26 outubro 2022, 15:41 -03
CRÉDITO,REUTERS
Legenda da foto,
Lula recuperou seus status de inocente, mas parte da sociedade ainda
desconfia de sua responsabilidade em escândalos de corrupção do PT
Mensalão e
petrolão: os dois grandes escândalos de corrupção dos governos petistas
continuam assombrando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em sua
sétima tentativa chegar ao Palácio do Planalto.
C |
hamado de ladrão e
corrupto pela campanha do seu adversário, o presidente Jair Bolsonaro (PL), o
petista obteve direito de resposta a esses ataques no Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), já que suas condenações foram anuladas.
Mas, mesmo tendo
recuperado seu status de inocente na Justiça, parte da sociedade continua
considerando o petista culpado das acusações da operação Lava Jato.
Segundo pesquisa
de setembro da Quaest, 44% dos brasileiros consideram que o petista foi
condenado corretamente, enquanto 40% dizem que a condenação foi injusta.
Entenda a seguir o
que foram os escândalos do mensalão e do petrolão, e o que Lula diz sobre essas
acusações.
1.
Mensalão
O escândalo
estourou em junho de 2005, no primeiro governo Lula, após uma entrevista
bombástica do então deputado e presidente do PTB, Roberto Jefferson, o mesmo que no domingo (23/10) atacou policiais federais
com granada e tiros ao resistir a um mandado de prisão.
Hoje um fervoroso
apoiador de Bolsonaro, Jefferson integrou no passado a base do governo Lula. E,
antes, apoiou Fernando Henrique Cardoso e Fernando Collor.
Em junho de 2005,
o então deputado disse à Folha de
S.Paulo que o PT pagava mesadas de R$ 30 mil a parlamentares
para manter o apoio ao governo no Congresso.
Jefferson citava
em especial PP e PL, partidos que também eram da base de Lula e hoje integram o
governo Bolsonaro.
Quando concedeu a
entrevista, o presidente do PTB estava acuado por denúncia de corrupção
envolvendo pessoas indicadas por ele que ocupavam cargos no Correios e no
Instituto de Resseguros do Brasil.
Sua decisão de
delatar o mensalão é vista como uma reação a essas denúncias que ele próprio
enfrentava.
Ao denunciar o
esquema, Jefferson disse que Lula não sabia da compra de apoio no Congresso,
que seria operado pelo tesoureiro do PT, Delúbio Soares, com conhecimento de
outros petistas importantes, como o ministro da Casa Civil, José Dirceu, e do
presidente do PT, José Genoino.
Delúbio, por sua
vez, negou que houvesse compra de apoio, mas reconheceu repasses ilegais a
partidos aliados do governo para quitar dívidas de campanha. Ou seja, crime de
caixa 2, quando um partido ou político arrecada e utiliza dinheiro sem declarar
a quantia à Justiça Eleitoral, como manda a lei.
Segundo a
Procuradoria-Geral da República, o dinheiro teria vindo de empréstimos
fraudulentos em instituições financeiras, como Banco Rural e BMG, feitos pelo
publicitário Marcos Valério para lavar dinheiro desviado em contratos de
publicidade de sua empresa com órgãos federais.
E o que Lula
disse?
O então presidente
reagiu à denúncia de Roberto Jefferson afirmando que não tinha conhecimento de
nada. Também minimizou o escândalo dizendo que todos os partidos fariam caixa
dois.
"O que o PT
fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil
sistematicamente", disse Lula em junho de 2005, em entrevista a uma TV
francesa.
"E não é por
causa do erro de um dirigente ou de outro que você pode dizer que o PT está
envolvido em corrupção", argumentou ainda.
Pouco depois, em
agosto de 2005, em meio a uma grave crise política, Lula fez um pronunciamento.
Ele se disse traído e indignado, e afirmou que tinha afastado do governo as
pessoas suspeitas e que tudo seria investigado pela Polícia Federal.
Além disso, defendeu
a necessidade de uma reforma política para corrigir distorções do sistema
partidário eleitoral.
Ele propunha, por
exemplo, o financiamento exclusivamente público das campanhas, para que
partidos não dependessem de doações privadas, como de bancos e construtoras.
