terça-feira, outubro 07, 2025

TCE-PE suspende concurso após aprovação da “candidata gênio”

A mulher, investigada pela PF por fraudes em concursos públicos, foi aprovada para o cargo de analista de controle externo do órgão



Arte/Metrópoles

O Tribunal de Contas de Pernambuco (TCE-PE) se pronunciou, nesta terça-feira (7/10), após vir a público a notícia de que o nome de Laís Giselly Nunes de Araújo (foto em destaque), de 31 anos, aparece na lista de aprovados para o cargo de analista de controle externo do órgão.

Em nota oficial, o TCE-PE declarou que “até que todos os fatos estejam devidamente esclarecidos, ficam suspensos todos os atos pertinentes ao concurso”.

“Diante dos fatos revelados por inquérito da PF e veiculados na imprensa sobre fraudes em concursos públicos em nível nacional e estadual, o TCE-PE e a FGV informam que já estão tomando todas as providências cabíveis junto às autoridades policiais e judiciárias para proteger a integridade do certame.”


A lista de candidatos aptos para ocupar as vagas foi publicada na manhã desta terça (7) pela Fundação Getulio Vargas (FGV). A polêmica ocorre porque Laís é investigada pela Polícia Federal (PF) por ter participado de diversas fraudes em certames públicos.

O órgão ainda declarou que, como instituição de controle externo, que tem o dever constitucional de zelar pela regularidade das admissões de pessoal da gestão pública, será intransigente na defesa da lei, da meritocracia e do interesse público, quaisquer que sejam as medidas jurídicas que o caso exija.

Quem é a “candidata gênio”

Laís Giselly é conhecida por colecionar em seu currículo aprovações em medicina e direito em universidades federais, assistente administrativo em instituição federal de ensino e auditoria fiscal do trabalho pelo Concurso Nacional Unificado (CNU) de 2024.

À primeira vista, o histórico poderia ser atribuído a uma candidata de desempenho extraordinário, mas, segundo a PF, as conquistas teriam sido obtidas de forma fraudulenta.

Desde 2022, Laís é alvo de investigações que apuram fraudes em pelo menos 14 concursos públicos. O caso ganhou maior destaque após o início das apurações sobre o CNU 2024, quando foi constatado que o gabarito da candidata era idêntico ao de Wanderlan Limeira de Sousa, ex-policial militar e apontado como líder de organização criminosa que vendia aprovações em certames federais e estaduais.

A PF classifica as aprovações da candidata como “estatisticamente improváveis” e afirma que há “indícios fortes de participação nas fraudes”.

Membro da quadrilha

Durante a análise de dados digitais apreendidos, os investigadores encontraram documentos que conectam Laís diretamente aos demais integrantes da organização que fraudou vagas do Concurso Nacional Unificado (CNU) de 2024.

A mãe dela, Erika de Matos Nunes, também integrava o grupo criminoso. Segundo a PF, a mulher era enfermeira lotada no Hospital da Beneficência Portuguesa do Recife e atuava como captadora de candidatos para integrar a rede criminosa.

Mãe e filha não são as únicas investigadas ligadas por laços sanguíneos. Apontado como operador da fraude, o ex-policial militar Wanderlan Limeira de Sousa usou a fraude para beneficiar irmãos, filhos e sobrinhos: todos colecionam aprovações fraudulentas em certames de alto prestígio.

Valmir Limeira de Souza, 53 anos, o filho do ex-PM, Wanderson Gabriel de Brito Limeira, 24, e a sobrinha dele, Larissa de Oliveira Neves, 25, também foram aprovados para o cargo de auditor fiscal do trabalho no CNU de 2024.

A rede foi descoberta pela PF após uma denúncia anônima. Ao requisitar os gabaritos à banca organizadora, a PF encontrou a evidência definitiva: Wanderlan acertou 59 das 60 questões da prova no turno da manhã; o irmão dele, Valmir Limeira de Souza, fez a prova no turno da tarde e obteve o mesmo resultado. Ambos erraram exatamente as mesmas questões.

De medicina a auditora: as aprovações surreais da “candidata gênio”

Levantamento da coluna, com base em documentos da investigação, portais oficiais e boletins universitários, mostra um padrão de aprovações


Arte/Metrópoles

Medicina, direito, técnico em assuntos educacionais, auditora fiscal do trabalho e, mais recentemente, analista de controle externo do Tribunal de Contas de Pernambuco. O currículo de Laís Giselly Nunes de Araújo , 31 anos, parece o de uma candidata fora da curva, capaz de conquistar vagas entre as mais disputadas do país em áreas completamente distintas. Mas, para a Polícia Federal, o fenômeno tem outra explicação: fraude.

