Chefe de facção que age dentro e fora de presídios, André do Rap foi solto pelo ministro Marco Aurélio, cuja decisão foi cassada por Luiz Fux. Julgamento terá continuidade nesta quinta (15).
Por Rosanne D'Agostino, G1 —
Brasília
Ministros Fux e Alexandre de Moraes votam por manter prisão de André do
Rap
A maioria dos
ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) votou nesta quarta-feira (14) pela
manutenção da prisão do traficante André
Oliveira Macedo, o André do Rap.
De dez ministros,
seis manifestaram esse entendimento. Após o voto de Dias Toffoli (o sexto), a
sessão foi encerrada e terá continuidade nesta quinta (15), com os votos dos
outros quatro ministros.
O entendimento
mantém decisão do presidente da Corte, Luiz Fux. No
sábado (10), Fux
derrubou liminar (decisão provisória) do colega Marco
Aurélio Mello, que havia concedido a soltura do criminoso.
Nesta quarta-feira,
votaram os ministros Luiz Fux (relator), Alexandre de Moraes, Edson Fachin,
Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Dias Toffoli.
Todos os seis
consideraram que a falta da revisão de uma prisão preventiva a cada 90 dias —
prevista no pacote anticrime aprovado pelo Congresso, que alterou o Código de
Processo Penal e motivou a decisão de Marco Aurélio Mello — não implica soltura
automática do preso.
O julgamento não tem
a participação de Celso de Mello, ministro que se aposentou nesta
terça-feira (13) e ainda deve ser substituído.
Um dos chefes de
uma facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo, André
do Rap estava preso desde setembro de 2019. Ele foi condenado em segunda
instância por tráfico internacional de drogas com penas que totalizam mais de
25 anos de reclusão.
André do Rap foi
solto após liminar
(decisão temporária) concedida pelo ministro Marco Aurélio no último dia 2.
O ministro se baseou no artigo 316 do Código de Processo Penal, segundo o qual
uma prisão preventiva (provisória) se torna ilegal se não é reanalisada a cada
90 dias pelo juízo responsável.
Votos
dos ministros
Ao votar, o
ministro Luiz Fux afirmou
que derrubou de forma “excepcionalíssima” a decisão do colega. Segundo ele, a
decisão desrespeitou diversos precedentes do STF, beneficiando um líder de
facção que "permaneceu por cinco anos foragido e foi condenado por tráfico
de quatro toneladas de cocaína".
Fux disse ainda
que André do Rap "debochou da Justiça" por ter se aproveitado da
decisão "para evadir-se imediatamente" e "cometeu fraude
processual ao indicar endereço falso". O traficante agora é considerado
foragido e está na lista de
procurados da Interpol, a polícia internacional.
Sobre o pacote
anticrime aprovado pelo Congresso, que introduziu no artigo
316 do Código Penal o dispositivo
com base no qual Marco Aurélio Mello tomou a decisão, Fux
afirmou que isso "não conduz à revogação automática da prisão
preventiva" e que devem ser analisadas a legalidade e a atualidade dos
fundamentos da preventiva antes de conceder os habeas corpus.
"[A soltura]
somente é possível mediante decisão fundamentada do órgão julgador, no sentido
da ausência dos motivos autorizadores da cautela, e não do mero transcorrer do
tempo", afirmou.
Conforme
demonstrou o G1,
o ministro Marco Aurélio Mello tem aplicado à risca a nova legislação.
Foram ao menos
79 solturas pela falta de reavaliação das prisões pelos
juízos competentes, incluindo crimes graves, como homicídio, e mais leves,
furto.
O ministro Alexandre de Moraes afirmou
que André do Rap é um criminoso "de altíssima periculosidade" e, em
um “total escárnio à polícia e à Justiça, ficou cinco anos foragido”.
“Após esses cinco
anos, ele foi preso numa vida nababesca, numa casa de frente para o mar, e com
ele foram encontrados um helicóptero, no custo de aproximadamente R$ 8 milhões,
duas embarcações, de R$ 5 milhões, inúmeros outros bens. Ou seja, ele
continuava nesses cinco anos realizando fluxo do tráfico de entorpecentes”,
argumentou o ministro.
