O consumo do chá teria contribuído para a morte do neto de Chico Anysio. Especialistas ouvidos pelo site de VEJA explicam que a substância é alucinógena e, como qualquer outra droga com esse efeito, pode causar distúrbios psiquiátricos permanentes e até matar
Recentemente, Brita Brazil e Nizo Neto - filho de Chico Anysio -
atribuíram a morte do filho Rian Brito ao chá de ayahuasca. De
acordo com a família, o rapaz teria mudado muito após tomar a bebida.
"Começou
com uma questão espiritual. Ele logo entrou num delírio que tinha uma missão e
que para essa missão não podia comer. Consumindo o mínimo para sobreviver,
chegou a pesar 45 quilos. Existe o Rian antes e depois da ayahuasca, embora ele
só tenha tomado quatro doses. Com toda certeza foi uma coisa que o levou a esse
final. Três psiquiatras também fizeram essa afirmação", disse Nizo Neto,
em entrevista ao site Ego.
O chá de
ayahuasca ou Santo Daime, como é conhecido, é uma bebida alucinógena feita a
partir de uma combinação de duas plantas amazônicas: o cipó jagube e o arbusto
chacrona. Embora seja considerado um alucinógeno, seu uso em cultos religiosos
como o Santo Daime , Porta do Sol (frequentada por Rian), Céu de Maria (fundada
pelo cartunista Glauco e onde seu assassino, Carlos Eduardo,consumia a bebida)
e União do Vegetal é permitido no Brasil pelo Conselho Nacional de Políticas
sobre Droga (Conad).
Apesar da liberação, o Conad impõe algumas regras para o consumo do chá:
pessoas com histórico de transtornos mentais ou sob efeito de bebidas
alcoólicas ou outras substâncias psicoativas estão proibidas de ingerir a
droga. Também é obrigatório que as seitas do Daime "exerçam rigoroso
controle sobre o sistema de ingresso de novos adeptos".
Para
Ronaldo Laranjeira, professor titular de psiquiatria da Unifesp, essa
autorização é bastante problemática. Segundo ele, os integrantes da seita não
têm capacidade para discriminar quem pode ou não ingerir a substância sem
apresentar problemas. Além disso, como acontece com o uso de qualquer outra
droga, não é possível afirmar quem vai ficar psicótico ou, caso já tenha algum
problema mental, quem vai piorar.
"O
grande problema dessa resolução é que não é possível prever quem terá problemas
psiquiátricos após beber o chá ou quem ficará viciado. Claro que algumas
pessoas, por seu histórico médico ou familiar, já têm predisposição, mas
qualquer um pode ser afetado. É uma questão de genética e vulnerabilidade sobre
a qual ainda não temos um conhecimento sólido", afirma o psiquiatra.
A
combinação de plantas e ervas do líquido espesso e amarronzado contém DMT
(n-dimetiltriptamina) e inibidores da monoamina oxidase. Essas substâncias agem
no sistema nervoso central promovendo visões psicodélicas e euforia. Seus
usuários acreditam que o chá proporciona iluminações transcendentais.
"A
ideia é promover uma comunhão com a natureza, uma união com o universo. O
efeito alucinógeno altera a percepção sensorial de todos os sentidos permitindo
aos usuários essa sensação de fazer de parte um todo no universo", explica
Analice Gigliotti chefe do Setor de Dependência Química da Santa Casa da
Misericórdia do Rio de Janeiro e diretora da clínica psiquiátrica Espaço Clif.
Embora o
chá de ayahuasca possa desencadear surtos psicóticos em qualquer indivíduo,
alguns grupos são considerados de risco, como pessoas com depressão, transtorno
bipolar e esquizofrenia. "As substâncias presentes no chá, como o DMT, agem
como perturbadores do sistema nervoso central, alterando a percepção sensorial
de todos os sentidos. Isso faz com que a pessoa possa ter alucinação, o que
pode desencadear quadros psicóticos", diz Analice.
Além da
deflagração de surtos psicóticos, quando combinado com outras substâncias, o
chá pode causar confusão e tremores - em usuários de antidepressivos, devido ao
excesso de serotonina no sistema nervoso central - e até mesmo morte súbita. A
função cardiovascular de pessoas que já têm problemas cardíacos também pode ser
alterada, o que traz riscos para a saúde destes indivíduos.
Estudos - Nos
últimos anos houve uma popularização do chá de ayahuasca, aumentando o
interesse, inclusive científico, em relação aos efeitos da substância. Um
estudo publicado em 2014 na Revista Brasileira de Psiquiatria mostrou que o
líquido pode ser um potencial tratamento para depressão.
De acordo
com pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP de Ribeirão Preto (SP), a
ingestão de uma dose do chá (2,2ml/kg de peso) ajuda a reduzir em 66% os
sintomas da doença. O estudo foi realizado com seis pacientes com histórico de
depressão. Sete dias após o uso, a diminuição dos sintomas foi superior a 72%.
Em relação aos efeitos adversos, os participantes relataram apenas vômito, que
é comum em usuários do chá.
Outras
linhas preliminares de pesquisa realizadas por cientistas espanhóis analisam o
uso do chá no tratamento de vícios de outras drogas. Entretanto, todos os
estudos, inclusive o brasileiro, ainda são limitados e preliminares, e os
pesquisadores ainda estão tentando entender o modo como a substância afeta o
cérebro.
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