Julgamento foi interrompido nesta quarta-feira após
dois votos favoráveis à manutenção de Fachin. Faltam os votos dos outros nove
ministros do Supremo Tribunal Federal.
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Por
Renan Ramalho e Fernanda Calgaro, G1, Brasília
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Após os votos
de dois ministros, o Supremo Tribunal Federal interrompeu o julgamento desta
quarta-feira (21) que decidirá se o ministro Edson Fachin, relator da Operação
Lava Jato, continuará como relator das investigações baseadas nas delações
premiadas dos donos e executivos da empresa JBS.
A ministra
Cármen Lúcia, presidente do tribunal, informou que o julgamento será retomado
na sessão do plenário desta quinta (22). Faltam os votos dos outros nove
ministros do STF.
O julgamento é
motivado por uma ação do governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja
(PSDB). No pedido, o governador defende que ao menos parte das investigações
baseadas nas delações da JBS seja sorteada para outros ministros porque não
teriam relação com a Lava Jato, da qual Fachin é relator.
Votaram pela
permanência de Fachin à frente das investigações o próprio relator e o ministro
Alexandre de Moraes. Os dois também votaram contra a revisão dos benefícios
concedidos aos executivos da JBS negociados com o Ministério Público no momento
da homologação (validação jurídica do acordo).
Nas delações,
executivos e donos da empresa apontaram a existência de um esquema de corrupção
e pagamento de propina para políticos. As delações resultaram em inquéritos
abertos no STF para investigar, entre outros, o presidente Michel Temer e
o senador afastado Aécio
Neves(PSDB-MG).
Fachin foi
designado relator a pedido da Procuradoria Geral da República (PGR),
responsável pelo acordo com a JBS. O órgão aponta conexão com a Operação Lava
Jato, da qual Fachin é relator, especialmente por desvios do Fundo de
Investimentos do FGTS que também beneficiaram o grupo empresarial à qual a JBS
pertence.
O governador
Azambuja argumenta, no entanto, que o caso deve sair das mãos de Fachin porque
vários outros casos narrados pelos executivos da JBS não têm relação com
desvios na Petrobras, principal foco da Lava Jato.
Primeiro a se
manifestar, Fachin lembrou que pelas regras do STF, novas investigações devem
ser enviadas ao ministro que já conduz um caso semelhante.
"Não se
verifica, em meu modo de ver, qualquer ilegalidade na distribuição por prevenção
do pedido de homologação do acordo de colaboração premiada diante da evidência
de fatos relatos conexos com investigações em curso sob a minha
relatoria", disse.
No caso da JBS,
a conexão estaria em desvios no Fundo de Investimentos do FGTS que já integravam
as investigações da Lava Jato desde o ano passado.
A Eldorado
Papel e Celulose, empresa do mesmo grupo da JBS, obteve financiamento mediante
suposta propina a Fábio Cleto, ex-diretor da Caixa e responsável pela gestão do
fundo.
Revisão dos acordos de delação
No julgamento,
Fachin também votou contrariamente à revisão ou interferência nos benefícios
negociados entre os delatores do frigorífico JBS e o Ministério Público no
acordo de colaboração premiada.
Para Fachin,
uma eventual revisão dos benefícios dos delatores poderá ser feita só ao final
do processo criminal, quando se for condenar ou absolver o delator pelos crimes
que ele confessou.
“No ato de
homologação da colaboração premiada, não é dado ao magistrado, de forma
antecipada e, por isso, extemporânea, tecer qualquer valoração sobre o conteúdo
das cláusulas avençadas, exceto nos casos de flagrante ofensa ao ordenamento
jurídico vigente. Se assim agir, estará, de modo indevido, interferindo na
atuação dos órgãos de investigação”, afirmou Fachin em seu voto.
