O Vaticano não informou as
causas da morte, mas o pontífice sofria complicações de um quadro respiratório
após ter ficado 38 dias internado. Francisco foi o primeiro papa
latino-americano e deixa legado de tolerância e diálogo.
Por Redação g1
Papa Francisco morre aos 88 anos — Foto: Vaticano
Jorge Mario Bergoglio, o papa
Francisco, morreu aos 88 anos às 2h35 pelo horário de Brasília, 7h35
pelo horário local, desta segunda-feira (21). As informações foram confirmadas
pelo Vaticano, que ainda não deu detalhes sobre a causa da morte.
O pontífice, que ocupou o cargo
máximo da Igreja Católica por 12 anos, se
recuperava de uma pneumonia nos dois pulmões após ter ficado
internado por 38 dias.
"O Bispo de Roma, Francisco, retornou à casa do Pai. Toda a sua vida foi dedicada ao serviço do Senhor e de Sua Igreja. Ele nos ensinou a viver os valores do Evangelho com fidelidade, coragem e amor universal, especialmente em favor dos mais pobres e marginalizados. Com imensa gratidão por seu exemplo como verdadeiro discípulo do Senhor Jesus, recomendamos a alma do Papa Francisco ao infinito amor misericordioso do Deus Trino", diz comunicado oficial.
As cerimônias fúnebres de
Francisco seguirão uma série de ritos e começam já nas próximas horas desta
segunda-feira, segundo o Vaticano. Os horários a seguir estão no horário de
Brasília:
- 14h: missa de sufrágio do papa
Francisco. Cerimônia ocorrerá na Basílica de São João de Latrão, em Roma,
e será realizada pelo cardeal Baldo Reina.
- 15h: ritos de constatação da morte e
deposição do corpo de Francisco no caixão. A cerimônia ocorrerá na capela
privada do papa, na Capela de Santa Marta, e será presidida pelo
camerlengo Farrell.
- Na manhã de quarta-feira (23), o
corpo do papa será levado para a Basílica de São Pedro, em Roma,
para que fiéis possam prestar a última homenagem ao papa.
Francisco será enterrado na
Basílica de Santa Maria Maggiore, em Roma, em vez da Basílica de São Pedro, no
Vaticano. A última vez que isso aconteceu foi em 1903, com o enterro do papa
Leão XIII.
O sino da Basílica de São Pedro, no Vaticano, tocou para anunciar a morte do papa nesta manhã diante de turistas e peregrinos que expressavam choque e tristeza com a notícia neste feriado da Páscoa, segundo a agência de notícias Reuters.
Nascido em 17 de dezembro de 1936
em Buenos Aires, na Argentina, Francisco foi o primeiro papa latino-americano
da história. Ele também foi o primeiro pontífice da era moderna a assumir
o papado após a renúncia do seu antecessor e, ainda, o primeiro jesuíta no
posto.
À frente da Igreja Católica por
quase 12 anos, Francisco foi o papa número 266. Em 13 de março de 2013, durante
o segundo dia do conclave para eleger o substituto de Bento XVI, Bergoglio foi
escolhido como o novo líder – inclusive contra a sua própria vontade, segundo
ele mesmo admitiu. Relembre a carreira do papa mais abaixo.
Alta após quadro de bronquite
Francisco
se recuperava de uma pneumonia nos dois pulmões, quadro que o manteve internado
por 38 dias. Há um mês, ele teve alta e estava sob cuidados
médicos.
A primeira hospitalização foi no
início de fevereiro. Nos dias seguintes, o papa começou a ter dificuldades para
discursar durante audiências religiosas. Ele admitiu publicamente que estava
com dificuldades respiratórias e chegou a pedir para um auxiliar fazer a
leitura do sermão.
No dia 14 de fevereiro, o papa
foi internado no hospital Agostino Gemelli para fazer exames e tratar a
bronquite. Mesmo hospitalizado, ele continuou participando de algumas
atividades religiosas. No domingo (16), ele pediu desculpas por faltar à oração
semanal com fiéis na Praça de São Pedro.
