Apesar da crise do Hopi Hari, parques como Beto Carrero, Thermas dos
Laranjais e Beach Park têm conseguido crescer com renovação constante de
atrações; parques aquáticos lideram novos projetos.
Por
Darlan Alvarenga, G1
Beto Carreiro World / Brasil
Era uma vez o
Terra Encantada no Rio de Janeiro e o Playcenter em São Paulo, parques de
diversão que marcaram a infância de quem passou pela cidade. Não existem mais.
Agora quem corre o risco de ficar na memória é o Hopi Hari, de Vinhedo (SP),
que fechou as portas no mês passado e tem um futuro incerto. O parque entrou em
recuperação judicial para evitar a falência e seguir vivo. O histórico de
empreendimentos que encerraram as atividades nos últimos anos preocupa o setor
e mostra que o segmento ainda não encontrou uma rota de crescimento e renovação
no país.
O Terra
Encantada fechou as portas em 2010, na esteira da crise detonada após uma
mulher de 61 anos cair da montanha-russa e morrer. O Playcenter encerrou
suas atividades em 2012, prometendo retornar com um outro
conceito, mas sequer tem local definido. Outros investimentos que não
prosperaram foram o The Waves e o Parque do Gugu, em São Paulo, e o Wet'n Wild
do Rio e de Salvador.
Para entender a
situação do setor, o G1 visitou os
principais parques em atividade do país, voltou aos lugares que sediaram
parques icônicos no passado, ouviu analistas, representantes do mercado de
parque de diversões e do governo federal.
Entre as
principais razões apontadas para os vários casos de dificuldades financeiras e
fechamentos de parques nos últimos anos estão:
·
problemas de
administração do negócio
·
número de
visitantes abaixo da expectativa do projeto
·
fracasso em
atrair turistas de outras cidades e estados
·
acidentes e
gastos elevados com seguros
·
alta
dependência de brinquedos e peças de reposição importados
·
alto custo de
manutenção em meio à oscilação do dólar
·
baixo índice de
investimentos em novos brinquedos
·
oferta de
experiência e serviços muito inferiores a de parques internacionais
Apesar do fechamento
de parques que marcaram época, alguns projetos como Beto Carrero World resistem
ao tempo e tem até recorde de público mesmo em meio à crise econômica. Mas são
os parques aquáticos que hoje lideram essa indústria no país, com ao menos 8
inaugurações nos últimos 4 anos. Dos 8 maiores parques de diversões do Brasil
em número de visitantes, 6 são relacionados à diversão na água (veja quadro abaixo).
(Foto: )
Mais de 300 parques no Brasil
Existem no país
mais de 300 parques associados, segundo os dados da Associação dos Parques de
Diversões do Brasil (Adibra). São projetos temáticos, itinerantes, aquáticos e
parques menores, geralmente instalados em shoppings, com brinquedos mais
simples, os chamados FECs (Family Entertainment Centers).
O estudo de
2014, o mais recente disponível, mostra que os parques temáticos e de diversão
pararam de crescer nos últimos anos. Os poucos que resistem ao tempo são
empreendimentos modestos, geralmente familiares e voltados para público local
ou até mesmo de bairro. O maior parque de diversões da capital paulista hoje,
por exemplo, é o Marisa, localizado em Itaquera, na Zona Leste de São Paulo,
com atrações de mais de 30 anos de idade, incluindo uma montanha-russa.
Evolução
do número de parques no Brasil
Empreendimentos
|
2012
|
2013
|
2014
|
Parques aquáticos
|
21
|
21
|
28
|
Parques de diversão/temáticos
|
45
|
45
|
45
|
Parques itinerantes
|
48
|
48
|
45
|
Family Entertainment Centers (FEC´s)
|
195
|
204
|
215
|
Total
|
309
|
318
|
334
|
Fonte: Adibra
(Associação das Empresas de Parques de Diversões do Brasil)
Entre os
maiores empreendimentos, os últimos que abriram as portas no Brasil são o
KidZania, em 2014, e o novo Parque da Mônica, em 2015, ambos em São Paulo. A
última inauguração que se tem notícia é o Minas Beach Thermas Resort, aberto em
janeiro em Raul Soares (MG).
No mundo, o
setor segue em expansão. Segundo o relatório de 2016 TEA/AECOM, referência
internacional de monitoramento do setor, o número de visitantes nos parques das
10 maiores empresas do ramo cresceu 4,3% em 2016 ante 2015.
Dos 25 maiores
parques de diversão do mundo, 10 ficam nos EUA e nenhum no Brasil. O mais
visitado continua sendo o Magic Kingdom da Disney, na Flórida, que recebe por
ano mais de 20 milhões de pessoas.