A mesma posição
foi defendida pelo ministro Alexandre de Moraes:
“Não poderá o
Judiciário substituir aquele acordo de vontades entre o Ministério Público e o
delator ou agente colaborador, mesmo que o juiz não concorde desde que haja
lícita escolha entre as várias escolhas legalmente e moralmente previstas”.
Durante a maior
parte da sessão, outros ministros se manifestaram sobre a questão, mas sem
votar.
Gilmar Mendes,
por exemplo, disse que, no caso da delação da JBS, não haveria como rever os
benefícios ao final do processo, já que o acordo proíbe o Ministério Público de
apresentar denúncia contra os executivos.
“Se se opta
pela extinção da punibilidade, não haverá denúncia. Em que processo vai se
fazer a verificação sobre a viabilidade do acordo?”, questionou.
O ministro
também disse que benefícios como esse não estão previstos na lei e, por isso,
poderiam ser derrubadas pelo Judiciário.
“Há acordos
suspendendo o prazo prescricional sem nenhuma base legal. Está se reescrevendo
a lei? Pode? A promotoria assumiu função legislativa no acordo? Causas
flagrantemente ilegais podem ser homologadas, seja lá pelo relator ou
submetidas a plenário?”, disse.
Após o fim da
sessão, o ministro Marco Aurélio disse a jornalistas que a hipótese de se
anular a delação da JBS é um “delírio”. Ele observou que o acordo de
colaboração premiada já prevê as situações em que o acordo ficará prejudicado.
Marco Aurélio
ponderou ainda que o procurador-geral, ao assumir o compromisso de não
apresentar denúncia contra os delatores – um dos pontos mais criticados do
acordo – considerou o fato de que o resultado da delação será “muito maior do
que uma possível condenação dos delatores”.
“Em síntese, o
procurador-geral não está na berlinda, não está sendo julgado, vamos acreditar
um pouquinho nele. Se ele chegou nesse ponto de assumir o compromisso de não
denunciar e ele assumiu, daí o sucessor não poder alterar esse ponto de vista,
se ele assumiu esse compromisso, é porque o resultado da delação é muito maior
do que uma possível condenação dos delatores. É muito maior”, afirmou Marco
Aurélio Mello.
Homologação
A questão sobre
o papel do relator na delação – que também deve ser decidida no julgamento
desta quinta – foi proposta pelo próprio Fachin, a partir do questionamento de
Azambuja.
Em seu voto, o
ministro defendeu que a decisão de homologar (validar) a delação seja feita
monocraticamente (de forma individual) pelo ministro relator e não de forma
conjunta por vários ministros.
Um dos
benefícios obtidos pelos donos da JBS é o compromisso do Ministério Público,
responsável pela acusação, em não denunciá-los junto à Justiça pelos crimes nos
quais confessaram participação.
Fachin lembrou
que a lei que regula as delações não prevê participação do juiz na negociação.
O magistrado é responsável somente pela verificação da legalidade e
regularidade do acordo, especialmente para checar se os colaboradores não foram
coagidos.
“Nessa fase
homologatória, não compete ao Poder Judiciário a missão de qualquer juízo
acerca da proporcionalidade ou conteúdo das cláusulas que compõem o acordo
celebrado entre as partes, sob pena de malferir a norma prevista na lei que
veda a participação dos juízes nas negociações, dando-se concretude ao juízo
acusatório que rege o processo penal no Estado democrático de direito”,
afirmou.
Janot
Responsável
pelo acordo de delação da JBS, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot,
defendeu durante o julgamento a manutenção do caso com Fachin e também dos
benefícios pactuados com os donos da empresa em troca da delação.
Para
Janot, retirar de Fachin as delações da JBS e rever os benefícios negociados
com os delatores seria um “salto triplo mortal de costas”.
O
procurador-geral sustentou que os casos trazidos pelos delatores guardam
relação com a Operação Lava Jato por revelarem desvios de dinheiro de diversos
órgãos públicos.
