Procuradores apuram se o ex-presidente, suspeito de fazer tráfico de influência internacional, usou o seu governo para favorecer construtora envolvida na Lava Jato
THIAGO BRONZATTO
A ampliação foi possível, entre outros fatores, graças a provas colhidas e compartilhadas pela Operação Lava Jato. Com o material, as investigações do MPF em Brasília avançaram sobre a atuação da Odebrecht no governo Lula – e, recentemente, se aproximaram do ex-presidente, ao descobrirem que um apartamento no Guarujá e um sítio em Atibaia, ligados a sua família, foram reformados pela Odebrecht e pela OAS, outra empreiteira investigada no petrolão. Entre os arquivos que a turma da Lava Jato compartilhou com os colegas de Brasília estão relatórios de análise de e-mails trocados entre executivos da Odebrecht. Os dirigentes, especialmente o presidente Marcelo Odebrecht, hoje preso em Curitiba, tentavam incluir demandas da empreiteira em pautas de reuniões de Lula com chefes de Estado e autoridades de Angola, Argentina, Bolívia, Peru e Venezuela, entre outros países. Em maio de 2005, antes de Lula se encontrar com o presidente angolano José Eduardo dos Santos, a empresa preparou um documento chamado “ajuda memória”, em que relembra a importância de obras tocadas pela empreiteira no país africano.
Num e-mail enviado no dia 9 de outubro de 2007, com o assunto “Agenda Lula – Urgente”, executivos da Odebrecht discutem a possibilidade de incluir na pauta da visita de Lula a Angola um negócio no setor de biocombustível. “Estamos incentivando o embaixador brasileiro a colocar o assunto na agenda presidencial”, diz um diretor. Em outra mensagem, enviada no dia 11 de fevereiro de 2009 para um executivo da empreiteira, o então ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, relata sem meias palavras o resultado do encontro entre Lula e o presidente da Namíbia, Hifikepunye Pohamba: “O PR (presidente da República – Lula na ocasião) fez lobby”. Na ocasião, a Odebrecht tentava emplacar um projeto hidrelétrico entre a Angola e a Namíbia. A obra, porém, não foi adiante. Esses indícios, somados ao que Lula fez pela Odebrecht depois de deixar o cargo, levam os procuradores a apurar se o relacionamento entre as duas partes não começou antes do que se pensava no início.
O Ministério Público Federal pediu também ao Tribunal de Contas da União acesso às auditorias realizadas em obras da Odebrecht no exterior durante o governo Lula. Uma delas é a modernização e ampliação do Porto de Mariel, em Cuba, que recebeu US$ 682 milhões do BNDES. Duas das cinco parcelas do empréstimo foram aprovadas em 2009 e 2010 pelo banco estatal, que aceitou como garantia de pagamento a produção de fumo. A transação foi negociada por Lula e seu então ministro Miguel Jorge com os irmãos Fidel e Raúl Castro. Outro negócio foi a construção da linha II do metrô de Los Teques e da linha V do metrô de Caracas, na Venezuela, iniciada depois de um encontro em maio de 2009 entre Lula e o então presidente, Hugo Chávez. A obra, com indícios de irregularidades para auditores do TCU, recebeu US$ 747,1 milhões do BNDES.
Os investigadores devem mirar ainda o programa de desenvolvimento do submarino movido a energia nuclear fabricado no Brasil, uma parceria de cerca de R$ 25 bilhões firmada em 2008 entre Lula e o então presidente francês, Nicolas Sarkozy. Escolhida pelo estaleiro francês DCNS, a Odebrecht foi contratada sem licitação. Em janeiro deste ano, foi instaurado na Procuradoria da República no Distrito Federal outro inquérito, sigiloso, para investigar uma suspeita de desvio de dinheiro público do programa. Além dos processos do TCU e do material da Lava Jato, o Ministério Público contará com o arquivo de documentos recebidos pela CPI do BNDES, da Câmara.
Procurado por ÉPOCA, o Instituto Lula não quis responder sobre as novas investigações. Em notas divulgadas anteriormente, o instituto afirmou que “o ex-presidente não recebe remuneração para defender empresas brasileiras, de qualquer setor, no exterior. Faz isso porque acredita na importância disso para o desenvolvimento do Brasil. Fez quando era presidente e continuará fazendo como ex-presidente”. Ainda segundo o instituto em notas anteriores, “Lula recebe remuneração profissional apenas e especificamente quando é contratado para dar palestras para empresas privadas, o que fez não só para a Odebrecht, mas para 42 empresas diferentes ao longo de 4 anos e 6 meses.”
Por meio de nota, a construtora Odebrecht disse que “já prestou as informações solicitadas pelo Ministério Público Federal em inquérito que corre em sigilo e reafirma que mantém uma relação institucional e transparente com o ex-presidente Lula”. Afirmou ainda que “os trechos de mensagens eletrônicas divulgados – envolvendo nomes e comentários atribuídos a pessoas que ocuparam cargo público – apenas registram uma atuação institucional legítima e natural da empresa e sua participação nos debates de projetos estratégicos para o país. A Odebrecht desconhece investigação do Ministério Público Federal sobre o projeto Prosub (do submarino nuclear)”. A Procuradoria da República no Distrito Federal diz que não comenta caso específico, principalmente sob sigilo, e que diversas diligências estão em andamento.
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