Para Moraes, “não
é uma mera prisão preventiva. Ele tem uma dupla condenação em segundo grau, num
total de 25 anos. Além disso, continua sendo investigado por outros delitos”.
De acordo com o
ministro, o pacote anticrime não autoriza a soltura automática de presos por
falta de revisão de prisões. Segundo ele, a prisão pode vir a se tornar ilegal,
mas “mediante uma análise obrigatória.
“Não há
automaticidade, não se fixou prazo fatal. A lei não diz: a prisão preventiva
tem 90 dias. Se quiser prorrogar, decrete de novo. Não diz isso. Ela diz que
tem dever de ser feita uma análise. E a análise pressupõe as peculiaridades de
cada um dos casos", declarou.
Acompanhando o
relator Fux, Alexandre de Moraes sugeriu também que a revisão prisional não
seja aplicada quando se tratar de condenado em segunda instância.
O ministro Edson Fachin acompanhou
o relator e afirmou que o juiz deve investigar a demora em cada processos, pois
a prisão provisória exige “fiscalização constante”.
Para Fachin, a
revisão cabe ao órgão emissor da prisão e, no caso de André do Rap, essa prisão
foi mantida com a condenação.
“A inovação
legislativa, ao contrário de atestar a inadmissibilidade das prisões e a
completa falência do sistema prisional, procura criar condições para a execução
das medidas cautelares de restrição de liberdade diante das carências do
sistema de justiça criminal”, disse Fachin.
Em seguida, o
ministro Luís Roberto
Barroso, também acompanhando o voto de Fux, afirmou que
“não tem sido singela a tarefa de procurar fazer com que o Brasil seja um país
em que o crime compensa, os bandidos perseguem os mocinhos e muitas vezes o mal
vence no final”.
“Esse caso
confirma minha convicção de que a decisão que impediu a execução depois de
condenação em segundo grau foi um equívoco que o Legislativo precisa remediar.
Só estamos julgando esse caso porque um réu condenado em dois processos a 25
anos ainda é, por decisão do STF, considerado inocente. Se não, o caso já
estaria encerrado como deveria estar. Mas há essa cultura da procrastinação e
da impunidade que não deixam o processo acabar. De modo que este cavalheiro,
objeto dessa nossa discussão, é ainda presumido inocente, absurdo como possa
parecer”, afirmou.
Para Barroso, a
interpretação constitucional do artigo 316 não autoriza a concessão de
liberdade a André do Rap.
“A omissão do juiz
em reavaliar a prisão preventiva não tem como consequência a soltura automática
do preso, porque isso poderia significar colocar na rua os mais perigosos
facínoras”, disse. Segundo o ministro, o juiz deve ser provocado a reavaliar,
mas, nesse caso, como há condenação, sequer isso. "O artigo 316 se aplica
a casos em que não há condenação", disse.
A ministra Rosa Weber acompanhou o
relator pela manutenção da prisão do traficante, mas reforçou que o presidente
do STF não pode derrubar decisão de colega em temas penais.
Segundo a
ministra, Fux não inovou ao suspender a liminar de Marco Aurélio, mas essa
decisão “carece de amparo legal e regimental”.
Mesmo assim, no
caso de André do Rap, Rosa Weber decidiu votar a favor de manter a decisão de
Fux.
O ministro Dias Toffoli também
acompanhou o relator, formando maioria pela manutenção da prisão.
Toffoli disse que
sabe as responsabilidades de ser presidente do Supremo e defendeu que a lei não
permite a soltura automática de presos.
“Assim como a lei
não pode prender, assim a lei não solta, não manda soltar. Daí a necessidade do
juiz. Então, aqui eu entendo que, havendo a ultrapassagem do prazo previsto no
Código de Processo Penal, já fiz decisões no sentido de determinar ao juiz que
se manifeste a respeito. Ou seja, não há automaticidade em soltura”, disse o
ministro.
Blog do Paixão