Castelo
da Cinderela, o Magic Kingdom, da Disney, em imagem de arquivo (Foto: Flávia
Mantovani/G1)
Na América
Latina, dos 10 maiores apenas 2 são brasileiros. O líder da região em número de
visitantes é o Six Flags, no México, com 2,48 milhões de visitantes no ano
passado. Em 2º lugar está o Beto Carrero, com 2 milhões. O Hopi Hari aparece na
4ª posição, mas ao G1 o parque
divulgou um número inferior de visitantes do que o divulgado pela TEA/AECOM
(820 mil em 2015 e 600 mil em 2016), o que tiraria a atração do ranking.
No segmento de
parques aquáticos, o Brasil se destaca com 3 empreendimentos na lista dos 20
mais visitados do mundo em 2016: Thermas dos Laranjais (4º lugar), Hot Park Rio
Quente (10º) e Beach Park (18º). O número 1 do ranking é o Chimelong Water
Park, na China, com 2,5 milhões de banhistas em 2016.
Imagem
de maio mostra parque Hopi Hari vazio após suspensão de atividades (Foto: César
Crocco)
Poucas atrações
Os empresários
e as associações que representam o setor evitam falar a palavra crise, mas
reconhecem que as dificuldades que
atingem o Hopi Hari preocupam também o mercado.
O Wet'n Wild de Itupeva
(SP), por exemplo, afirma que a suspensão das atividades do
parque vizinho teve impacto também na sua bilheteria. “Apesar de sermos
empresas totalmente distintas e independentes, muita gente acha que os dois
empreendimentos pertencem ao mesmo grupo. Portanto, a crise do parque vizinho
não é boa para nós, nem para o mercado”, informou.
A redução do
número de atrações por dificuldade de manutenção é apontada como um dos fatores
para a queda de público no Hopi Hari. A última novidade anunciada, uma
montanha-russa de dez inversões, nem chegou a ser montada e tornou-se garantia
encontrada pela Justiça para encerrar o fim de litígios e pendências com
credores.
A falta de
novidades não é exclusividade do parque de Vinhedo. “A impressão que dá é que
muitos parques ficaram parados no tempo, sem conseguir se reinventar e oferecer
novas atrações. Lá fora, os grandes parques têm sempre um cronograma de eventos
e novos brinquedos”, afirma Silvio Passarelli, diretor da Faculdade de
Administração da FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado).
O professor de
marketing estratégico da ESPN Rio, Marcelo Boschi, aponta também para a
importância da oferta de experiências que extrapolem os brinquedos e que
consigam garantir o retorno dos visitantes.
“Só brinquedo
não basta, comoditiza o parque. A experiência de consumo precisa estar ligada a
vivência com personagens e histórias. Até os museus e aquários estão fazendo
isso no mundo, porque o público quer mais do que quadro ou peixe”, afirma.
Boschi sentiu
no bolso a derrocada do Terra Encantada. Em sua experiência frustrada como
empreendedor, ele afirma que perdeu cerca de US$ 100 mil ao se tonar fornecedor
exclusivo de pipoca e balões de gás no parque.
“Pensei que ia
ficar rico. O projeto era fantástico e os brinquedos eram incríveis. Queriam
ser a Disney, até o milho da pipoca tinha que ser americano. Mas era um parque
sem tema, não criou uma identidade. Aí começou acontecer um problema, atrações
nunca foram concluídas e virou uma bola de neve”, conta.
Concorrência com a Disney
Os analistas
afirmam que também não pode ser desprezado o efeito do barateamento das viagens
para a Disney. Em 10 anos, o número de turistas brasileiros que viajam
anualmente para os Estados Unidos quase sextuplicou. De 384 mil em 2004, passou
para 2,26 milhões em 2014, e a grande parte desses viajantes tiveram como
destinos os parques da Flórida.
“Uma parte do público experimentou uma experiência transcendental na Disney e passou a olhar para os nossos parques como uma coisa menor, o que de fato eles são. Porque não só eles não têm o Mickey, não têm o mesmo atendimento, a mesma comida, como passaram a repetir exaustivamente a mesma fórmula”, afirma Marcelo Boschi
Ainda que
muitos possam associar parques de diversões a excursões escolares, a
dependência desse tipo de público para a geração de caixa dos empreendimentos é
apontada como outra fragilidade para a sustentabilidade do negócio.
“Os grandes
parques do mundo estão ligados ao fenômeno do turismo e não são usados
exclusivamente por populações locais”, afirma Passarelli. “Parque temático é
uma ação de turismo. Quem vai para a Disney sai daqui com todos os tickets
comprados. Nos parques localizados em grandes cidades, esse tipo de
planejamento não existe”, completa Boschi.
No
Beach Park, no Ceará, a maior parte dos visitantes são turistas de outros
estados (Foto: Divulgação)
Potencial no Brasil
Ainda que a
crise econômica e o histórico recentes de grandes parques que não prosperaram
dificultem a atração de investidores para o setor, a avaliação geral continua
sendo de que há espaço no mercado para mais parques de diversões.
"O Brasil
possui um mercado interno robusto, uma condição climática extremamente
favorável, entre outras características que possibilitariam o desenvolvimento
ainda mais substancial da indústria de parques", destaca o presidente da
Adibra, Álvaro Mendes Pereira.