Anos mais tarde,
em 2015, o Supremo proibiu a doação de empresas a campanhas, mas pessoas
físicas ainda podem doar.
"É necessário
punir corruptos e corruptores, mas também tomar medidas drásticas para evitar
que essa situação continue a se repetir no futuro", defendeu Lula.
Por fim, o
presidente usou o pronunciamento para se desculpar.
"Eu não tenho
nenhuma vergonha de dizer ao povo brasileiro que nós temos que pedir desculpas.
O PT tem que pedir desculpas. O governo, onde errou, tem que pedir desculpas,
porque o povo brasileiro, que tem esperança, que acredita no Brasil e que sonha
com um Brasil com economia forte, com crescimento econômico e distribuição de
renda, não pode, em momento algum, estar satisfeito com a situação que o nosso
país está vivendo", afirmou.
Apesar de admitir
erros, Lula continuou negando a existência de mensalão para compra de apoio no
Congresso.
"Quando o
deputado Roberto Jefferson fez a denúncia, ele foi cassado exatamente porque
não provou as denúncias que ele fez, no que diz respeito, por exemplo, aos
mensalões. O que ele provou é que o PT teve uma prática de financiamento de
campanha totalmente contra a história do próprio Partido, e isso está sendo
apurado na CPI", disse em novembro de 2005, em entrevista ao programa Roda
Viva, da TV Cultura.
O que a Justiça
decidiu?
Em abril de 2006,
a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou quarenta pessoas por supostos
crimes relacionados ao escândalo. Entre elas, políticos do PT, PP, PL e PTB,
publicitários e executivos do Banco Rural.
Lula nem chegou a
ser denunciado como integrante do esquema, porque o procurador-geral que
apresentou a ação, Antonio Fernando de Souza, considerou que não havia
evidências de participação dele.
Legenda da foto,
Relator do processo do Mensalão no STF, Joaquim Barbosa declarou apoio a
Lula nesta eleição
Após as
investigações, a Procuradoria concluiu que foram desviados ao menos R$
101 milhões, por meio de fraudes envolvendo contratos de publicidade de órgãos
públicos.
Os procuradores
também acusaram dirigentes do PT de usarem empréstimos fraudulentos em bancos
para operacionalizar os pagamentos, por meio do publicitário Marcos Valério.
Apesar do
escândalo, Lula foi reeleito em 2006. Em 2009, penúltimo ano do segundo
mandato, ele disse à RedeTV que o escândalo do mensalão "foi uma tentativa
de golpe no governo" e "a maior armação já feita contra o
governo".
O julgamento no
STF só terminou em 2013, com 24 pessoas condenadas. A maioria da Corte
considerou que havia provas suficientes de que recursos desviados serviram para
comprar o apoio de parlamentares da base do governo.
O relator do caso
no Supremo foi o ex-ministro Joaquim Barbosa, que agora, uma década depois,
anunciou apoio a Lula no segundo turno contra Bolsonaro.
Três integrantes
da cúpula do PT foram condenados por corrupção ativa, ou seja, por realizar o
esquema de repasse de recursos ilegais para outros políticos. Foram eles José
Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares.
O quarto petista
condenado foi João Paulo Cunha, que presidiu a Câmara dos Deputados entre 2003
e 2005.
Ele foi
considerado culpado dos crimes de corrupção passiva e peculato por ter recebido
R$ 50 mil de Marcos Valério por meio de um contrato de publicidade fraudulento
com a Câmara.
Políticos que hoje
são aliados do presidente Jair Bolsonaro também foram condenados por corrupção
passiva e lavagem de dinheiro, devido a pagamentos recebidos do PT, como o
próprio Roberto Jefferson e Valdemar da Costa Neto, que é o atual presidente do
PL, partido de Bolsonaro.
Embora tenha
acusado outros partidos de vender apoio ao governo Lula, Roberto Jefferson
negava que o dinheiro dado ao PTB teria essa finalidade.
Ele reconheceu que
seu partido recebeu R$ 4 milhões por meio de Marcos Valério, mas dizia que os
recursos foram usados na campanha eleitoral de 2004. A explicação não convenceu
o STF.
