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ENTREVISTA: DOM FRANCISCO DE SALES

“Acreditem na sociedade, no ser humano, nos valores, e reconstruam a sociedade a partir desses valores”.
Setembro de 2016

om Francisco de Sales nasceu em 17 de abril de 1968. Ingressou na Ordem do Carmo aos 18 anos e, em 1987, no noviciado Carmelita em Camocim de São Félix (PE). Cursou filosofia nos Institutos Vicentino, em Curitiba (PR), e Salesiano, em Recife (PE). Já a teologia foi realizada na cidade de Dublin (Irlanda).

Foi ordenado diácono em dezembro de 1994 e presbítero, no dia 25 de novembro de 1995. Em 2011, Dom Francisco assumiu, em Roma, o ofício de vice-prior do Centro Internacional Santo Alberto, secretário geral da Ordem do Carmo, preside a Comissão Internacional para a Liturgia e Oração e é membro da Comissão Internacional de Evangelização e Missão.
O Frei Francisco de Sales Alencar Batista foi ordenado bispo em solenidade realizada no domingo (14) na paróquia Nossa Senhora da Conceição do município de Araripina-PE, terra natal do agora Dom Francisco de Sales, novo bispo da diocese de Cajazeiras.

Filho de dona Noêmia Alencar Batista e do senhor Jacob Alves Batista, Dom Francisco de Sales concedeu entrevista para O Grande Jornal.


SENTIMENTO DE TER SIDO ORDENADO BISPO EM SUA TERRA NATAL


Ser ordenado aqui (em Araripina) foi uma escolha muito pessoal. Eu poderia ser ordenado em vários outros lugares, inclusive em Cajazeiras, já tomando posse da Diocese, mas eu penso que para a cidade de Araripina, para minha paróquia é um evento pastoral muito importante, porque foi aqui que eu cresci na fé, foi aqui que eu nasci (lá no Sítio Baixio dos Batistas), fui educado nas escolas públicas de Araripina, desde a Escola Antônio Martins de Alencar, até o CERU Luiz Gonzaga Duarte (hoje Escola de Referência em Ensino Médio Luiz Gonzaga Duarte). Iniciei também aqui a faculdade de História, depois interrompi em razão da minha entrada no Convento como Carmelita. É um dom para a cidade, para minha pessoa, poder reencontrar também nesse momento, eu passei mais de 25 anos fora da cidade, apareci aqui só de férias, reencontrar as pessoas, refazer essa história e celebrar esse momento com a cidade, sobretudo com a paróquia da Imaculada Conceição, que tem sido muito fecunda com as vocações tanto sacerdotais, quanto religiosa para a Igreja, é um dom pastoral a ser vivido, celebrado e agradecido em comunidade, por isso, a razão dessa escolha pessoal para que a ordenação fosse realizada aqui na cidade.

O PAPEL DA IGREJA NAS QUESTÕES SOCIAIS

Infelizmente a ação da Igreja não é tão divulgada, até porque não é o objetivo da ação social da Igreja. Em um encontro em Brasília com os 29 bispos nomeados pelo Santo Padre no último ano, pudemos vislumbrar o mapa muito concreto da ação pastoral da Igreja, da Pastoral Social da Igreja, nos lugares de fronteiras mais difíceis, de serem atingidos, por outras associações, inclusive, pelo poder público no nosso país. Existe uma incidência muito forte da presença da Igreja nessas realidades. A Igreja não vive para propagandear aquilo que faz, porque nós, fazemos em razão da fé que nós professamos e em razão do compromisso com o evangelho. A Igreja está profundamente preocupada de, exortar, ensinar, mais com um investimento econômico muito grande de nossas dioceses, por parte de outros organismos internacionais, que estão ligados a Igreja Católica.


SOBRE O ATUAL CENÁRIO POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL DE ARARIPINA

Eu até disse nos meus agradecimentos à comunidade de Araripina que, Araripina está sofrida, martirizada. A Igreja entende a política como a ação da caridade mais importante por parte daqueles que a assume e tem a consciência da fé, a consciência do evangelho. Então eu diria que o grande desafio não é só para Araripina, porque vivemos um momento muito delicado naquele que constitui o tecido político social do nosso país, e que o grande desafio é cada um assumir a sua responsabilidade, lembrando que toda autoridade, tem sua fonte em outro espaço e não das ambições humanas. Autoridade é um grande dom de Deus para o serviço da comunidade. Se a gente entende assim a autoridade, eu tenho certeza que muita coisa será transformada. Assumindo a responsabilidade e cumprindo com lisura aquilo que foi confiado. O político está lá porque o povo concedeu o poder, para coordenar, animar a vida de uma comunidade. Se ele cumpriu o seu dever e se o povo da sua parte também cumpriu o seu dever, cobrando, acompanhando, exigindo, aquilo que é direito seu, tenho certeza que a sociedade será transformada.