A visão do representante
do setor é que esses projetos precisam estar integrados a projetos de turismo.
Se o dólar subir, as viagens internacionais ficam mais caras e esses
empreendimentos tendem a se beneficiar do aumento do turismo doméstico.
Parceria
com Universal Studios e a Dreamworks trouxe novos personagens aos eventos
(Foto: Beto Carrero/Divulgação)
Um exemplo
bem-sucedido é o Beto Carrero World. A receita do sucesso inclui a construção
de um personagem com ligação local, grandes parcerias internacionais e uma
estratégia de inserção nos pacotes turísticos da região. O parque está na lista
de atrações de que quem visita a região Sul do País, especialmente as praias de
Santa Catarina. Criado em 1991 na cidade de Penha (SC), o Beto Carreiro aumentou em
24% o seu faturamento em 2016 e prevê investir R$ 60
milhões até 2024 para tentar triplicar o número de frequentadores.
No Beach Park, do Ceará,
a maior parte dos turistas vem de São Paulo. Embora os brinquedos aquáticos sejam
a principal atração, desde setembro do ano passado, a programação passou a
incluir também um espetáculo musical permanente, o Ceará Show.
Já a cidade de
Olímpia, no interior de São Paulo, se transformou numa espécie de capital dos
parques. Com aproximadamente 50 mil habitantes, o município abriga 3 parques
aquáticos, incluindo o Thermas dos Laranjais, o
4º maior parque aquático do mundo.
Outro que está
em ampliaçao é o Hot Park, em Caldas Novas
(GO). Ao abrir as portas, o Hot Park possuía 12 atrações em uma
área de 25 mil metros quadrados. Atualmente, são mais de 20 brinquedos, que
ocupam 55 mil metros quadrados. O dono do empreendimento, o Grupo Rio Quente,
também tem outros projetos na região, como o Eko Park Aventura e um centro de
eventos ao lado do Hot Park.
"Hoje, os grandes investimentos estão
ocorrendo em combinação com projetos imobiliários integrados, em cidades que
optaram por um modelo de desenvolvimento pautado no turismo", destaca o
presidente da Adibra.
Playcenter tenta voltar
O Playcenter, que encerrou
as atividades em 2012, tenta reabrir as portas em outro local.
No final de 2015, o grupo iniciou conversas com a prefeitura de Olímpia, no
interior de SP, mas as negociações não avançaram. A informação não confirmada
(e que o grupo também não se preocupou em desmentir) de retorno do parque em
2018 foi amplamente compartilhada nas redes sociais, mas por enquanto não há
nada de oficial, nem mesmo a escolha do local.
"Estamos
ainda discutindo o melhor formato para ressurgir com o parque, obviamente bem
diferente do original. Mas todas as conversas ainda estão em fase
embrionárias", diz Roger Ely, diretor-geral do grupo, que também é dono da
rede Playland.
Looping
Star era um dos brinquedos mais tradicionais do Playcenter (Foto: Caio
Kenji/G1)
O Playcenter
admite que dificilmente o projeto sairá do papel antes de 2019. "Quando
você tem uma economia num momento recessivo e uma condição cambial ruim não é o
momento mais adequado. Vamos esperar um pouquinho para soltar o projeto, mas o
interesse permanece", acrescenta o executivo.
Pedido de incentivo
O presidente da
associação do setor lembra que foi a política de isenção de impostos de
importação nos anos 90 que viabilizou o surgimento de parques como o Hopi Hari,
Wet’n Wild e o Terra Encantada. Os empresários pedem apoio para acabar com uma
série de “amarras” que dificultam o amadurecimento dessa indústria no país.
Um deles é a
alta tributação para importação de equipamentos no setor de entretenimento, que
chega a 120%, segundo a Adibra. “Infelizmente, o Brasil ainda não oferece a
economia de escala para atrair fabricantes de equipamentos, o que obriga os
empreendimentos locais a importarem a maioria dos equipamentos, ficando
sujeitos a uma política tributária extremamente agressiva, e inviabiliza uma
série de projetos”, afirma o presidente da associação que representa o setor.
Procurado pelo G1, o Ministério do Turismo informou que vem
trabalhando para fortalecer o segmento e que desde 2015 foi assegurada a
inclusão de peças e componentes necessários para a modernização dos parques na
lista de produtos que tem isenção de impostos nas importações.
Entre as outras
medidas em estudo, o ministério cita a inclusão dos parques temáticos na Lei
Geral do Turismo, o que traria redução de tributos como o PIS/Pasep e Cofins a
todas os serviços associados a este tipo de empreendimento. “A legislação atual
considera como atividade dos parques temáticos somente os serviços de
entretenimento, lazer e diversão e não deixa expresso que existem outras
atividades de apoio e suporte ao turista que são essenciais a esse tipo de
empreendimento”, explica.
*
Colaborou Vivian Reis (G1 SP), Letícia Carvalho (G1 DF), Raquel Freitas (G1 MG)
e G1 Campinas e região
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