O Supremo também
condenou o publicitário Marcos Valério por ser o operador dos pagamentos.
Quando o escândalo
estourou, Lula reforçava que todos seriam investigados e que caberia à Justiça
julgar. Mas após o julgamento do STF, ele passou a criticar a forma como o caso
foi conduzido.
Na sua avaliação,
não teria ocorrido um julgamento justo porque os acusados já teriam sido
condenados pela "mídia". Lula se queixava frequentemente da
cobertura da imprensa e alegava que havia uma campanha contra seu governo na
cobertura do mensalão.
"Na verdade,
nunca acreditei na história do mensalão. Essa foi a grande descoberta do século
21: de como a mídia poderia ser utilizada para criminalizar as pessoas antes da
Justiça. A mídia tomou a decisão de, ao invés de esperar a Justiça
criminalizar, transformar alguns líderes do PT em bandidos", disse em
entrevista publicada em 2018 no livro A Verdade Vencerá.
Na eleição deste
ano, ele voltou a minimizar a gravidade do mensalão, dessa vez comparando o
escândalo petista com o chamado Orçamento Secreto, criado no governo de Jair
Bolsonaro.
Nesse caso,
dezenas de bilhões do orçamento federal estão sendo usados por parlamentares
para investimentos em suas bases eleitorais, em gastos pouco transparentes, com
suspeitas de corrupção sendo investigadas.
2.
Petrolão
Segundo a
operação Lava Jato, o esquema de corrupção na Petrobras que funcionou nos
governos de Lula e Dilma Rousseff consistia no desvio de recursos da estatal
por meio de pagamentos superfaturados a empreiteiras em obras como construção
de refinarias.
Ainda segundo as
investigações, as empreiteiras beneficiadas pagavam propina para gerentes,
diretores da estatal e para partidos e políticos.
Apenas um
ex-gerente da estatal, Pedro Barusco, devolveu aos cofres públicos R$ 180
milhões, por exemplo.
Depois, as
investigações identificaram esquema semelhante envolvendo outras obras públicas
federais, fora da Petrobras, e também empreendimentos de governos estaduais.
O dinheiro
desviado da Petrobras e de outras obras públicas teria beneficiado políticos de
diferentes partidos, como PT, MDB, PP e PSDB.
As acusações
contra Lula
O Ministério
Público apontou Lula como chefe do esquema, já que ele, como presidente,
indicava os diretores da estatal.
Mas o que
complicou de verdade sua situação foram dois casos famosos que o atingiram
diretamente: o petista foi acusado de ser beneficiado com um tríplex reformado
no litoral paulista e com obras em um sítio que frequentava no interior de São
Paulo. Lula sempre negou qualquer irregularidade.
No caso do tríplex
do Guarujá, sua então esposa, Marisa Letícia, morta em 2017, tinha comprado em
2005 um apartamento menor no mesmo prédio, no valor de R$ 195 mil.
Nessa época, o
empreendimento ainda estava em construção pela Cooperativa Habitacional dos
Bancários.
A cooperativa
acabou falindo e, em 2009, a obra foi assumida pela OAS - a essa altura, o
casal tinha pago 57 prestações no valor total de quase 180 mil.
A acusação
sustentava que, após a OAS assumir o empreendimento, a cobertura foi reservada
e reformada para Lula, no lugar do outro apartamento.
Segundo a Lava
Jato, a diferença entre o que Lula pagou no imóvel menor e o valor da
cobertura, que estaria sendo personalizada para ele, seria de R$ 2,2 milhões.
CRÉDITO,REUTERS
Legenda da foto,
Moro foi eleito senador pelo Paraná e declarou apoio à reeleição de
Bolsonaro
Já a defesa de
Lula diz que a OAS estava tentando vender o tríplex ao ex-presidente. Afirma
também que ele e a mulher, Marisa, visitaram o apartamento para avaliar a
compra, mas acabaram desistindo do negócio.
Segundo a Lava
Jato, Lula e Marisa não manifestaram formalmente sua decisão de manter ou não o
imóvel mais simples que adquiriram quando o empreendimento foi assumido pela
OAS, diferentemente do que fizeram os demais compradores de unidades no
empreendimento.
