele é um mentiroso
compulsivo, um sujeito que despreza a vida humana, a ciência, a fraternidade.
Muitas pessoas que votam nele talvez estejam iludidas pelas mentiras contadas
pelas milícias digitais dele. Mas assumindo um governo que trabalhe pelo bem
das pessoas, conversando, se comunicando, certamente o país voltará para o rumo
da normalidade e do desenvolvimento com inclusão social.
Blog do Paixão