HOMOSSEXUALIDADE, PEDOFILIA E OUTROS DEBATES ABERTOS Á DISCUSSÃO PELO PAPA FRANCISCO

Um outro pecado da sociedade é que as pessoas não leem os documentos da Igreja. Se você entra no site da Santa Sé no Vaticano, toda a doutrina e disciplina da Igreja são abertas para todos aqueles que querem aprofundar a leitura para aquilo que ela tem feito e está fazendo em todas essas questões. Eu diria o Papa Francisco deu um destaque muito forte em algumas dessas questões que já vinham sendo tratada como muita responsabilidade, por exemplo, a questão da pedofilia, o documento normativo não só para a ação interna da Igreja, mas também, para a relação da Igreja com a sociedade no que diz respeito a esse tema, foi publicado pelo Papa João Paulo II e depois sancionado com uma outra normativa pelo Papa Bento XV e, dificilmente em outro site do mundo você vai encontrar normativas tão diretas, tão abertas, para tratar essas questões, mas infelizmente a gente sabe que o foco ás vezes em uma árvore que cai na Igreja, não é  aquele mesmo que se dar a toda floresta de ação do bem que a Igreja está realizando no mundo. O Papa Francisco chamou a todos a uma responsabilidade muito mais séria diante desses temas graves que são tratados abertamente, mas eu diria que é muito importante a gente ter essa capacidade de não ficar na superfície da informação, mas penetrar na substância dos conteúdos profundos, que estão lá, à disposição de todos, em todas as principais línguas oficiais do mundo.

O PAPEL DA MULHER NA IGREJA E SOBRE O DEBATE DE ELAS SE TORNAREM DIACONISAS

A mulher ocupa um grandíssimo espaço na Igreja. Quem educa as gerações toda na fé, são as mulheres. Elas estão presentes em vários setores da ação pastoral da Igreja. O Papa propõe uma reflexão, inclusive a partir de uma comissão instituída por ele para estudar uma antiga tradição que aparece em alguns escritos da Igreja sobre qual era o papel das mulheres chamadas diaconisas na Igreja Primitiva. Claro, é um primeiro processo de estudo e aprofundamento dessas que na Igreja Primitiva recebiam esse título esse ministério de diaconisas, mas que não se equiparavam na ordenação ao ministério ordenado da Igreja. Hoje o Santo Padre esta inserindo as mulheres no espaço de decisão da própria vida da Igreja, nas várias congregações, no próprio Vaticano a presença das mulheres é intensa, sobretudo daquelas que estão diretamente relacionadas com o ministério dos leigos. É muito importante ouvir não só a doutrina dos pastores, mas daqueles que estão diretamente implicados. Não só em Roma como em outros espaços do mundo, existem muitas mulheres que assumem as universidades católicas. São espaços de protagonismo da mulher muito importante e, na ação concreta de nossas pequenas comunidades, o papel da mulher sempre foi muito importante e muito valorizado. Portanto, é importante não focalizar somente essa dimensão do Ministério Ordenado que tem uma  tradição que faz parte da própria natureza da Igreja e não pode ser simplesmente mudada.

FANATISMO RELIGIOSO E TERRORISMO NO MUNDO

Você define muito bem a questão. Falta de humanismo. É preciso recuperar em todos os níveis e eu diria, que o primeiro nível para a resolução desse problema é o educacional. Onde não há uma educação profunda, e quando falamos de educação, falamos de uma educação integral do ser humano. Podemos cair nos piores desvios de condutas do ser humano. O que está acontecendo no mundo hoje é justamente consequência de todo um processo, no qual o ser humano, no papel de construtor da sociedade, foi ignorado. O terrorismo é fruto dos fundamentalismos diversos, não existe só o fundamentalismo islâmico, existe o cristão, e a razão básica de tudo isso é a falta de uma educação, uma compreensão profunda da própria religião. Se entra nessas derivas complexas da sociedade. Eu diria que o remédio para isso é construir pequenas células de paz. A paz não é uma realidade que vem com uma vareta mágica, ela é fruto de uma sociedade justa, quer dizer, onde não há justiça, direitos para todos, nós vamos ter pessoas que diante do sofrimento, vão responder de forma violenta. É todo um tecido social, político, que deve ser reconstruído a partir de valores profundos, radicados em uma educação humana, onde o ser humano é colocado no centro das atenções, a partir de todos os direitos e deveres que ele tem para assumir na construção da sociedade, e, sobretudo, essa grande reconstrução eu diria, quase artesanal da dignidade humana, ferida, martirizada em tantos e tantos aspectos.

CORRUPÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO

Diploma nenhuma dar dignidade a ninguém. A dignidade humana de valores a gente vai construindo um tecido humano familiar baseado em valores. A corrupção diria o Papa Francisco, é um mal quase que incurável porque ela penetra não só o tecido da sociedade, mas nas vísceras dos corruptos que não mais reconhece os limites. A uma diferença muito grande entre um pecador e um corrupto: o pecador é aquele que comete uma fraqueza como todos nós podemos cometer na vida, bate no peito, volta-se a partir da consciência doída para Deus e recompõe a própria vida. O corrupto não. O pecado da corrupção começa a fazer parte do próprio tecido da existência. Tem uma expressão de um salmo que define muito bem a lógica da corrupção: ‘um abismo atrai um outro abismo’. O corrupto não enxerga mais o limite moral do seu ato. Esse é o grande desafio. Eu diria que para curar a corrupção precisa-se de uma grande reforma da sociedade, mas ao mesmo tempo é necessário que nós pontemos o olhar para as coisas boas que estão acontecendo, quer dizer, no meio dessa corrupção tem muita gente boa que está fazendo coisas boas. E eu penso se nós começarmos a proclamar boas notícias e criar oásis de dignidade, de moralidade, uma outra sociedade é possível a partir desses valores que estão sendo vividos por pessoas que estão lutando quase que contra a maré. Eu convidaria as pessoas a olharem para os pequenos sinais. São pequenos sinais poderosos que podem apontar para um caminho de reconstrução da sociedade. Quando um vaso quebrar nós temos que recolher os pequenos pedaços e reconstruir esse vaso com uma nova argamassa. A sociedade precisa ser reconstruída com uma nova argamassa de uma vida digna, de uma moralidade que seja palpável pelas pessoas, que a gente possa acompanhar, e aí a população tem uma grande responsabilidade. Infelizmente as eleições veem e se elegem os mesmos, se elegem aqueles que fazem parte de uma geração que não mais respondem a esses anseios, essas dores, que estão presentes na sociedade.

Um outro mundo é possível porque tem gente fazendo diferente.

LEMA E MISSÃO

Quando o Bispo é eleito tem alguns ritos que precisam ser cumpridos e um deles é a escolha do lema. O lema é um pouco aquilo que vai ser quase que o refrão a arrematar cada ação, cada ato, cada etapa da missão do Bispo. Lendo os documentos sobre o Ministério Episcopal me veio à mente uma imagem que é muito bonita entre os discípulos no cenário da última ceia do evangelho de São Lucas. Enquanto Jesus se doa a comunidade na entrega de sua vida, no finalzinho eles começam a brigar entre eles quem é o maior entre nós?  E aí Jesus utiliza uma imagem bonita e pergunta quem é o maior, quem está à mesa ou quem está servindo? Jesus mesmo responde: é claro que quem está à mesa é o maior. Jesus diz: eu estou à mesa, mas estou entre vós como aquele que serve. Então, esse é o coração do lema. E é um pouco esse sentimento que eu levo na minha bagagem para Cajazeiras. Cajazeiras é uma diocese que tem 102 de história, que tem uma tradição bonita, de fé, de Ministério de Pastoral e eu vou entrar nessa história. Eu vou bater a cada porta, a cada coração, pedindo licença para entrar. A gente não chega com uma mala pronta, a gente vai aprontando a bagagem do caminho, caminhando com aqueles que já caminham na Diocese. Estão estarei lá como AQUELE QUE SERVE como aquele que entra nessa história olhando para Jesus servo, tentando pautar minha vida, minhas escolhas, também as decisões que devem ser tomadas, às vezes graves, mas sempre olhando para a imagem de Cristo servo, que será o modelo dessa minha ação pastoral. É com muita humildade que a gente chega na diocese, que ocupa um território vasto no sertão sofrido com todas as suas dificuldades e desafios, mas que alicerçou, podemos dizer que a história da Igreja, a história da sociedade naquela região e em nossa região, ela está intrinsecamente ligada. Nós não podemos entender a sociedade se não entender a história da Igreja. Cajazeiras começa com uma escola católica fundada pelo padre Rolim e a partir dali começa a cidade e começa também toda uma caminhada de vida, de Igreja e sociedade.

MENSAGEM DE OTIMISMO

Primeiro eu pediria ao povo de Araripina que continuasse em oração. Os Ministério Pastoral é sustentando pela oração.

Nós vivemos um momento de muito pessimismo na sociedade, mas que olhássemos o mundo com esperança. Eu nunca fui um pessimista na minha vida mesmo nos momentos mais difíceis da minha existência dos quais passei, até dolorosos, mas sempre procurei enxergar sementes de esperanças no meio dessas fragilidades humanas. Olhem para o mundo com esperança, olhem para Araripina com esperança. Olhem para esse cenário que nós estamos vivendo frágil do ponto de vista político e social, também com muita esperança e sejam todos semeadores dessa esperança. Então acreditem. Acreditem na sociedade, no ser humano, nos valores e reconstruam a sociedade a partir desses valores.


Albérico Batista (à esquerda) é primo do Bispo Sales e nosso amigo incondicional. Foi o mediador do nosso encontro.


Fotos: Rafael Diniz

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