Em 2015, Marisa
solicitou a restituição do valor pago judicialmente. O Tribunal de Justiça de
São Paulo reconheceu que ela desistiu da compra e determinou a devolução.
Já no caso do
sítio de Atibaia, Lula foi acusado de ser beneficiado por obras realizadas por
OAS e Odebrecht, e pagas com dinheiro desviado da Petrobras, no imóvel que
pertencia a um amigo seu, o empresário Fernando Bittar. O ex-presidente
frequentava o sítio com a família.
Ou seja, a Lava
Jato via as obras como uma forma de as empreiteiras beneficiarem Lula
indiretamente.
A defesa de Lula
sustentou que o sítio não pertencia a ele e que não havia qualquer prova
concreta de que as obras foram pagas com dinheiro desviado da Petrobras.
Insistia também
que as acusações se baseavam na palavra de delatores ou de outros réus do
processo, que estariam tentando se beneficiar na Justiça ao envolver Lula no
esquema.
Por fim, o petista
e seus advogados diziam que as acusações eram uma perseguição política da Lava
Jato contra Lula, com apoio de parte da grande imprensa brasileira, com o
objetivo de tirá-lo da vida política.
Nos dois
processos, Lula foi julgado culpado pelo então juiz Sergio Moro. Ele considerou
que tanto o tríplex quanto o sítio não estavam no nome de Lula como forma de
ocultar os benefícios que estaria recebendo ilegalmente. E condenou o petista
por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
As duas
condenações foram confirmadas depois pelo Tribunal Regional Federal da 4ª
região. No caso do tríplex, isso ocorreu ainda em 2018, o que tornou Lula
inelegível naquela eleição. Ele também foi preso naquele ano porque o STF
autorizava a prisão após condenação em segunda instância. Lula ficou 580 dias
preso.
Condenações
anuladas
As sentenças foram
anuladas depois. Primeiro, o STF entendeu, em março de 2021, que esses
processos não deveriam ter tramitado na Justiça de Curitiba. Pouco depois, em
junho, a corte decidiu também que Moro não julgou Lula com imparcialidade.
CRÉDITO,RODOLFO BUHRER/REUTERS
Legenda da foto,
Lula ao sair da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba e se
encontrar com apoiadores
Com essas duas
decisões, as condenações foram consideradas nulas, mas Lula ainda poderia
responder às acusações em novos processos, a serem realizados na Justiça de
Brasília.
No entanto, esse
retorno à estaca zero acabou provocando a prescrição da pretensão punitiva. Ou
seja, terminou o prazo estabelecido na legislação penal para possível punição
dos crimes, caso Lula fosse considerado culpado.
E quando não há
mais possibilidade de punição, as acusações são arquivadas definitivamente. Ou
seja, Lula não pode mais ser julgado nos casos do tríplex e do sítio de
Atibaia.
Por que processos
foram retirados de Curitiba?
Existe uma regra
no direito penal brasileiro que determina que um processo criminal deve ocorrer
na vara do local onde o suposto crime ocorreu. Por exemplo, se um assassinato
acontece no bairro carioca de Copacabana, o julgamento ocorre na Justiça do Rio
de Janeiro.
Essa regra serve
para evitar que um processo seja direcionado para um juiz específico,
contribuindo para a neutralidade do julgamento.
Inicialmente, os
casos da Lava Jato estavam concentrados na vara do então juiz Sergio Moro. Isso
ocorreu porque a operação, que teve sua primeira fase em março de 2014, começou
a partir de desdobramentos de investigações contra organizações criminosas que
atuavam no Paraná, envolvendo doleiros e o ex-deputado federal do PP José
Janene.
No entanto, com o
avançar das investigações e as informações obtidas em acordos de delação dos
primeiros investigados, a operação passou a apurar crimes em outras regiões do
país, nem sempre relacionados a Petrobras.
A força-tarefa da
Lava Jato, porém, argumentou que havia uma conexão entre esses crimes e que
todos deveriam ser investigados pela operação e julgados por Moro.
Desde o início da
Lava Jato, a defesa de vários investigados contestaram essa decisão e pediram
que os casos fossem redistribuídos para outras varas de outros Estados.