Já na segunda-feira (17), o
Vaticano informou que Francisco estava com uma infecção polimicrobiana —
causada por um ou mais microrganismos, como bactérias, vírus ou fungos. O
quadro de saúde do papa foi descrito como "complexo".
No dia seguinte, em um novo
boletim, o Vaticano anunciou que o pontífice estava com uma pneumonia
bilateral. A infecção era mais grave do que uma pneumonia comum. Ele
teve alta no dia 23 de março.
Os desafios do papado de
Francisco
Papa Francisco acena para fiéis na Praça São Pedro durante celebração da Páscoa, neste domingo (21). — Foto: Reuters
Apesar de ter sido eleito papa
contra a própria vontade, a carreira de Francisco no catolicismo foi uma
escolha própria do argentino. Formado em Ciências Químicas e professor de
Literatura, o religioso filho de imigrantes italianos acabou optando por se
dedicar aos estudos eclesiásticos.
Seu perfil jovial e descontraído
— ele gostava de fazer piadas e brincadeiras — o tornou uma opção popular entre
os colegas cardeais e uma escolha antes de mais nada conjuntural.
A Igreja Católica vivia então um
de seus momentos mais delicados. A popularidade em baixa e os escândalos de
pedofilia envolvendo padres em todo o mundo são apenas alguns dos desafios que
o pontífice enfrentaria durante seu papado.
A modernidade também levou
Francisco a lidar com outros assuntos delicados para a Igreja, como os direitos
LGBTQIA+ e o sexismo.
Ele foi elogiado por avanços como
o de permitir bênçãos de padres a casais do mesmo sexo, colocar mulheres em
cargos mais altos no Vaticano e permitir que elas votassem no Sínodo dos Bispos —
a reunião em que bispos debatem e decidem questões ideológicas e regimentos
internos.
Mas também foi criticado por
avançar menos do que o esperado na questão feminina. Francisco terminou seu
papado sem permitir sacerdotes do sexo feminino, reivindicação histórica de
parte das católicas.
O papa defendia que apenas
cristãos do sexo masculino poderiam ser ordenados para o sacerdócio, usando
como base a premissa da Igreja Católica de que Jesus escolheu homens como
apóstolos.
Discursos políticos e combate
à pobreza
O pontífice também ficou marcado
por discursos políticos durantes sermões. Não poupou críticas a líderes de
países em guerra, como o russo Vladimir Putin e o israelense Benjamin
Netanyahu. Ele também apontou o dedo para a União Europeia ao citar a crise dos
refugiados, que começou durante seu papado, em 2015.
Em uma das imagens mais
impressionantes e sem precedentes na Igreja Católica, rezou sozinho na sempre
lotada Praça São Pedro, no Vaticano, quando a Covid-19 se espalhou pelo mundo e
fez vários países decretarem quarentena.
Mas o combate à pobreza sempre
foi sua prioridade. Ao ser apontado como o novo papa, ele escolheu o nome
de seu novo título em homenagem a São Francisco de Assis, protetor dos pobres.
O lema de seu papado foi "Miserando atque eligendo" — "Olhou-o
com misericórdia e o escolheu", em português.
As reformas da Igreja Católica
também foram outra marca do papado de Francisco. Ele iniciou um processo de
reforma das estruturas da Cúria, que é o governo do Vaticano, com atenção
especial para a parte econômica e financeira.
Francisco, ‘um grande
reformador’
Aos 80 anos, com dores no quadril
que, por vezes, o faziam perder o equilíbrio, ele não falava de renúncia, como
seu predecessor Bento XVI teve a audácia de fazer.
"Estou indo em frente",
disse ele na ocasião, contrariando declarações mais melancólicas feitas antes
disso, em março de 2015: "Tenho a sensação de que meu pontificado será
breve, quatro ou cinco anos".
Francisco parecia impulsionado
por uma missão urgente: incentivar uma Igreja desertada em alguns países a
acompanhar com misericórdia os católicos em situações irregulares.