“Os fatos
trazidos com indicativo de prova envolvem nada mais, nada menos, que os três
últimos presidentes da República. Os fatos trazidos com indício de prova dão
conta que o dinheiro que irrigou os ilícitos, que pagou a propina é dinheiro
público, não é dinheiro privado, que veio de contratos com o serviço público,
com Petrobras, com Fundo de Investimento do FGTS, BNDES e tantos outros que se
entrelaçam nesses fatos todos em apuração”, destacou.
O procurador
também disse que o Ministério Público, do qual é chefe, não poderia recusar o
acordo oferecido pelos irmãos Batista, pois revelavam crimes que estavam
acontecendo no momento.
“Os crimes
estavam em curso, tanto é que alguns deles foram pilhados por ação controlada.
Como se pode recusar um acordo quando se tem conhecimento de crimes em curso
por altas autoridades da República, porque a premiação seria alta, média ou
baixa? Teria o Ministério Público condição de recusar e permitir que essas
autoridades continuassem a cometer o crime porque a premiação deveria ter sido
essa ou aquela?”, disse.
Ele lembrou
que, assim como os donos da JBS, outros seis colaboradores da Lava Jato
obtiveram o benefício de não serem denunciados sem qualquer questionamento
judicial.
A revisão do
acordo, argumentou, traria insegurança jurídica para os novos delatores. “A
mensagem que se passa é o Ministério Público ao acordar, pode, mas não muito. O
MP pode acordar, mas não cumprir”, afirmou.
Advogados
Antes de
Fachin, advogados do governador Reinaldo Azambuja, do ex-deputado Rodrigo Rocha
Loures e dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS, se manifestaram
sobre a delação.
Representante
de Azambuja, Gustavo Passarelli disse que não há nada que vincule a conduta do
governador a fatos ligados a Petrobras. Ele foi citado por suposto recebimento
de propina da JBS em troca de benefícios fiscais no Mato Grosso do Sul.
“No próprio
pré-acordo de colaboração consta que os fatos seriam relacionados a Lava Jato
ou não [...] É possível contatar que houve preocupação por parte dos
colaboradores e do Ministério Público no sentido de segmentar os fatos que eram
tratados. Há uma nítida divisão de fatos, especialmente quando se começa a
tratar de governadores de estado, com capítulo específico sobre governador do
Mato Grosso do Sul”, afirmou.
Em nome de
Rocha Loures, Cezar Bitencourt, pediu anulação da homologação por Fachin, bem
como o envio de investigações de pessoas sem foro privilegiado para outros
tribunais e não para o juiz Sergio Moro, que conduz a Lava Jato no Paraná.
“Não se pode
relativizar tudo, fazer todo um pacote só, argumentativamente, puramente
intelectual, e levar tudo para um lugar só. Tem mais juízes! Tem mais juízes!
Não vamos botar todos esses milhões de brasileiros em Curitiba, com
argumentações aleatórias, abstrata, sem vínculo nenhum concreto, fora dos
fatos”, protestou.
Advogado da
JBS, Pierpaolo Bottini foi o único a defender a relatoria de Fachin e a
manutenção do acordo de colaboração. Argumentou que, assim como as medidas de
investigação que permitem obter provas, a validação de uma delação é sempre
feita por um único juiz.
Destacou que o
caso da JBS foi distribuído a Fachin por ter relação com desvios no Fundo de
Investimentos do FGTS, e em investigação sobre a gráfica Focal, que prestou
serviços para a campanha presidencial do PT em 2014, fatos também investigados
na Lava Jato.
Depois, disse
que rever o acordo nesse momento quebraria a confiança na Justiça por parte dos
colaboradores. “Rever esse acordoo no presente momento, quando o Estado já
obteve benefícios, é um golpe brutal na segurança jurídica, é a frustração da
confiança legitima que o cidadão deposita no poder público”.
Por fim,
lembrou que os benefícios previstos no acordo podem ser revistos caso a
Justiça, ao final das investigações, entenda que a colaboração não foi eficaz
para desvendar os crimes.
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