A partir de 2015,
diversos processos foram redirecionados principalmente para Rio de Janeiro, São
Paulo e Brasília. No entanto, o STF determinou que todos os casos que
envolvessem a Petrobras deveriam ser mantidos com Moro.
Como o Ministério
Público acusava as empreiteiras de terem usado recursos desviados da estatal
para beneficiar Lula, os processos do ex-presidente continuaram na vara de
Curitiba.
No entanto, em
março de 2021, ministro Edson Fachin acolheu o argumento da defesa de que, na
verdade, não havia elementos concretos na acusação comprovando que o petista
teria interferido diretamente em contratos da Petrobras para favorecer OAS e
Odebrecht em troca do tríplex ou das obras no sítio.
Dessa forma, se
não estava clara a relação da Petrobras nos supostos crimes de favorecimento
pelas empreiteiras, o caso não poderia ter sido julgado na vara de Moro. A
decisão de Fachin depois foi confirmada pela Segunda Turma da Corte.
A parcialidade de
Moro
Por trás da
decisão de Fachin de tirar os processos contra Lula de Curitiba havia o
contexto de enfraquecimento da Lava Jato.
Em 2019, a série
de reportagens Vaza Jato, do portal Intercept Brasil, revelou supostos diálogos
privados da força-tarefa da operação, inclusive conversas entre o procurador
Deltan Dallagnol e Sergio Moro, que indicavam uma espécie de conluio por parte
do Ministério Público e do então juiz nos processos contra Lula e outros
acusados.
CRÉDITO,AG. SENADO/AG. BRASIL
Legenda da foto,
Conversas entre Sergio Moro e Deltan Dallagnol foram reveladas pelo
Intercept Brasil
Esses diálogos mostravam,
por exemplo, que Moro teria sugerido aos procuradores ouvir uma testemunha que
poderia incriminar o petista.
Foi nesse contexto
que ganhou força o pleito antigo da defesa de Lula para que Moro fosse
declarado suspeito nos processos que havia julgado o petista antes de deixar a
magistratura para virar ministro no governo de Jair Bolsonaro.
Um dos argumentos
dos advogados era, por exemplo, a condução coercitiva que o petista sofreu em
2016, mesmo sem ter sido previamente intimado a depor, como prevê a lei.
Com o aumento do
desgaste da Lava Jato, foi aumentando a expectativa de que Moro seria declarado
parcial nos processos contra Lula.
O que se diz nos
bastidores de Brasília é que Fachin queria evitar que Moro fosse declarado
suspeito e, por isso, decidiu aceitar o pedido da defesa para retirar os
processos da vara de Curitiba. O ministro de fato argumentou na sua decisão
que, após a mudança dos casos para outra vara, não fazia mais sentido julgar se
Moro era ou não parcial.
A preocupação de
Fachin seria evitar que a declaração da suspeição do ex-juiz tivesse efeito
mais amplo de anular não só as condenações, mas todas as investigações contra
Lula realizadas na vara de Curitiba.
A maioria do STF,
porém, discordou de Fachin e, com isso, a Segunda Turma analisou a suspeição de
Moro e declarou que ele foi parcial contra Lula, provocando a anulação de todas
as investigações.
Lula e a escolha
dos diretores da Petrobras
Mas mesmo que o
STF tenha entendido que a Lava Jato cometeu abusos, R$ 6 bilhões desviados da
Petrobras retornaram após acordos de colaboração, leniência e repatriações.
Esses recursos
foram devolvidos por ex-diretores da estatal, empresas envolvidas nos desvios e
executivos dessas companhias.
Sendo assim, o que
Lula diz sobre seu papel na escolha desses diretores da Petrobras, tão centrais
no escândalo?
O petista afirmou
em depoimento a Moro, em 2017, que os nomes eram indicados por partidos da base
do governo, como forma de consolidar o apoio no Congresso.
Segundo Lula, as
indicações passavam pelo crivo do Gabinete de Segurança Institucional e depois
precisavam ser confirmadas pelo Conselho da estatal.
Questionado
novamente sobre isso no debate que teve com Jair Bolsonaro na TV Bandeirantes
no último dia 16 de outubro, Lula citou como exemplo o caso do ex-diretor de
abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, um dos delatores da Lava Jato.