Com 14 registros sob suspeita de envolvimento em esquemas criminosos desde 2022, Laís foi presa durante a Operação Última Fase, deflagrada no início de outubro, apontada como uma das principais articuladoras de uma organização criminosa que transformou aprovações em concursos públicos em um negócio milionário.

Um levantamento da coluna, com base em documentos da investigação, portais oficiais e boletins universitários, mostra um padrão de aprovações em sequência e em cargos de alto prestígio, cuja probabilidade estatística é praticamente nula sem interferência externa.

Campeã de aprovação

A trajetória da pernambucana começou a despertar atenção em 2022, quando foi nomeada para o cargo de técnica em assuntos educacionais da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Os registros mostram que, em apenas três meses, ela obteve progressão funcional, subindo de nível na carreira em tempo recorde, fato que agora é alvo de apuração interna.

Antes disso, Laís já havia sido aprovada em cursos de medicina e direito em universidades federais. Investigadores apontam que a candidata chegou a apresentar trabalhos acadêmicos na área jurídica, mas não há comprovação de que tenha concluído a formação médica.

Segundo a PF, a combinação de dois cursos de alta complexidade e múltiplas aprovações em concursos federais em tão pouco tempo seria “estatisticamente impossível” de ocorrer sem fraude.

O caso que a colocou definitivamente sob o foco da Polícia Federal foi a aprovação no Concurso Nacional Unificado (CNU) de 2024 para o cargo de auditora fiscal do trabalho, um dos mais concorridos do país.

A análise técnica feita pelos investigadores constatou que o gabarito de Laís era idêntico ao do ex-policial militar Wanderlan Limeira de Sousa, líder da organização criminosa presa na mesma operação. Ambos acertaram e erraram exatamente as mesmas questões.

Laís também apresentou gabarito idêntico ao de outros candidatos ligados ao grupo, como Allyson Brayner e Janaína Carla Nemésio. Peritos da banca organizadora confirmaram à PF que a chance de coincidência completa entre provas de diferentes candidatos é estatisticamente nula.

Analista
Mesmo após o avanço das investigações e a prisão de seus comparsas, Laís manteve a rotina de certames. Nesta terça-feira (7/10), quatro dias após sua própria prisão, o nome dela voltou a aparecer entre os aprovados do concurso do Tribunal de Contas de Pernambuco, organizado pela Fundação Getulio Vargas (FGV).

Poucos dias antes da prisão, também havia sido homologada sua inscrição para o cargo de procuradora jurídica municipal na Prefeitura de Abreu e Lima, na Região Metropolitana do Recife. A prova estava marcada para outubro, mas a candidata não chegou a comparecer ao exame.

A investigação aponta que Laís não apenas teria comprado vagas em concursos anteriores, como também atuava na operação do esquema, captando outros candidatos interessados em fraudar provas.

Vagas por R$ 450 mil
A Polícia Federal acredita que ela e o companheiro, Thyago José de Andrade, conhecido como “Negrão”, comandavam um núcleo da organização na Região Metropolitana do Recife e em Jaboatão dos Guararapes.

Mensagens obtidas no celular da candidata mostram que ela mantinha contato direto com outros investigados, como Larissa de Oliveira Neves, sobrinha de Wanderlan, que também teve gabarito idêntico no CNU. Em conversas interceptadas, as duas comentavam sobre as provas e trocavam informações sobre resultados.

A PF suspeita de que o casal Laís e Thyago tenha lucrado com o esquema ao mesmo tempo que comprava aprovações próprias. Cada vaga fraudada custava, em média, R$ 450 mil.

Além da prisão preventiva, a Justiça Federal determinou o afastamento da servidora de suas funções, a proibição de assumir novos cargos públicos e a quebra de seus sigilos bancário e telemático. Laís responde por fraude em certame de interesse público, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Somadas, as penas podem ultrapassar 20 anos de prisão.

A PF também solicitou às bancas organizadoras os gabaritos de todos os concursos em que a candidata foi aprovada. A análise comparativa deve indicar se há coincidências com outros suspeitos e se Laís continuava fraudando provas mesmo após as primeiras investigações.

  

Whatsapp Button works on Mobile Device only

Start typing and press Enter to search