"Podemos falar de uma
revolução, nos passos do Concílio Vaticano II" (1962-1965), que abriu a
Igreja ao mundo moderno, disse à AFP o especialista em Vaticano Marco Politi,
em 2016.
Politi classifica Francisco como
"um grande reformador” que tentou fazer “com que a Igreja abandonasse a
sua obsessão histórica em tabus sexuais".
Ele foi o primeiro papa a ter
convidado um transexual ao Vaticano e se recusou a julgar os homossexuais. Para
Francisco, a Igreja era um “hospital de campanha, não um posto
alfandegário", que separa os bons e maus cristãos, disse Politi.
O argentino foi eleito, entre
outros, para continuar a reestruturação econômica da Santa Sé iniciada sob
Bento XVI com, por exemplo, o fechamento de contas suspeitas no banco do
Vaticano, por muito tempo acusado de lavagem de dinheiro.
"Em termos de doutrina, ele [papa Francisco] não mudou nada. Neste sentido, nunca fez parte dos progressistas", afirmou Politi. Segundo o especialista, o papa não tinha a intenção de ordenar padres casados ou mulheres, e se mostrou horrorizado com o aborto. Ele gostaria que seu trabalho reformista tivesse "uma continuidade".
O papa tinha um forte consenso
entre os fiéis e, também, entre alguns agnósticos e não-crentes. Mas
ele não agradava aos ultraconservadores, que tentavam desacreditá-lo.
Bergoglio antes de ser papa
O cardeal Jorge Mario Bergoglio em fevereiro de 2013 na Argentina — Foto: Juan Mabromata/AFP
Francisco nasceu em Buenos Aires,
em 1936. Seus pais, ambos italianos, chegaram à Argentina em 1929, junto de uma
leva de imigrantes europeus em busca de oportunidades de trabalho na América.
Arcebispo da capital argentina,
ele era considerado um homem tímido e de poucas palavras, mas com grande
prestígio entre seus seguidores. O religioso era admirado pela sua total
disponibilidade e seu estilo de vida sem ostentação.
O argentino também era
reconhecido por seus dotes intelectuais, por ser considerado dialogante e
moderado, além de ter paixões pelo tango e pelo time de futebol San
Lorenzo.
Antes de seguir carreira
religiosa, Bergoglio formou-se técnico químico. Depois, ingressou em um
seminário no bairro de Villa Devoto. Em março de 1958, entrou no noviciado da
Companhia de Jesus, congregação religiosa dos jesuítas, fundada no século 16.
Em 1963, Bergoglio estudou
humanidades no Chile e voltou à Argentina no ano seguinte para ser professor de
literatura e psicologia no Colégio Imaculada Conceição de Santa Fé.
Entre 1967 e 1970, foi estudar
teologia e acabou sendo ordenado sacerdote no dia 13 de dezembro de 1969. Em
menos de quatro anos chegou a liderar a congregação jesuíta local, um cargo que
exerceu de 1973 a 1979.
Foi reitor da Faculdade de
Filosofia e Teologia de San Miguel, entre 1980 e 1986, e, depois de completar
sua tese de doutorado na Alemanha, serviu como confessor e diretor espiritual
em Córdoba. Em 1992, Bergoglio foi nomeado bispo titular de Auca e auxiliar de
Buenos Aires.
Em 1997, ele virou arcebispo
titular de Buenos Aires. Em 2001, foi nomeado cardeal e primaz da Argentina
pelo papa João Paulo II. Entre 2005 e 2011, ocupou a presidência da Conferência
Episcopal do país durante dois períodos, até que deixou o posto porque os
estatutos o impediam de continuar.
Na Santa Sé, Bergoglio foi membro
da Congregação para o Culto Divino e a disciplina dos Sacramentos; da
Congregação para o Clero; da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada
e das Sociedades de Vida Apostólica; do Pontifício Conselho para a Família e a
Pontifícia Comissão para a América Latina.
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