Ele ingressou na
Petrobras em 1977 por concurso e se tornou diretor em 2004 por indicação do PP,
partido que hoje apoia a reeleição de Bolsonaro.
Lula costuma
argumentar que os indicados eram qualificados para o cargo e que a única forma
de descobrir eventuais casos de corrupção seria permitindo as investigações.
O ex-presidente
sustenta que os casos vieram à tona porque os governos do PT deram autonomia à
Polícia Federal e ao Ministério Público. Ele costuma dizer que Bolsonaro fez o
oposto.
É o que ele tem
repetido nesta eleição sempre que é confrontado sobre petrolão e mensalão.
"A corrupção
no nosso governo apareceu porque a gente tirou o tapete da sala. Porque a única
forma de aparecer é você tirar o tapete da sala e fazer as leis para que você
possa controlar", disse Lula em um comício na quadra da Portela, no Rio de
Janeiro, em setembro.
"No meu
tempo, eu não queria controlar o Ministério Público, não. O Ministério Público
foi livre para processar a hora que quisesse, quem quisesse. Eu não controlava
a Polícia Federal porque eu quero a instituição do Estado forte para garantir a
democracia. E eu nunca pedi pra Polícia Federal fazer ou não fazer. Era uma
decisão da Polícia Federal junto com a Justiça", afirmou também, em
referência as acusações que Bolsonaro enfrenta de interferir nessas
instituições.
CRÉDITO,RICARDO STUCKERT/DIVULGAÇÃO
Legenda da foto,
Lula concedeu entrevista exclusiva à BBC News na Superintendência da PF
em Curitiba
Ao exaltar o
desempenho no combate à corrupção durante os governos petistas, Lula reconhece
que ao menos parte das revelações da Lava Jato são verdadeiras. Ele próprio
reconheceu em 2019, em entrevista para a BBC News Brasil prisão, que a operação
não deveria ser inteiramente anulada.
"O que eu
acho que a Suprema Corte tem que fazer? Tem que se debruçar sobre o processo
(os casos da Lava Jato), tudo que foi certo, tudo que foi julgado corretamente,
que houve investigação, que houve apuração e que provou que cometeu crime, tem
que condenar. Agora, tudo aquilo que a Suprema Corte analisar e descobrir que
houve falha (no processo), que a pessoa é inocente, que a pessoa foi acusada
equivocadamente, tem que absolver. É só isso", defendeu Lula na época.
"Eu acho que a operação Lava Jato tem coisas que foram verdade, tem pessoa que confessou. Se o cara confessou que roubou, o cara é ladrão", afirmou ainda.
Perseguição
política?
Por outro lado,
Lula acusa a Lava Jato de ter agido para tirá-lo da eleição presidencial de
2018. A decisão de Sergio Moro de deixar a carreira de juiz para virar ministro
da Justiça de Bolsonaro deu fôlego para essa interpretação petista.
O ex-juiz foi
eleito senador do Paraná pela União Brasil e declarou apoio ao atual presidente
no segundo turno.
"Lula não é
uma opção eleitoral, com seu governo marcado pela corrupção da democracia.
Contra o projeto de poder do PT, declaro, no segundo turno, o apoio para
Bolsonaro", escreveu no Twitter.
E, assim como no
caso do Mensalão, Lula também ataca o papel da mídia na cobertura do escândalo
da Petrobras, colocando o PT como perseguido.
Ele disse isso,
por exemplo, no depoimento que prestou a Moro em 2017.
"Eu vou lhe
dizer uma coisa para ficar com a minha consciência leve, o comprometimento da
justiça e o comprometimento da acusação com a imprensa está levando a um
impasse. Porque alguns canais de televisão e alguns jornais fizeram disso a sua
peça principal de notícia. E eles estão com dificuldades de como é que isso vai
acabar se esse tal de Lula for inocente", disse o petista.
Com a anulação das
condenações, Lula é considerado inocente perante a Justiça. Mas a sociedade
brasileira continua dividida sobre sua responsabilidade nos escândalos do PT.
- Este texto foi
publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63404286
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